Finanças
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Por Talita Moreira — De São Paulo


Pedro Guimarães, da Caixa: “Junho foi o melhor mês para o crédito imobiliário nos últimos quatro anos” — Foto: Andre Coelho/Valor
Pedro Guimarães, da Caixa: “Junho foi o melhor mês para o crédito imobiliário nos últimos quatro anos” — Foto: Andre Coelho/Valor

Se crise é oportunidade, o presidente da Caixa, Pedro Guimarães, pode estar diante da sua. De uma hora para outra, se viu - como todo mundo - diante de uma situação sanitária e econômica inimaginável, mas também se deparou com uma montanha de 120 milhões de clientes digitais. Esse é o contingente de brasileiros que vão usar o aplicativo do banco para receber algum dos benefícios sociais criados pelo governo para atravessar a pandemia.

Agora, o executivo planeja transformar pelo menos parte dessas pessoas em clientes, aproveitando a conta para oferecer a eles, por exemplo, produtos de crédito e seguros. Apesar das falhas e tentativas de fraudes registradas no aplicativo, atribuídas a uma demanda excepcional pelos benefícios, Guimarães vê grande potencial para o negócio e já planeja abrir o capital desse recém-criado banco digital, que será voltado sobretudo à população de baixa renda. “Criamos o maior banco digital do mundo.”

Antes dele, entretanto, há uma série de ativos na fila para desinvestimento, a começar pela Caixa Seguridade, cujo IPO está previsto para este ano. Com as andanças que tem feito pelo país, o presidente da Caixa está otimista com as perspectivas de recuperação da economia, e acredita que o PIB não cairá mais do que 3% neste ano.

Valor: A Caixa anunciou novas medidas para o crédito imobiliário. Como está o setor?

Pedro Guimarães: Vamos pausar as parcelas dos contratos de crédito imobiliário por 180 dias, o que representa mais 60 dias. A gente tem 2,4 milhões de contratos com a pausa. A habitação, de todos os segmentos tirando o agrícola, foi o que sofreu menos. O investimento que a gente fez foi muito importante para não ter interrupção. Se a gente deixasse as engrenagens pararem, custaria muito mais para voltar. Junho foi o melhor mês para o crédito imobiliário nos últimos quatro anos. Julho está mais forte ainda. Não passa nem perto da minha cabeça redução de PIB como o mercado estima, 10%, 7%. Está muito mais para 2% a 3%.

Valor: O que está levando a essa recuperação?

Guimarães: Na Caixa, a gente estava crescendo 20% ao ano em janeiro e fevereiro. Em março, começou a reduzir, abril foi muito ruim. Maio começou a melhorar e a partir de junho voltou. O que a gente sente é uma retomada forte. O auxílio, que são mais de R$ 250 bilhões, tem permitido que várias cidades do interior tenham se mantido. Nesse empréstimo que a gente fez do Pronampe, o que vi muitas vezes foram empresas tomando para crescer o business. As de material de construção, por exemplo, nunca tiveram um crescimento tão forte. O auxílio, muitas vezes as pessoas utilizam para comprar material de construção para terminar a casa, fazer renovação de estoque. Vimos tanto gente que foi duramente afetada como gente que não foi e que está usando esse dinheiro para expandir. A gente tem segmentos da economia com respostas totalmente diferentes.

Valor: A Caixa tem foco em micro e pequenas empresas. Como está a demanda nessa área?

Guimarães: A gente já fez um movimento forte de crédito, vamos fazer mais ainda. Terá suplementação do Pronampe. Já somos disparado os maiores, com R$ 8 bilhões do Pronampe e mais R$ 1,8 bilhão do Famfe [programa em parceria com o Sebrae]. São quase R$ 10 bilhões para micro e pequena empresa, mas temos apetite para mais R$ 5 bilhões. O pagamento do auxílio emergencial levou a Caixa a uma digitalização inédita.

Valor: Que oportunidades vê nessa área?

