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Política Bolsonaro

Jair Bolsonaro defendeu chefe de milícia em discurso na Câmara

Presidente disse que Adriano Magalhães da Nóbrega, condenado por homicídio na época, era um 'brilhante oficial'
O senador eleito Flávio Bolsonaro e o presidente Jair Bolsonaro Foto: Adriano Machado / Reuters
O senador eleito Flávio Bolsonaro e o presidente Jair Bolsonaro Foto: Adriano Machado / Reuters

RIO - O presidente Jair Bolsonaro fez um discurso em defesa do ex-capitão da Polícia Militar Adriano Magalhães da Nóbrega , o Urso Polar, em 2005. Apontado pelo Ministério Público nesta terça-feira como chefe da milícia do Rio das Pedras e articulador do Escritório do Crime - maior grupo de matadores de aluguel do Rio, Adriano havia sido condenado por homicídio dias antes do pronunciamento de Bolsonaro no plenário da Câmara. O então parlamentar do PP afirmou ter comparecido ao julgamento do PM, segundo ele um 'brilhante oficial'.

Bolsonaro discursou sobre o caso no dia 27 de outubro de 2005, quatro dias depois da condenação de Adriano a 19 anos e seis meses de prisão pela morte do guardador de carros Leandro dos Santos Silva, de 24 anos, na favela de Parada de Lucas, Zona Norte do Rio. Na época do crime, familiares apontaram que a vítima tinha denunciado PMs que praticavam extorsões a moradores na comunidade.

O discurso de Jair Bolsonaro ocorreu poucos meses depois de seu filho Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) conceder a Medalha Tiradentes, maior honraria do estado do Rio, a Adriano. O então tenente estava preso por conta da morte de Leandro e recebeu a homenagem no Batalhão Especial Prisional no dia 9 de setembro, segundo a revista "Veja".

No pronunciamento, Bolsonaro pede ajuda da então deputada federal Denise Frossard, ex-juiza criminal, para reverter a condenação de Adriano. O presidente criticou um coronel da PM, responsável por uma sindicância contra o miliciano, que depôs como testemunha de acusação, sem considerar, nas palavras de Bolsonaro, "o fato de ele ter sido um brilhante oficial".

"Um dos coronéis mais antigos do Rio de Janeiro compareceu fardado, ao lado da Promotoria, e disse o que quis e o que não quis contra o tenente, acusando-o de tudo que foi possível, esquecendo-se até do fato de ele sempre ter sido um brilhante oficial e, se não me engano, o primeiro da Academia da Polícia Militar", afirmou, segundo os arquivos taquigráficos da Câmara dos Deputados.

Em outro trecho de sua fala, Jair Bolsonaro define Adriano como "coitado" e "um jovem de vinte e poucos anos" e defendeu a absolvição do policial no caso.

"Então, Sr. Presidente, não sei como podemos colaborar. O advogado vai recorrer da sentença, mas os outros coronéis mais modernos não podem depor, senão vão para a geladeira, vão ser perseguidos. E o tenente, coitado, um jovem de vinte e poucos anos, foi condenado. Mas não foi ele quem matou, Deputada Denise Frossard! Quem matou foi o sargento, que confessou e, mesmo assim, foi absolvido no tribunal do júri. A decisão, portanto, tem de ser revista".

No discurso, Bolsonaro criticou a então governadora do Rio, Rosinha Garotinho, e o ex-governador Anthony Garotinho, que ordenou a prisão de Adriano e de outros policiais envolvidos no caso. Segundo o presidente, o governo do estado queria agradar entidades de defesa dos direitos humanos.

"É importante saber a quem interessa a condenação pura e simples de militares da Polícia do Rio de Janeiro, sejam eles culpados ou não. Interessa ao casal Garotinho, porque a Anistia Internacional cobra a punição de policiais em nosso País, insistentemente. É preciso ter um número xis ou certo percentual de policiais presos. O Rio é o Estado que mais prende percentualmente policiais militares e, ao mesmo tempo, o que mais se posiciona ao lado dos direitos humanos", afirmou.

Parentes nomeados

Nesta terça-feira, O GLOBO revelou que o deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro nomeou para cargos em seu gabinete a mãe e a mulher de Adriano Magalhães da Nóbrega, foragido da Justiça e alvo de uma opereção do Ministério Público nesta semana. Antes de receber a Medalha Tiradentes, o ex-policial já havia sido homenageado por Flávio Bolsonaro em outubro de 2003, com uma moção de louvor.

Danielle Mendonça da Costa foi nomeada como assessora parlamentar de Flávio em 6 de setembro de 2007 - poucos meses depois de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio investigado pelo Ministério Público - se integrar à equipe, e permaneceu no cargo por mais de 11 anos , tendo sida exonerada a pedido apenas em 13 de novembro de 2018. Queiroz admitiu ser amigo de Adriano, com quem trabalhou no 18º BPM (Jacarepaguá), justamente a unidade responsável pelo patrulhamento na comunidade do Rio das Pedras.

Em 2 de março de 2015, a mãe de Adriano, Raimunda Veras Magalhães, passou a exercer um cargo na liderança do PP - então partido de Flávio - na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). Ela deixou o cargo até 31 de março de 2016, pouco depois do senador eleito deixar o PP e se filiar ao PSC. No dia 29 de junho do mesmo ano, voltou a trabalhar na Alerj, dessa vez no gabinete de Flávio.

Raimunda é uma das ex-assessoras de Flávio citadas no relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) por fazer repasses para a conta de Queiroz.

Segundo dados da Receita Federal, Raimunda é sócia de um restaurante localizado na Rua Aristides Lobo, no Rio Comprido. O estabelecimento fica em frente à agência 5663 do Banco Itaú, na qual foi registrada a maior parte dos depósitos em dinheiro vivo feitos na conta de Fabrício Queiroz. Na agência foram realizados 17 depósitos não identificados, em dinheiro vivo, que somam  R$ 91.796 - 42% de todo o valor depositado em espécie nas transações discriminadas pelo Coaf, segundo um cruzamento de dados feito pelo GLOBO.

Nessa agência foram registradas transações com valores repetidos mensalmente - um indício de lavagem de dinheiro, segundo um integrante do Ministério Público Federal. Em setembro, novembro e dezembro foram feitos depósitos em espécie no valor de R$ 4.246. Já em outros seis meses foram feitas transferências entre R$ 4.200 e R$ 4.600.