Por Carlos Brito, G1 Rio


Técnicos da Fiocruz e da Prefeitura de Niterói encontraram o novo coronavírus na rede de esgotos da cidade. — Foto: Reprodução

Especialistas em recursos hídricos alertam para o risco de uma contaminação em larga escala pelo novo coronavírus no Estado do RJ -- e também no Brasil. Um dos que fazem essa afirmação é o médico, suplente de vereador e ex-presidente da Frente Parlamentar de Saneamento Municipal, Alexandre Arraes.

"Um estudo publicado este mês pela Universidade de Stirling, da Escócia, registrou o caso de um paciente cujas fezes continham o coronavírus 11 dias depois de apresentar os primeiros sintomas", alertou Arraes.

"O mesmo estudo encontrou o vírus 33 dias depois de o teste ter dado negativo, ou seja, com a pessoa em tese já curada. Essa situação liga um alerta, uma vez que o esgoto fica contaminado. Ainda não é possível afirmar que a contaminação possa se dar por esse meio, mas não podemos ignorar que estamos diante de um risco real", explicou.

Uma análise da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) já apontou a presença do novo coronavírus nos esgotos de Niterói, Região Metropolitana do Rio. A descoberta é um indício do espalhamento do patógeno causador da Covid-19 no estado.

Os pesquisadores disseram que esse tipo de análise só é possível em cidades em que uma parcela significativa da população é atendida por rede de esgoto e a operadora do serviço tem controle sobre o sistema. Em Niterói, a rede cobre 95% do município.

Testes

Cientistas da Fiocruz analisam material colhido na rede de esgoto de Niterói — Foto: Divulgação

Ainda assim, segundo a Companhia Estadual de Água e Esgoto (Cedae), estudo semelhante deverá ser feito na capital e em outros locais do estado.

"A Cedae, a Fiocruz, a Universidade Federal do Rio de Janeiro e a Secretaria de Saúde de Estado do Rio de Janeiro estão atuando em conjunto, em um grupo de trabalho coordenado pela Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental - Seção Rio de Janeiro, para viabilizar a verificação da presença do novo coronavírus nas redes de esgotos da companhia. O objetivo é que as informações obtidas possibilitem a Secretaria de Saúde realizar planejamento preventivo no combate ao Coronavírus (Covid-19)", afirmou a Cedae, por meio de nota.

"Testes como esse são importantes para a prevenção de surtos, caso a contaminação por esgoto venha a ser comprovada em algum momento. Essa situação que vivemos agora também mostra importância do esgoto tratado – a colocação de cloro, tanto na água consumida quanto no esgotamento sanitário de dejetos, mata o coronavírus. Infelizmente, nem todos os consumidores têm acesso a esse serviço", lamentou Arraes.

Segundo ele, os serviços de tratamento de esgoto da Cedae atingem 92% da cidade do Rio de Janeiro - ou seja, um percentual de moradores da capital não teria acesso ao esgoto tratado com cloro, ficando mais exposta ao coronavírus.

"No entanto, não temos certeza sobre esse percentual, uma vez que a Cedae não considera as áreas informais, como favelas, alegando que não tem como fazer a aferição nesses locais".

O G1 questionou a Cedae sobre qual a extensão da rede de esgotos nas favelas do Rio. A companhia não ofereceu um número preciso, mas admitiu a dificuldade para chegar nesse locais:

"Com relação às comunidades, a Cedae atua regularmente para reforçar o abastecimento. O crescimento desordenado com ações contínuas do uso indevido do solo em locais não edificáveis, cuja fiscalização não é de responsabilidade da Cedae, impacta na prestação do serviço e, muitas vezes, dificulta a expansão da infraestrutura para estas localidades. Para reforçar o abastecimento dessas regiões, a companhia adotou as seguintes medidas: contratou novos caminhões-pipa que estão atendendo solicitações prioritariamente de comunidades, 250 trabalhadores atuam somente atendendo comunidades, lançou o programa de instalação de sistemas alternativos de abastecimento que já estão em operação nas comunidades do Brejo (Cidade de Deus), Rio das Pedras, Vila dos Pinheiros (Complexo da Maré), Camarista Méier, Juramentinho e Muzema".

Brasil: só 46% do esgoto é tratado

Ainda de acordo com a Cedae, toda água distribuída e esgoto tratado pela companhia recebe a aplicação de cloro.

"Em termos de investimentos em tratamento de esgoto, ainda estamos bem atrasados. Sem dúvida, encontrar o material genético do novo coronavírus nos esgotos é uma situação preocupante para a saúde pública em geral", explicou o representante do Instituto Trata Brasil, Raul Pinho, instituição que estuda os avanços do saneamento básico e na proteção dos recursos hídricos do país.

Segundo dados do instituto, 46% do esgoto produzido no Brasil recebe tratamento e possui destinação adequada.

"É difícil imaginar o tamanho do problema que teremos se a contaminação da Covid-19 por meio do esgoto não tratado se confirmar", finalizou Pinho.

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