Coronavírus

Por G1


Enterro de vítimas de coronavírus no Cemitério do Cajú, no Rio de Janeiro, em 2 de junho — Foto: Saulo Angelo/Futura Press/Estadão Conteúdo

As seis capitais brasileiras que concentram 45% das mais de 34 mil mortes causadas pelo novo coronavírus iniciaram planos de flexibilização da quarentena nesta semana. Especialistas, no entanto, apontam negligência nessa iniciativa. Observam que, embora prefeituras e governos estaduais usem como argumento a queda das taxas de ocupação em UTIs, as curvas de casos e de óbitos estão ascendentes.

Nesta quinta-feira (4), o Brasil bateu novo recorde com a confirmação de 1.471 mortes em 24 horas, segundo dados levantados pelo G1 com as secretarias de saúde dos estados.

A última capital a iniciar a flexibilização foi São Paulo, onde concessionárias e escritórios reabriram com atendimento limitado a 4h por dia nesta sexta-feira (5).

Na segunda-feira (1°), Belém, Fortaleza, Manaus e Recife começaram a aplicar seus planos de abertura gradual.

E, na terça-feira (2), o Rio tomou as primeiras medidas para sair da quarentena. Entre as medidas de afrouxamento do isolamento social na cidade estão atividades esportivos nos calçadões e no mar, além do funcionamento de lojas de móveis e decoração e de concessionárias de automóveis.

Nessas seis cidades já foram confirmadas mais de mil mortes pela Covid-19, e todas elas ainda apresentam curvas ascendentes de casos e mortes, mas as prefeituras argumentam que o número de mortes diárias está desacelerando e que a lotação dos leitos de UTI está estável ou baixando. Tais fatores justificariam o início de uma "abertura gradual".

Há ainda outro agravante: Rio, Fortaleza e Recife estão na época de maior incidência de casos de síndrome respiratória aguda grave (SRAG), segundo séries históricas do InfoGripe, sistema de monitoramento da Fiocruz.

A síndrome está associada à circulação dos vírus respiratórios, que costuma ser maior exatamente nesta época na maior parte do país.

Pesquisadores, infectologistas e outros profissionais de saúde que acompanham a pandemia do coronavírus desde o início defendem manter as regras de isolamento social por mais tempo para tentar segurar a curva de crescimento dos casos e mortes.

Veja os argumentos prós e contra à flexibilização da quarentena em cada uma das capitais até esta sexta-feira (5).

São Paulo

Concessionárias e escritórios reabrem em São Paulo

Concessionárias e escritórios reabrem em São Paulo

  • Data da decisão sobre flexibilização/fim da quarentena: 5 de junho.
  • Lotação das UTIs: 65% dos leitos ocupados no estado - não foi informado se são o total de públicos e privados. A prefeitura afirmou que, sem a expansão de leitos, a taxa de ocupação estaria em 334% nas UTIs da capital. A apresentação, feita pelo secretário municipal da Saúde, Edson Aparecido, mostra ainda que, mesmo em um cenário de distanciamento social, o total de pacientes de UTI foi 5 vezes maior no final de maio do que no final de março.
  • O que já pode funcionar: Atendimento ao público em concessionárias de veículos e escritórios.
  • Argumento do governo: A prefeitura defende que os índices da capital são adequados para a reabertura. O prefeito Bruno Covas (PSDB) declarou que a cidade está em um platô em relação às solicitações de internação em UTIs, e o número de novos pedidos de leitos para pacientes com Covid-19 tem se mantido estável há pelo menos uma semana. O prefeito atribui a conquista ao uso de máscaras pela população.
  • Argumento dos especialistas: "Apesar de estar ainda subindo, a evolução do vírus está ocorrendo muito lentamente. Os novos casos e mortes estão respeitando essa teoria de não ser um pico e, sim, um platô. Sobre a questão de liberar a reabertura, precisaria de pelo menos mais uma semana de estabilidade para analisar”, avalia o professor de física da USP, José Fernando Diniz Chubaci, acompanha os dados do estado de São Paulo desde o início da pandemia.

