Política Brasília

MPE recomenda envio de provas do inquérito que investiga fake news no STF a processo de cassação de Bolsonaro no TSE

Processo na Justiça Eleitoral investiga se a chapa do presidente se beneficiou da contratação de empresas de disparos de mensagens em massa
A sede da PGR, em Brasília: chefe do MPF é o único que pode denunciar deputados, senadores, ministros e o presidente da República Foto: MPF
A sede da PGR, em Brasília: chefe do MPF é o único que pode denunciar deputados, senadores, ministros e o presidente da República Foto: MPF

BRASÍLIA — O vice-procurador-geral Eleitoral, Renato Brill de Góes, encaminhou nesta terça-feira ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) parecer favorável ao compartilhamento de provas do inquérito do Supremo Tribunal Federal (STF) que investiga a disseminação de notícias falsas e ataques a ministro da Corte com um processo de cassação da chapa de Jair Bolsonaro e Hamilton Mourão no TSE.

O inquérito do STF foi aberto em março do ano passado. Há duas semanas, o relator, ministro Alexandre de Moraes, determinou buscas e apreensões em endereços ligados a apoiadores de Bolsonaro. O episódio aumentou ainda mais as críticas do governo ao Supremo. Já a ação no TSE foi aberta a pedido da coligação encabeçada pelo PT, que teve Fernando Haddad como candidato em 2018.

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O processo no TSE investiga se a chapa vitoriosa para a presidência da República se beneficiou da contratação de empresas de disparos de mensagens em massa. O caso veio à tona a partir de reportagem do jornal “Folha de S. Paulo” de dezembro de 2018 que denunciou “irregularidades na contratação do serviço de disparos em massa de mensagens de cunho eleitoral, pelo aplicativo de mensagens instantâneas WhatsApp”.

Segundo uma testemunha, uma rede de empresas recorreu ao uso fraudulento de nome e CPF de idosos para registrar chips de celular e garantir o disparo de lotes de mensagens em benefício de políticos. Ou seja, empresas de disparos em massa teriam usados dados de terceiros, adquiridos de forma ilegal, porque não tinham autorização para tanto.

Ainda segundo o processo, duas dessas agências foram subcontratadas pela empresa AM4, que foi a maior fornecedora da campanha de Bolsonaro. Segundo a prestação de contas do hoje presidente ao TSE, foram pagos R$ 650 mil à empresa.

O PT pediu compartilhamento das provas do inquérito do Supremo porque, ao longo das investigações, foi identificado o “gabinete do ódio”, um grupo dedicado a disseminar notícias falsas e ataques ofensivos a pessoas comuns, autoridades e instituições. Segundo depoimento prestado por um deputado federal cujo nome é mantido em sigilo, o grupo teria, entre seus principais integrantes, assessores especiais da Presidência da República.

Ainda segundo o inquérito do STF, há um grupo de empresários responsáveis pelo financiamento dessa rede de propagação de mensagens falsas ou agressivas. Entre os suspeitos está o dono das lojas Havan, Luciano Hang. Entre as provas a serem compartilhadas, estão os objetos apreendidos há duas semanas nas buscas e apreensões - como celulares, computadores e outros dispositivos eletrônicos.

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Em manifestação ao TSE, a defesa de Bolsonaro foi contra o compartilhamento de provas. Argumentou que o inquérito do STF trata da divulgação de notícias falsas e ofensivas aos ministros da Corte - e, portanto, não teriam nada a acrescentar no processo de cassação de mandato. O procurador-geral eleitoral ponderou que as provas obtidas na busca e apreensão podem ser úteis no processo do TSE.

“Como pontuado pelos representados, o objeto do Inquérito nº 4781/DF, a princípio, não guarda correspondência com a causa de pedir estampada na inicial. No entanto, não há como olvidar que os elementos de informação decorrentes das diligências determinadas na decisão proferida pelo ministro Alexandre de Moraes podem desvelar fatos que se relacionem com a questão discutida nestes autos”, escreveu o procurador.

Ele ponderou que, no inquérito das fake news, Luciano Hang é listado como suspeito de ter integrado grupo de empresários que colaboram para impulsionar vídeos e materiais contendo ofensas e notícias falsas, com o objetivo de desestabilizar as instituições democráticas e a independência dos poderes, por meio de aplicativos como o WhatsApp. Uma das diligências do inquérito do Supremo foi a quebra do sigilo fiscal e bancário do empresário referentes ao período julho de 2018 e abril de 2020, que compreende a campanha eleitoral de 2018.

“Nessa toada, as diligências determinadas no Inquérito nº 4781/DF podem trazer luz ao esclarecimento dos fatos apontados na inicial, na medida em que poderão vir a demonstrar a origem do financiamento das práticas imputadas à campanha dos representados na inicial”, observa o procurador. Renato Brill de Góes afirma que “há um nítido liame entre os fatos, ainda que o conteúdo das mensagens veiculadas possa ser diverso”.

O procurador explica que, se as provas forem mesmo compartilhadas, o TSE terá a obrigação de mantê-las em sigilo, porque elas estão sob essa condição no STF. Caberá ao relator da ação no TSE, ministro Og Fernandes, decidir se autoriza ou não o uso das provas.

O relator já tinha declarado encerrada a fase de produção de provas da ação do STF e tinha determinado a apresentação de alegações finais da defesa e da acusação. No entanto, diante de novas revelações no inquérito do STF, e diante de pontos em comum entre as duas investigações, o PT pediu reabertura da fase probatória e o relator concordou. Agora, Og Fernandes vai decidir pelo compartilhamento ou não das provas. Se aceitar, será aberto novo prazo para as partes se manifestarem sobre as provas.

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Depois disso, se não houver mais apresentação de novas provas da defesa ou da acusação, será aberto prazo para alegações finais. Em seguida, o relator vai elaborar um voto e liberar o processo para julgamento em plenário. Diante da indefinição sobre a fase probatória, não há previsão de quando isso vai acontecer. O presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, já afirmou que incluirá as ações de cassação na pauta de julgamentos assim que o relator liberar. Ao todo, são oito processos contra a chapa Bolsonaro-Mourão aguardando julgamento no tribunal.

Ações julgadas nesta sexta-feira

O TSE julga, nesta terça-feira, duas Ações de Investigação Judicial Eleitoral (Aijes) que pedem a cassação da chapa . Segundo as ações que serão analisadas nesta terça-feira, hackers atacaram um grupo de Facebook com o objetivo de beneficiar a chapa de Bolsonaro e Mourão. O julgamento das ações começou em novembro do ano passado, quando Og Fernandes votou pelo arquivamento das ações. O ministro Edson Fachin pediu vista para examinar melhor os processos. Agora, o julgamento será retomado.

As ações foram apresentadas por Guilherme Boulos e Marina Silva, que também concorreram à presidência da República em 2018. Segundo as ações, o grupo virtual “Mulheres Unidas contra Bolsonaro”, com 2,7 milhões de participantes, foi alvo de ataques que alteraram o visual e conteúdo da página. Originalmente, o grupo criticava Bolsonaro. Depois da atuação dos hackers, o grupo passou a se chamar “Mulheres com Bolsonaro #17”, com a publicação de mensagens de apoio ao candidato.

Ainda de acordo com os processos, Bolsonaro publicou em seu perfil oficial no Twitter a mensagem “Obrigado pela consideração, mulheres de todo o Brasil”, com foto da página do grupo modificada. Segundo os autores das ações, isso seria indício da provável participação de Bolsonaro no episódio ou, ao menos, de que ele sabia da alteração.