Guimarães: A gente criou o maior banco digital do mundo. O maior até agora era um banco indiano, com 116 milhões de contas digitais. A gente vai superar, com 120 milhões de clientes reais. Não é aquele que você cria a conta e não tem utilização. Não estou nem juntando os clientes que a Caixa já tinha. Esses acabam indo para o internet banking, que é outro grupo. Estou falando dos 65 milhões do auxílio, que devem virar 66 milhões, dos 5 milhões do Benefício Emergencial, aquele de manutenção de emprego, e dos 60 milhões do FGTS. Todos estão recebendo digitalmente. Como há alguma sobreposição, sobram 120 milhões.

A gente criou o maior banco digital do mundo, o maior era um indiano. Vamos superar, com 120 milhões de clientes”

Valor: Todos vão usar recorrentemente?

Guimarães: Não, mas pelo menos 50 milhões vão porque nós pagamos os benefícios sociais. Desses, a gente vai conseguir fazer um cross-selling. Encontramos 36 milhões de invisíveis, que não tinham conta. Tem uma parte que está usando o Caixa Tem hoje que pode comprar seguro de vida, um prestamista, uma série de produtos que a gente só tinha condições de vender pelas agências. As contas são de graça e ter cartão de débito é uma coisa imediata. Do ponto de vista nosso, a gente cresce com muita rapidez no cartão de crédito. E vai fazer o microcrédito a partir daí. Essa parte digital nos permitiu um entendimento muito rápido, numa escala muito grande, mas focado. A gente vai focar no imobiliário, nas linhas de crédito pessoal, como consignado, seguros, e nesse crédito a micro e pequena e, no máximo a médias empresas. A gente vai focar muito em empresas que normalmente não são o foco do Bradesco e do Itaú.

Valor: Quando acabar o auxílio, não vai haver baque na economia?

Guimarães: O auxílio, por causa da pandemia, está sendo pago em ondas. A gente vai pagar mais de R$ 250 bilhões, mas pagou só R$ 120 bilhões. Então, de fato, vai ter esse impacto até dezembro. Tem também no FGTS. As pessoas às vezes acham que a gente já pagou a terceira parcela, mas pagamos pela internet e só 50% das pessoas utilizam isso. Os outros 50% esperam o saque em espécie, e ele vai demorar. Talvez isso explique por que a gente está mais confiante que a maioria. Além disso, o crédito está vindo forte porque as medidas do BC e do Tesouro estão de fato trazendo garantias significativas, redução de base de capital necessária. O BC liberou o compartilhamento de garantias imobiliárias para estimular o “home equity”.

Valor: O produto interessa para a Caixa?

Guimarães: Vai ser muito forte para a Caixa porque temos R$ 500 bilhões em crédito imobiliário. Já temos muita demanda, porque temos uma carteira muito significativa e as pessoas muitas vezes já pagaram 50% do seu crédito, 60%. Nada mais natural que utilize esse espaço que já pagou para tomar um crédito mais barato. E a garantia para o banco também é excelente. Obviamente, vamos analisar o risco de crédito, mas é algo que podemos fazer R$ 100 bilhões em dois ou três anos. Mas precisa que as pessoas se acostumem com o home equity. É uma curva, tem que vencer a resistência da população.

Valor: O aplicativo Caixa Tem mostrou instabilidade. O que precisa ser aprimorado para que ele seja essa solução de banco digital?

Guimarães: A gente teve picos de demanda que não vão mais acontecer. A cada segunda-feira, são 5 milhões que vão receber o FGTS. E são pessoas acostumadas a usar o celular. É muito diferente do auxílio. O problema no FGTS foi maior porque 80% das pessoas queriam usar no primeiro dia. Ninguém está preparado para isso. Hoje, o grande problema não é mais esse uso. Está dando mais confusão porque a gente veio pesado contra as fraudes e invalidou centenas de milhares de contas. Quando a gente tinha o Caixa Tem, há pouquíssimos meses, eram 30 mil usuários e 1 milhão era o foco. Da noite para o dia, passamos a ter 122 milhões.