Rio de Janeiro

Mais de 10 mil camelôs voltam às ruas do Rio de Janeiro

Mais de 10 mil camelôs voltam às ruas do Rio de Janeiro

  • Data da decisão sobre flexibilização/fim da quarentena: 2 de junho.
  • O que pode funcionar: Lojas de móveis e concessionárias de automóveis. Calçadão está liberado para práticas esportivas. Também está liberado esporte aquático no mar, mas não serão permitidas atividades na faixa de areia, como o aluguel de barracas de praia ou as escolinhas de esportes. Saunas e piscinas continuam vedadas.
  • Lotação das UTIs: 90% dos leitos ocupados no SUS na cidade.
  • Argumento do governo: O prefeito Marcelo Crivella (Republicanos) disse que disse que a decisão da reabertura gradual ocorreu porque nesse momento não existem filas em UTIs da rede pública municipal. O número de hospitalizações na terça-feira em razão do novo coronavírus, por exemplo, é o mais baixo da última semana: saiu de 792 para 651 casos. Também houve a redução nos registros de pacientes internados em UTIs (unidades de terapia intensiva), que desceram de 206 para 191, em uma semana. Ainda assim, a projeção de casos do próprio município segue em ascendência. No dia 11 deste mês, a prefeitura estima que o número de casos confirmados de Covid na cidade passará de 48 mil.
  • Argumento dos especialistas: "Tinha que ter três condições para flexibilizar: diminuir a mortalidade – e eu não vi isso. (...) O número de leitos de CTI (...) Mas não é só zerar a fila, também tem que ter vaga nos CTIs. É preciso ter no mínimo 10% ou 15% de leitos de CTI vagos. E a estabilização da curva. Ela tava tendo uma tendência a parar de subir, mas eu não vi essa estabilização", afirmou a infectologista Tânia Vergara, presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia no Rio de Janeiro.

Belém

Prefeito anuncia reabertura de shoppinga e salões em Belém

Prefeito anuncia reabertura de shoppinga e salões em Belém

  • Data da decisão sobre flexibilização/fim da quarentena: 1° de junho.
  • O que pode funcionar: Concessionárias, escritórios, comércio de rua, construção civil e igrejas. Shoppings centers e salões de beleza vão abrir a partir deste sábado (6).
  • Lotação de UTI: 81,51% até dia 3 de junho na cidade. Não foi informado se eram leitos de hospitais públicos ou privados.
  • Argumento do governo: A flexibilização para reabertura de shoppings centers e salões de beleza foi possível graças à disponibilidade de leitos clínicos e de UTI, nos Hospitais do Município e também do Estado. A taxa de leitos vagos na quinta-feira (4), é de 39% de disponibilidade para leitos clínicos e de 24% disponíveis para leitos de UTI. Além disso, foi identificada uma redução no número de atendimentos nas urgências e emergências da capital. Menos demandas na entrada e redução da mortalidade.

O Pará ocupou, na última terça-feira (2), a 18ª posição no ranking nacional de isolamento social, a pior já registrada. De acordo com a Secretaria de Estado de Segurança Pública (Segup), a pior posição alcançada até então era a 16ª, no dia 16 de abril. Ainda segundo a Segup, a média de isolamento no estado foi de 39% no último levantamento.

Mortos com Covid-19 são enterrados em vala coletiva de cemitério em Belém em 22 de maio. — Foto: TV Liberal

Fortaleza

Ônibus amanhecem lotados em Fortaleza

Ônibus amanhecem lotados em Fortaleza

  • Data da decisão sobre flexibilização/fim da quarentena: 1° de junho
  • O que pode funcionar: 17 setores produtivos, como logística, construção civil e comércio.
  • Lotação das UTIs: 87,34% dos leitos ocupados na cidade. Não foi informado se são leitos em hospitais públicos ou privados.
  • Argumento do governo: "Quedas consistentes nos índices epidemiológicos" foi o argumento do gerente da Vigilância Epidemiológica de Fortaleza, Antônio Lima. Ele se refere, entre outros indicadores, à demanda por internação em UPAs e hospitais municipais.
  • Argumento dos especialistas: "É preciso avaliar a adesão da população ao distanciamento e a outras medidas de segurança durante a liberação dos serviços, diz infectologista do Hospital São José (HSJ), Keny Colares. Caso contrário, pode haver uma “segunda onda” ainda mais agressiva.

