Por Marília Neves, G1 — São Paulo


Corpo do diretor de teatro Antunes Filho é velado em São Paulo

Corpo do diretor de teatro Antunes Filho é velado em São Paulo

O corpo de Antunes Filho foi velado na manhã desta sexta-feira (3) no Teatro Sesc Anchieta, no Sesc Consolação, região central de São Paulo. O diretor de teatro morreu na noite desta quinta-feira (2) aos 89 anos e deixa um filho, quatro netos e dois bisnetos.

Filho foi internado no Hospital Sírio-Libanês no último dia 22, após sentir um mal-estar. Depois de passar por exames, o diretor descobriu estar com câncer de pulmão em estágio avançado.

Salva de palmas homenageia o diretor de teatro José Alves Antunes Filho durante seu velório no teatro Sesc Anchieta, em São Paulo — Foto: Roberto Casimiro/Fotoarena/Estadão Conteúdo

O corpo do diretor chegou às 7h ao teatro e está sendo velado com o caixão fechado. Cerca de 20 familiares e amigos acompanhavam o velório antes da abertura para o público geral, que se iniciou às 8h15. O velório ocorre até 15h, quando o corpo segue para o crematório da Vila Alpina, Zona Leste de São Paulo, onde será cremado em cerimônia fechada.

Antunes Filho, em foto de 2008 — Foto: Patrícia Santos/ Estadão Conteúdo

Referência do teatro brasileiro

José Alves Antunes Filho era considerado pela crítica especializada um dos principais nomes do teatro brasileiro. Artistas como Sônia Braga, Paulo Betti, Stênio Garcia, Zé Celso Martinez e Matheus Nachtergaele comentaram a morte dele.

Integrante do Teatro Brasileiro de Comédia e fundador do Centro de Pesquisa Teatral (CPT), ele se consagrou e ganhou prestígio como diretor com a montagem de obras de grandes nomes do teatro e da literatura e pelo seu trabalho na formação de atores. (leia mais abaixo)

Antunes Filho trabalhou até os últimos dias de vida. A montagem mais recente dele no teatro foi a peça “Eu Estava em Minha Casa e Esperava que a Chuva Chegasse”, texto do francês Jean-Luc Lagarce que estreou no teatro do Sesc Consolação em setembro do ano passado.

Aplausos no velório do diretor de teatro Antunes Filho

Aplausos no velório do diretor de teatro Antunes Filho

Veja o que marcou a carreira do diretor

  • Ganhou destaque e prestígio como diretor teatral ao montar "Macunaíma", baseado na obra de Mário de Andrade, em 1978
  • Criou o Centro de Pesquisa Teatral (CPT), escola de formação e grupo teatral por onde passaram importantes nomes do teatro nacional
  • Integrou o Teatro Brasileiro de Comédia entre os anos 50 e 60
  • Fundou a companhia Pequeno Teatro de Comédia na década de 1950
  • Produziu e dirigiu o filme "Compasso de espera", em 1973, sobre o racismo
  • Montou obras de Nelson Rodrigues e William Shakespeare

'Compasso de espera', filme de Antunes Filho de 1973 que trata da temática do racismo — Foto: Reprodução/YouTube

Os primeiros anos no teatro

Antunes Filho nasceu em São Paulo, em 12 de dezembro de 1929, no tradicional bairro do Bixiga, região central da cidade. Na juventude, chegou a entrar na Faculdade de Direito da USP, mas desistiu do curso para estudar artes dramáticas.

O diretor fez parte da primeira geração de encenadores brasileiros dissidentes do Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), onde começou como assistente de direção em 1952. Lá, trabalhou com estrangeiros que influenciaram sua geração: Zibgniew Ziembinski, Adolfo Celi, Luciano Salce, Ruggero Jacobbi e Flaminio Bollini.

A estreia de Filho no no teatro foi em 1953 com a peça Week-end, de Noel Coward. Em 1958, fundou a companhia Pequeno Teatro de Comédia e dirigiu o espetáculo “O Diário de Anne Frank”, ganhando prêmios da Associação Paulista de Críticos de Artes (APCA) e da Associação Carioca de Críticos Teatrais (ACCT). Ficou na companhia até o início dos anos 1960, quando voltou ao TBC.

Sua busca pela perfeição e a disciplina dos atores deu ao diretor a fama de muito exigente.

"O ator é uno. E é um estrangeiro também, está sempre trabalhando nos seus limites. Tudo o que se faz no CPT [Centro de Pesquisa Teatral] com os exercícios e as técnicas busca a totalidade da relação fisiológica, imagética e, lá na frente, espiritual do ator", afirmou em entrevista de 2013.

Macunaíma, montagens de Nelson Rodrigues e Shakespeare

Em meados dos anos 1960, Antunes Filho encenou sua primeira peça de Nelson Rodrigues, “A falecida”. Anos depois, montou “Bonitinha, mas ordinária”, e adaptou “Vestido de Noiva” para uma série de teleteatro na TV Cultura.

Foi, no entanto, com a versão que Antunes montou em 1978 de “Macunaíma”, de Mário de Andrade, que a carreira dele como diretor ganhou maior prestígio. Foram 876 apresentações no Brasil e no exterior.

Atores no palco em montagem de Macunaíma — Foto: Reprodução/TV Globo

"Macunaíma inaugurou um modo de ver teatro no Brasil, uma perspectiva, uma linha de fuga do teatro que se fazia, que eu fazia. Sua importância vai desde a construção do espetáculo, colaborativa já naquela época, até o revolver do mito do herói sem caráter brasileiro", disse Antunes em 2013.

O diretor passou, então a conduzir o Grupo Macunaíma, que encenou mais adaptações de textos de Nelson Rodrigues, além da consagrada versão de "Romeu e Julieta" com trilha sonora com música dos Beatles, em 1984.

Antunes Filho com camiseta em homenagem a Nelson Rodrigues — Foto: Reprodução/TV Globo

Centro de pesquisa e última estreia

Com o apoio do Sesc, criou Centro de Pesquisa Teatral (CPT), escola de formação e grupo permanente, que dirigiu até a sua morte. A última montagem de Filho no teatro foi a peça “Eu Estava em Minha Casa e Esperava que a Chuva Chegasse”, que estreou no teatro do Sesc Consolação em setembro do ano passado.

O também diretor Emerson Danesi, que assinou a produção executiva da última peça de Filho, trabalhou com ele por 23 anos e disse que a paixão pelo teatro era a sua marca.

"Ele era um homem completamente apaixonado, uma vida inteira dedicada ao teatro. E até os últimos momentos aqui, no hospital, era isso. Algumas pessoas do grupo vieram pra cá [hospital], e ele ainda [continuava] puxando trabalhos de voz, puxando trabalho de corpo. Um homem que dedicou a existência ao teatro", disse Danesi.

Entre os artistas que passaram pela supervisão de Antunes estão nomes como: Luís Melo, Giulia Gam, Alessandra Negrini, Camila Morgado, Renata Jesion, Ondina Clais Castilho, Laura Cardoso, Eva Wilma, Raul Cortez, Cacá Carvalho, Stênio Garcia, Denise Stoklos, Marco Braz, Samir Yazbek, Lee Taylor, Bete Coelho e Roberto Alvim.

Antunes Filho (centro, de camisa branca e blusa vermelha) durante ensaio — Foto: Reprodução/TV Globo

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