Por Mateus Rodrigues e Ana Carolina Moreno, TV Globo e G1


O ministro da Educação, Abraham Weintraub, e o secretário de Alfabetização, Carlos Nadalim, em vídeo divulgado pelo MEC na sexta-feira (9) — Foto: Reprodução/MEC

O Ministério da Educação deve lançar nesta quinta-feira (15) uma cartilha com orientações para prefeitos e governadores sobre a implementação da Política Nacional de Alfabetização (PNA). As novas orientações foram publicadas em 11 de abril, na cerimônia de 100 dias do governo Bolsonaro – a medida estava na lista de 35 prioridades para o período. Mas, passados quatro meses, elas ainda não foram implementadas em nenhum colégio.

"Já tem mais de 100 dias que a nova Política Nacional de Alfabetização está vigorando, onde têm que ser usado critérios científicos para ensinar as crianças a ler e escrever", explicou o ministro da Educação, Abraham Weintraub, em um vídeo publicado na última sexta-feira (9).

O documento, publicado na forma de um decreto, entrou em vigor imediatamente. O problema é que, sem instruções mais detalhadas, os secretários municipais e estaduais de educação não têm como elaborar novas propostas de alfabetização para os colégios.

Em 16 de abril, o MEC informou, em uma notícia publicada em seu portal, que "está previsto para os próximos dias o lançamento de um caderno da PNA, no qual serão apresentadas suas diretrizes, princípios, objetivos, entre outros pontos que constam no decreto presidencial".

Questionada sobre o documento, a pasta afirmou nesta segunda, via Lei de Acesso à Informação, que, "de fato, o Caderno referente à Política Nacional de Alfabetização está em vias de ser publicado".

Sobre quantos municípios já haviam aderido à PNA, o MEC afirmou que a política se trata de um "instrumento normativo composto de definições básicas, princípios e diretrizes" e que seu objetivo é "alinhar e harmonizar" os novos programas e ações voltados à alfabetização.

"Outra coisa diferente são os programas propriamente ditos que da PNA serão decorrentes, os quais essencialmente serão por adesão voluntária. Na medida em que esses programas forem normatizados e publicados será dada, naturalmente, a devida divulgação da lista de estados e municípios aderentes", disse o MEC.

Adesão voluntária

O decreto de abril diz que a adesão dos governos locais será voluntária, "na forma a ser definida em instrumentos específicos dos respectivos programas e ações do Ministério da Educação e de suas entidades vinculadas". Até esta segunda (12), esses instrumentos ainda não tinham sido criados.

O texto também diz que a União "poderá prestar assistência técnica e financeira aos entes federativos", o que também não ocorreu nestes quatro meses. O MEC não informou se haverá verba para a elaboração destes currículos ainda em 2019, e quanto será destinado para essa mudança pedagógica nos próximos anos.

O presidente Jair Bolsonaro, durante cerimônia de assinatura da Política Nacional de Alfabetização e outras 17 medidas — Foto: Fátima Meira/Futura Press/Estadão Conteúdo

O que é a Política Nacional de Alfabetização?

A Política Nacional de Alfabetização é um decreto publicado em abril que prevê, entre outras mudanças, que o ensino infantil reforce as atividades de pré-alfabetização, e que haja esforço extra para concluir o ensino da leitura já no primeiro ano do ensino fundamental.

Entre os objetivos do decreto publicado está cumprir a meta 5 do Plano Nacional de Educação (PNE). A meta, que entrou em vigor em 2014 e tem vigência até 2024, diz que todas as crianças devem ser alfabetizadas até no máximo o final do 3º ano do fundamental, ou seja, aos 8 anos de idade.

A política também prioriza um método de ensino sobre os demais: o chamado método fônico, classificado no decreto como uma lista de "seis componentes essenciais para a alfabetização" (leia abaixo o trecho do decreto).

Segundo especialistas ouvidos pelo G1, a criação de uma política nacional de alfabetização é positiva, mas a priorização de um único método pode levar à padronização do ensino, e o risco disso é limitar tanto as possibilidades de os professores ensinarem, quanto as possibilidades de os alunos aprenderem.

Alfabetização com componentes do método fônico é priorizada na Política Nacional de Alfabetização — Foto: Fernanda Garrafiel / Editoria de Arte

Método 'internacional' e Paulo Freire

No vídeo publicado na sexta, o ministro Weintraub acompanhado do secretário de Alfabetização do MEC, Carlos Nadalim, diz que não está inventando a roda.

"A gente tá fazendo o que os países que conseguem alfabetizar bem as suas crianças fazem", afirma Weintraub, sem citar quais seriam essas medidas.

O ministro também pergunta a Nadalim sobre o trabalho do educador e filósofo Paulo Freire – classificado por Weintraub como um "fetiche no Brasil".

"Tem algum país do mundo que segue o Paulo Freire fora o Brasil?", questiona Weintraub. "No âmbito da alfabetização, que eu saiba, não", responde Nadalim.

"Só o Brasil que está há bastante tempo insistindo nisso", diz Weintraub em seguida.

No entanto, o método Paulo Freire de Alfabetização, criado no início dos anos 1960, nunca foi voltado para o ensino da língua portuguesa para crianças e adolescentes. A ideia desse método é alfabetizar adultos que não tiveram acesso à escola regular, usando o conhecimento de mundo dessas pessoas e frases mais próximas da realidade delas, em vez da repetição de frases infantis.

O trabalho de Freire é amplamente estudado no exterior, e sua obra "Pedagogia do Oprimido" foi a única de um autor brasileiro a aparecer na lista de 100 títulos mais pedidos pelas universidades inglesas, segundo um estudo do projeto Open Syllabus divulgado em 2016.

Segundo o Indicador de Analfabetismo Funcional (Inaf) de 2018, três em cada dez brasileiros entre 15 e 64 anos eram considerados analfabetos funcionais.

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