Manaus

Trânsito intenso é registrado após reabertura do comércio em Manaus

Trânsito intenso é registrado após reabertura do comércio em Manaus

  • Data da decisão sobre flexibilização/fim da quarentena: 1° de junho.
  • O que pode funcionar: Igrejas e templos; lojas de artigos esportivos e bicicletas (venda e reparo); lojas de artigos para casa; lojas de vestuário, acessórios e calçados; lojas de móveis e colchões; atendimento presencial, médico e odontológico, sujeito a agendamento prévio; joalherias e relojoarias; comércio de artigos médicos e ortopédicos; serviços de publicidade e afins; petshops; lojas de variedades; agências de turismo; concessionárias de veículos; óticas; floriculturas; bancas de revista.
  • Lotação das UTIs: em 24 de maio, a taxa de ocupação de leitos de UTI era 65%. Dos 425 leitos de UTI disponíveis nas unidades da rede estadual de saúde que atendem pacientes de Covid-19, 268 estavam ocupados. Desse total, 179 com pacientes Covid e não-Covid (89). Não foi informado se são leitos em hospitais públicos ou privados.
  • Argumento do governo: Segundo o governo estadual, a decisão foi tomada com base em dados do comitê de crise que apontam queda nos números de Covid-19 no estado. A Prefeitura afirmou, por meio de nota, que mesmo com a reabertura gradual do comércio, medidas de apoio à saúde foram adotadas na cidade, como interdição de espaços públicos, higienização de pontos com movimentos essenciais e decretos de uso de máscaras e teletrabalho a servidores públicos.
  • Argumento dos especialistas: "No cenário mais brando, sendo mais conservador e menos pessimista possível, nós teremos, sem dúvida, duas vezes mais mortes do que tivemos no primeiro colapso de saúde. Teremos um novo colapso, isso é muito certo", alertou o pesquisador Lucas Ferrante, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). Para ele, o governo foi negligente em relaxar as medidas de isolamento.

Recife

Ruas do Recife ficam mais cheias depois de relaxamento das restrições

Ruas do Recife ficam mais cheias depois de relaxamento das restrições

  • Data da decisão sobre flexibilização/fim da quarentena: 1° de junho.
  • O que pode funcionar: Além dos serviços essenciais podem funcionar lojas de material de construção e serviço de delivery do comércio não-essencial.
  • Lotação das UTIs: 79% no dia 3 de junho. Não foi informado se são leitos em hospitais públicos ou privados.
  • Argumento do governo: Um dos argumentos para a flexibilização da quarentena foi o fato de que Pernambuco reduziu a taxa de reprodução do vírus para um número inferior a um (0,93) em 27 de maio -- mas, na quarta-feira (3), o nível subiu para 1,2. O secretário municipal de Saúde, Jailson Correia, disse que há indícios de desaceleração da curva de contágio da Covid-19. "Tivemos redução no atendimento às pessoas nas 22 unidades básicas de saúde que são dedicadas a pacientes com problemas respiratórios. Tivemos também redução nos chamados de síndromes respiratórias agudas graves no Samu [Serviço de Atendimento Móvel de Urgência]".
  • Argumento dos especialistas: "Estamos, sim, numa estabilização, mas não estamos em uma situação de conforto. Poderíamos esperar mais uma semana para flexibilizar as atividades, porque pode haver um ruído de baixa", explicou o cientista Jones Albuquerque, do Instituto para Redução de Riscos e Desastres da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE).

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