Rio

Em 2005, Baixada registrou a maior chacina da História do estado

Policiais à paisana percorreram dois municípios e executaram 29 pessoas

Bar de Nova Iguaçu que foi um dos alvos dos policiais
Foto: Fernando Quevedo / O Globo
Bar de Nova Iguaçu que foi um dos alvos dos policiais Foto: Fernando Quevedo / O Globo

RIO — Em 2005, a morte de 29 pessoas na Baixada Fluminense chocou o país e o mundo. A chacina foi a maior da História do estado do Rio. Os crimes ocorreram na noite de 31 de março daquele ano. Policiais à paisana e armados percorreram o bairro da Posse e a Rua Gama, em Nova Iguaçu, em um Gol prata e abriram fogo contra inocentes que cruzaram o caminho. Depois, já na Rodovia Presidente Dutra, ainda no mesmo município, mataram mais duas pessoas. Ao todo, só em Nova Iguaçu, o grupo executou 17 vítimas. Não satisfeitos com o banho de sangue, os bandidos foram para Queimados. Em dois pontos da cidade, incluindo um lava-jato do Morro do Cruzeiro, mais 12 pessoas foram executadas com centenas de tiros.

Segundo o depoimento de uma testemunha-chave, a insatisfação com a linha-dura imposta nos batalhões após a troca do comando foi o estopim para a explosão de violência. Meia hora antes do início da matança, dois integrantes do bando de policiais militares teriam reclamado das mudanças em um bar em Nova Iguaçu. O comandante do 15º BPM (Caxias), coronel Paulo César Lopes, havia prendido mais de 60 policiais por desvio de conduta. Dias antes do massacre, oito PMs do mesmo batalhão foram flagrados por uma câmera abandonando dois corpos degolados nos fundos do batalhão.

Em maio de 2005, o Ministério Público chegou a denunciar 11 PMs pelos crimes e o grupo acabou preso. Os policiais militares Maurício Jorge da Matta Montezano, Sedimar Gomes, Walter Mário Tenório Mariotini Valim e Marcelo Barbosa de Oliveira foram liberados pela Justiça por falta de provas. Não ficou comprovado vínculo de ordem pessoal entre os mesmos e dos demais acusados, nem seus nomes foram mencionados em qualquer documento constante dos autos. Os quatro foram inocentados e soltos. Outros dois PMs, os cabos Ivonei de Souza e Gilmar da Silva Simão, denunciados apenas por formação de quadrilha, também foram libertados.

Em fevereiro de 2006, a juíza Elizabeth Machado Louro, da 4ª Vara Criminal de Nova Iguaçu, admitiu parcialmente a denúncia e mandou cinco deles para júri popular: os cabos Marcos Siqueira Costa e José Augusto Moreira Felipe e os soldados Carlos Jorge Carvalho, Fabiano Gonçalves Lopes e Júlio César Amaral de Paula. Na ocasião, a juíza afirmou que os homicídios foram realizados por motivo torpe e com utilização de recurso que impossibilitou a defesa das vítimas.

Em outubro do mesmo ano, o PM Gilmar da Silva Simão foi assassinado com 15 tiros numa emboscada. Simão negociava delação premiada e tinha feito depoimentos importantes à Justiça sobre o caso. Ele era apontado pelo Ministério Público como peça-chave na investigação da chacina. Foi justamente Simão que indicou à polícia uma testemunha que elucidou todo o crime. Ele estava respondendo em liberdade e trabalhava na área administrativa do 3º BPM (Méier) desde fevereiro de 2006, quando saiu da cadeia. Simão, que foi morto após prestar depoimento sobre o possível envolvimento de policiais com a máfia dos caça-níqueis, caíra em desgraça com alguns integrantes do grupo após uma briga na carceragem do Comando de Policiamento do Interior, em Niterói. O desentendimento aconteceu entre maio e junho de 2005. O clima entre os PMs azedou de vez quando o cabo Simão prestou depoimento à juíza Elizabeth Louro, no dia 8 de setembro do mesmo ano. Ele disse ter sido informado por uma testemunha que os PMs Carlos Carvalho, Marcos Siqueira, Júlio Cesar Amaral e José Augusto Felipe foram vistos participando dos 29 assassinatos.

Em novembro de 2006, Marcos Siqueira também sofreu um atentado. Preso no Batalhão de Benfica, o cabo PM levou oito facadas no peito e na barriga dentro da cadeia. Dois outros PMs que também teriam participado da chacina, Carlos Jorge Carvalho e José Moreira Felipe, foram acusados da agressão.

O único policial julgado pelo crime até hoje é o PM Carlos Jorge. Ele foi condenado a 543 anos de prisão. Marcos Siqueira Costa e José Augusto Moreira Felipe, Fabiano Gonçalves Lopes e Júlio César Amaral de Paula ainda aguardam julgamento.