Por Gabriella Ramos*, G1 Campinas e Região


Tecnologia alcançou 95% de supressão de larvas selvagens na área tratada — Foto: Eliandro Figueira/Oxitec

O projeto "Aedes do Bem", em Indaiatuba (SP), anunciou ter alcançado 95% de supressão de larvas selvagens na área onde foram soltadas minicápsulas com mosquitos Aedes aegypti geneticamente modificados.

As minicápsulas utilizadas no tratamento contêm milhares de ovos do inseto transgênico. Quando em contato com água, os ovos eclodem e apenas as larvas dos machos, que não picam e não transmitem doenças, sobrevivem até a fase adulta.

Segundo a Oxitec, empresa responsável pela tecnologia, o estudo foi realizado durante 13 semanas em 10 bairros, onde vivem cerca de 1 mil pessoas.

O tratamento consistiu na colocação das minicápsulas em imóveis residenciais uma vez por semana, sem a interferência de outras ferramentas ou manuseios especiais.

Bairros participantes

  • Jardim Pau Preto
  • Jardim Portal do Sol
  • Vila Romana
  • Cidade Nova
  • Jardim Carlos Aldrovandi
  • Solar de Itamaracá
  • Jardim Bela Vista
  • Jardim Europa
  • Parque Residencial Indaiá
  • Jardim Jequitibá

Para a médica infectologista Raquel Stucchi, a solução se destaca por ser economicamente vantajosa. "Se a gente pensar bem, se colocar na ponta do lápis quanto custa você enfrentar uma epidemia de dengue [...] possivelmente a relação custo-benefício aparece", pondera.

A professora da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia ressalta, no entanto, que é necessário manter os cuidados já conhecidos em relação à dengue.

"O cuidado com o meio ambiente, com o entorno, com o lixo e não deixar água parada, eu acho que isso tem que se manter independente do uso dessa tecnologia ou não. [...] seria uma alternativa válida sim, que iria se somar aos cuidados de prevenção e com o cuidado com o meio ambiente", afirma.

Micro-cápsulas contêm ovos de mosquitos Aedes aegypti geneticamente modificados — Foto: Eliandro Figueira/Oxitec

Guerra contra o Aedes

Segundo Natalia Ferreira, diretora geral da Oxitec, a tecnologia surgiu como uma ferramenta complementar às iniciativas já utilizadas pelo poder público no combate ao mosquito. "A gente tem vindo de uma série de altas temporadas bastante desafiadoras para muitos municípios e isso só confirma aquilo que todo mundo já sabe: a gente está perdendo essa guerra", diz.

De acordo com a diretora geral, os recursos utilizados pelos agentes não são mais suficientes, já que a incidência das epidemias de dengue no Brasil está cada vez maior.

"Os mosquitos estão cada vez mais desenvolvendo resistência aos químicos que são utilizados nas nebulizações e, muitas vezes, o trabalho de conscientização da população, que é muito importante, não é suficiente. [...] Toda vez que a gente está perdendo uma guerra, a gente precisa inovar", ressalta Natalia.

Quando em contato com água, as minicápsulas eclodem e liberam larvas do mosquito Aedes aegypti — Foto: Eliandro Figueira/Oxitec

Como funciona?

As minicápsulas utilizadas no tratamento contêm milhares de ovos da segunda geração de mosquitos Aedes aegypti geneticamente modificados. Quando em contato com água, os ovos eclodem e apenas as larvas dos machos, que não picam e não transmitem doenças, sobrevivem até a fase adulta.

"[Os machos] vão procurar as fêmeas selvagens, vão acasalar com elas e, da descendência dos ovos que essa fêmea colocar, todas as fêmeas vão morrer e todos os machos vão herdar essa característica autolimitante dos pais [...] de maneira que o efeito é sustentado por até 10 gerações", explica Natalia Ferreira.

Segundo Natalia, o uso das minicápsulas permite que a tecnologia seja barateada e se torne mais acessível para municípios afetados pela doença.

"Essas cápsulas podem ser colocadas em locais estratégicos do município [...] e elas vão fazer todo o trabalho. Com isso, qualquer município pode facilmente receber as microcápsulas e aplicar onde for mais necessário dentro da área urbana", diz.

A diretora da Oxitec afirma que, após a aprovação concedida pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) recentemente, o próximo passo é escalonar o produto.

"A nossa intenção é, na alta temporada de 2020, que começa entre outubro e novembro com a chegada do calor e das chuvas, a gente já estar pronto para fazer um ensaio de campo no interior de São Paulo", prevê.

Mosquito Aedes aegypti é o tranmissor de doenças como zika, dengue e chikungunya — Foto: Rodrigo Méxas e Raquel Portugal/Fundação Oswaldo Cruz/Divulgação

Implantação

Segundo Ulisses Bernardinetti, coordenador do Centro de Operações Contra a Dengue de Indaiatuba, a parceria com a empresa de biotecnologia, que acontece desde 2018, teve resultados positivos. "A tecnologia traz uma perspectiva boa, satisfatória e acreditamos que, com os índices alcançados, irá colaborar e muito na diminuição de casos de dengue", analisa.

"Nós estamos sim com uma planejamento de novas liberações dessa segunda geração em várias outras áreas, mas isso é um processo de trabalho que vai demandar bastante tempo e planejamento", afirma Ulisses.

De acordo com a prefeitura, o município contabiliza, até esta publicação, 146 casos confirmados da dengue tipo 2 neste ano; desses, 132 são autóctones e 14 foram importados. Ao todo, a cidade recebeu 233 notificações da doença.

*Sob a supervisão de Fernando Evans

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