Economia

Bolsonaro assina projeto de lei que prevê autonomia do Banco Central

Medida era uma das metas dos cem primeiros dias de governo. Em paralelo, presidente revogou 250 decretos e normas
Campos Neto, presidente do BC Foto: Leandro Rodrigues / Valor
Campos Neto, presidente do BC Foto: Leandro Rodrigues / Valor

BRASÍLIA E RIO - O presidente Jair Bolsonaro assinou nesta quinta-feira um projeto de lei que estabelece a autonomia do Banco Central . A medida foi uma das 18 — entre decretos e outros projetos de lei — assinadas por Bolsonaro na solenidade de cem dias de governo realizada no Palácio do Planalto. Na área econômica, o presidente assinou ainda o chamado "revogaço" , um decreto que extingue regras burocráticas que, na avaliação da equipe econômica, dificultam a vida de empresas e cidadãos. Na avaliação do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, a medida, no entanto, terá um efeito pequeno , já que a maioria das regras anuladas não estavam mais valendo.

Propor a autonomia do BC era uma das 35 metas dos primeiros cem dias do governo. De acordo com comunicado do governo, o objetivo é formalizar, na lei, a situação que já existe hoje. De acordo com o ministro-chefe da Casa Civil, o texto prevê, entre outros pontos, o estabelecimento de mandatos de quatro anos não coincidentes com o do presidente da República. Além disso, o presidente do BC perde o status de ministro.

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O ex-ministro e candidato derrotado à Presidência da República Ciro Gomes (PDT)criticou a proposta de autonomia do BC afirmando que a eventual aprovação seria caso de "ir pra rua e quebrar tudo".

Na segunda-feira, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou que ter a autonomia do órgão registrada em lei ajudaria a reduzir o "risco Brasil" e a aumentar o crescimento de longo prazo.

Segundo o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, a decisão de enviar um novo texto foi negociada com Rodrigo Maia. Além do projeto do presidente da Câmara, outra proposta chegou a ser apresentada no Senado pelo senador Plínio Valério (PSDB-AM) neste ano para tratar da mesma questão. A expectativa é que essas matérias sejam apensadas para acelerar a tramitação.

— Conversamos com o presidente Rodrigo Maia, antes da sua viagem. Disse a ele que o presidente Rodrigo Maia tem o mérito de ter apresentado o projeto, e esse é o trabalho dos parlamentares. A independência do Banco Central é uma ferramenta muito importante usada pelas principais nações do mundo para dar tranquilidade a esse setor que mexe com a vida de todos nós. Quero reconhecer aqui a iniciativa e a qualidade do projeto do deputado Rodrigo Maia. Nós combinamos com ele — disse Onyx.

Se o projeto for aprovado, o presidente do BC passará a ter mandato fixo de quatro anos, não coincidentes com o do presidente da República. O objetivo é evitar que a autoridade monetária sofra influência política. Com a mudança, o presidente do BC deixará de ter status de ministro, mas terá salvaguardas jurídicas, informou a Casa Civil.

A proposta de autonomia amplia o poder da autoridade monetária sobre a legislação do setor e na fiscalização do sistema financeiro, como mostrou o GLOBO no fim de março. O novo presidente do BC, Roberto Campos Neto, já enviou sugestões para o texto, que é um projeto de lei complementar e precisa ser aprovado na Câmara e no Senado.

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A área econômica era a mais demandada no plano de cem dias do governo Bolsonaro. Nos últimos dias, o Ministério da Economia anunciou o corte de 21 mil funções gratificadas e cargos comissionados e editou decreto que endurece regras para realização de concursos públicos. O chamado revogaço, assinado nesta quinta, extingue 250 decretos e normas. O governo calcula que existem hoje no Brasil 25 mil decretos.

"Este Decreto faz parte de um processo contínuo da Casa Civil que irá revogar tudo que for considerado desnecessário e, então, garantir a democratização do acesso à legislação ao cidadão", afirmou o Planalto, em nota.

O líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo, disse que a expectativa é que o tema seja resolvido ainda neste ano.

Amadurecimento da economia

Tornar o Banco Central autônomo é uma medida que pode contribuir bastante para melhorar a imagem da economia do Brasil no cenário internacional, afirma  Alexandre Espírito Santo, economista da Órama.

— Essa medida é muito boa, uma das mais importantes da agenda econômica nos cem dias do governo — destacou Espírito Santo. — Há anos, desde o governo de Itamar Franco, que se falava em autonomia do BC. Agora, está sendo formalizada uma prática que vinha acontecendo de maneira 'informal', sem nenhum documento que oficializasse.

O economista explicou que a autonomia contribui para que o mercado tenha noção de que a autoridade monetária não ficará sujeita a pressões políticas em momentos de aperto financeiro.

— A independência do BC dá sinais de amadurecimento da economia. Isso não significa que ele ficará subserviente aos desejos do mercado. Ele também terá uma equipe técnica e qualificada que trabalhará sem pressões de governo.

Espírito Santo também vê a autonomia do BC como um possível passo para a entrada do Brasil na OCDE, organismo que reúne sobretudo países ricos:

— Entrar na OCDE sem o Banco Central independente é muito difícil. Acredito que essa medida em relação ao BC ajuda o Brasil a tentar seu ingresso no grupo.