Por Marília Neves, G1


O diretor teatral Antunes Filho na sala do acervo de teledramaturgia do Sesc Consolação, no centro de São Paulo, em novembro de 2006 — Foto: Nilton Fukuda/Estadão Conteúdo/Arquivo

“Ele se despediu falando de teatro o tempo todo”; “Há quatro dias, ele me falou que a morte é a cena final”; “Ele esteve aqui até o dia anterior de ser internado”.

Essas foram algumas das frases ditas durante o velório de Antunes Filho que mostravam toda a paixão pelo teatro e também um pouco dos últimos dias do diretor, que morreu nesta quinta-feira (2), após descobrir um câncer no pulmão em estágio avançado.

Até sua internação, que aconteceu na segunda-feira (22) após o diretor passar mal, Antunes seguia no batente e focado no trabalho. E não parou nem mesmo no hospital.

"Ele era um homem completamente apaixonado, uma vida inteira dedicada ao teatro. E até os últimos momentos aqui, no hospital, era isso. Algumas pessoas do grupo vieram pra cá [hospital], e ele ainda [continuava] puxando trabalhos de voz, puxando trabalho de corpo. Um homem que dedicou a existência ao teatro", afirmou o diretor Emerson Danesi, que trabalhou ao lado de Antunes no Centro de Pesquisa Teatral - CPT ao longo de 23 anos.

Fora dos palcos

Antunes esteve no palco até fevereiro deste ano com a peça “Eu estava em minha casa e esperava que a chuva chagasse”, do dramaturgo francês Jean-Luc Lagarce. Nesse “hiato” de três meses, seguiu focado na questão de formação dos atores, ambiente que ficou tão conhecido e muito elogiado no meio quando as cortinas se fechavam.

“O projeto dele não era em função de uma obra em si. Mas era em função do teatro. Era um cara que o projeto dele era longevo, ele não pensava em uma obra teatral como um produto. Pensava como um pensamento, como um modelo de estar no mundo”.

“O CPT acabou se tornando um dos mais importantes laboratórios de teatro do país por conta desse vigor do Antunes em aprofundar realmente a linguagem dramática, teatral. Foi um cara incansável”, contou Sérgio Luis de Oliveira, Assistente da Gerência de Ação Cultura do CPT.

selo com frase de antunes filho — Foto: Werther Santana/Estadão Conteúdo

Projetos

Além desse trabalho intenso juntos aos atores, Antunes também tinha alguns planos para próximas peças.

“Pelo o que a gente ficou sabendo em off, porque ele não abria muito os projetos, ele estava trabalhando em torno do [ator comediante] Groucho Marx”, contou Sérgio.

Além de Groucho, Antunes chegou a cogitar trazer de volta um de seus maiores sucessos no palco, a peça “Bonitinha, mas Ordinária”, de Nelson Rodrigues.

“Mas logo antes de ser hospitalizado, uma semana antes da Páscoa, ele falou que tinha desistido da peça. Ele falou que não queria mais montar e que iria para casa ler coisas, estudar e descobrir algum texto”, contou Fernanda Gonçalves, atriz e professora de Corpo e voz do CPTzinho.

“Eu achei incrível a ideia de montar, mas ele tinha desistido antes de ser hospitalizado. Ele estava em um momento em que ele ia decidir o que ia montar, mas a última ideia tinha sido ‘Bonitinha, mas ordinária’”.

Foco na formação

Fernanda contou que esteve com Antunes no hospital dois dias antes de sua morte. “Ele estava fragilizado, mas lúcido. E falou pra mim: volta daqui uns dois dias. Isso foi na terça. E ontem foi quinta, dia que ele faleceu. De fato, eu voltei, mas já para vê-lo nessa situação”, lamentou.

A atriz também contou que nos últimos tempos, Antunes estava focado nos ensaios de seus alunos no CPT, que acontecem aos finais de semana.

“Nos últimos dias, ele estava muito presente aos sábados, quando a gente assistia as cenas dos alunos, comentando as cenas e dirigindo”.

“Antunes era obcecado pelo teatro, apaixonado em plantar esses ‘sementes’ – porque ele chama os atores dele de sementinhas, que vão dar frutos daqui um tempo”.

O diretor de teatro Antunes Filho segura máscaras, símbolos do teatro, ao posar para fotos no SESC Consolação, centro de São Paulo, em março de 2008 — Foto: Patrícia Santos/Estadão Conteúdo/Arquivo

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