Valor: Com digitalização, o banco vai precisar de menos agências?

Guimarães: Temos 13 mil lotéricos e quase 9 mil correspondentes. A gente vai ter abertura de agência em alguns lugares, porque normalmente você precisa de uma agência hub. Às vezes não tem agência em dez municípios, aí precisa de uma e nos demais atende com lotéricos e correspondentes. Está em discussão ter mais ou menos 10% do banco em home office, num esquema flexível. Por outro lado, somos o banco das políticas sociais. Em especial no Norte e no Nordeste, não tem como fechar. E, como somos o banco da prefeitura, temos a conta da prefeitura e fazemos o financiamento com garantia da União, as agências são rentáveis. Mas esse banco digital vai fazer sim com que a gente discuta, dependendo muito da eficiência no pagamento dos benefícios. Mas nunca fechar uma agência numa cidade que tem uma só.

Valor: O plano de IPO da Caixa Seguridade foi retomado e há muita liquidez no mercado. Como está o cronograma de venda de ativos?

Guimarães: A Caixa Seguridade a gente já retomou. A venda de ações PN do Banco Pan é um estudo constante. Quando vai ser é uma outra discussão. Dos IPOs, temos outro três. Na Caixa Cartões, estamos no meio das discussões das joint ventures, que são muito importantes para avançar. A Caixa Loterias, essa sim está bem avançada, mas precisa de uma discussão anterior: se pode ou não fazer. O que hoje é claro é que a Caixa pode ter 100% da operação. A questão é: podemos ter só 70%? Ainda não temos a resposta.

Valor: Depende do quê?

Guimarães: Há uma discussão se a gente tem esse poder ou se precisaria de uma lei ou uma autorização. E tem o IPO da asset, que está avançando com a criação da empresa, da DTVM. Esse é um business fácil de fazer a operação. Todos os quatro são. Como a asset sempre foi o quarto, então realisticamente ela é lá para o meio do ano que vem. E tem a potencial abertura de capital do banco digital. Já estamos discutindo.

Valor: Qual o racional de um IPO do banco digital?

Guimarães: Esse banco digital, como é uma operação da baixa renda, envolve muita tecnologia e faz sentido ter discussões com o mercado. É um plataforma que criamos há dois meses e estamos reforçando a governança. Mas a gente não está mexendo no coração do banco: crédito imobiliário, financiamento à pessoa física, incluindo microcrédito, a parte de serviços à sociedade, como o auxílio, e a parte de saneamento. Pelo contrário. O banco digital, quanto mais eficiente for, mais eficiente será o microcrédito. Na nossa visão, estamos caminhando para operações que vão reforçar a governança e a eficiência da Caixa.

Valor: Para este ano, o que está mais factível são Seguridade e venda de ações do Pan?

Guimarães: Isso. As outras dependem mais de uma resposta efetiva. Caixa Loterias a gente poderia fazer neste ano, a questão é resolver uma coisa que não tem nada a ver cor com a Caixa. Já tem a empresa. Agora, depende muito se o mercado estiver forte, pode vir mais rápido com Cartões. São duas operações excelentes e a gente está andando com boa velocidade.

Valor: Voltando a vender ativos neste ano, a Caixa volta a pagar IHCD também?

Guimarães: É o nosso desejo, mas tem que ser autorizado pelo Tesouro. É uma questão fundamental para a gente devolver esse recurso que o Tesouro emprestou quando o banco resolveu emprestar para empresa grande.

Valor: Quando a crise começou, o sr. disse que a Caixa seria um agente normalizador do mercado. Quanto o desembolsou até agora?

Guimarães: A gente normalizou o imobiliário, fez algumas compras de carteira. Desembolsamos R$ 85 bilhões, muito no imobiliáro e em capital de giro. O BC deu muita liquidez para os bancos médios, então a gente precisou fazer menos compras, e fez um fundo de direitos creditórios com uma adquirente. E mais toda a parte do auxílio.

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