Economia

Bolsonaro pediu para CPMF não entrar na reforma tributária, diz Guedes

Ministro afirmou ainda que é 'fake news' que o presidente queira derrubar a regra do teto de gastos: 'Ele está 100% fechado comigo'
O ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: MARCELO THEOBALD / Agência O Globo
O ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: MARCELO THEOBALD / Agência O Globo

RIO - O ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou nesta sexta-feira que o presidente Jair Bolsonaro telefonou para ele do hospital, "entubado", para dizer que não quer a criação de uma nova CPMF na reforma tributária.

- Estávamos simulando um imposto de transação financeira, só que o presidente sempre foi contra esse imposto e pediu pra não colocar - afirmou Guedes em entrevista a correspondentes estrangeiros no Rio de Janeiro.

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O ministro confirmou que a equipe econômica trabalhava com uma alíquota de 0,4% para o tributo sobre pagamentos, mas, mostrando irritação, afirmou que os números não deveriam ter sido levados a público ainda.

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Segundo Guedes, o ex-secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra, exonerado esta semana, já havia pedido para deixar o cargo "inúmeras vezes" por achar que estava atrapalhando o governo.

— Eu dizia: se você tiver que cair um dia que caia junto com o imposto — afirmou Guedes.

Guedes explicou que, sem o imposto sobre transações financeiras, a proposta de reforma tributária que será enviada ao Congresso se apoiará em três pilares: um IVA 'dual', a revisão das faixas do Imposto de Renda (IR) e a desoneração da folha de pagamento.

Sobre o IVA "dual", que substituirá impostos federais, disse que irá permitir a adesão voluntária de estados e municípios, caso aprovem essa medida em seus legislativos.

-- Estados e municípios que queiram fazer acoplamento ao nosso imposto, legisla. Se os estados aprovarem uma base tributária de valor adicionado, nós acoplamos -- disse.

O ministro argumentou que o tributo tem base ampla e consegue alcançar setores informais e empresas da nova economia, como serviços oferecidos por aplicativos, como  Uber e Netflx.

Guedes disse ainda que pretende, mesmo sem o imposto sobre transações financeiras, pretende aprovar uma medida para desonerar a folha de pagamento, o qual considerou "injusto e cruel". Nas simulações feitas com um ITF de 0,4%, o ministro disse que conseguiria diminuir a carga tributária de 20% para 4%. No entanto, perguntado sobre a continuidade do imposto sobre contribuição financeira após a saída de Marcos Cintra, Guedes disse que não iria responder:

- Eu afastei alguém para não falar sobre isso (a proposta da novo ITF). Eu não falei sobre isso. Quem falou sobre isso da última vez foi demitido - limitou-se a dizer.

PIB maior em 2020

Guedes, afirmou ainda que, com o avanço das reformas, há chance de o Produto Interno Bruto (PIB) do país crescer até 2,5% em 2020.

— Quem fez o Orçamento do ano passado foi o outro governo, eles botaram (crescimento de) 2,5%, e eu sabia que não ia ser 2,5% porque não fizemos as reformas. Agora, sim, fizemos as reformas e quem sabe ano que vem vai ser 2,5% — disse Guedes. — Eu por exemplo acho que tem uma boa chance de o país se mover bem ano que vem. (Pode ser crescimento de) 2,5%, pode ser 1%, 1,5%, não sei — acrescentou.

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Para este ano, ele diz não ter certeza se o crescimento será de 0,8% ou 1%.

Economistas projetam um crescimento de 0,87% para 2019 e de 2,07% para o próximo ano, segundo o último relatório Focus do Banco Central com estimativas do mercado.

Em entrevista a correspondentes estrangeiros, Guedes afirmou, ainda, que é "fake" a informação de que o presidente Jair Bolsonaro quer derrubar a regra do teto de gastos.

— Bolsonaro está 100% fechado comigo no teto de gastos — afirmou o ministro.

No início do mês, Bolsonaro defendeu a preservação do teto de gastos, afirmando que ceder nessa questão seria "abrir uma rachadura no casco do transatlântico".

Guedes voltou a comparar a situação econômica do país com a de uma baleia ferida que foi arpoada várias vezes, está sangrando e parou de se mover. Perguntado sobre as expectativas de crescimento para 2019, que caiu de 2,5%, no início do ano, para 0,87%, segundo último boletim Focus, do Banco Central, ele disse que nunca prometeu esse crescimento no primeiro ano de governo:

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Fast track

Guedes afirmou ainda que planeja criar, em 2020, um sistema fast track (sistema de aceleração dos processos) para avançar com as as privatizações de estatais.

Segundo ele, a meta de privatização deste ano, estimada em R$ 80 bilhões, foi praticamente alcançada com a venda de subsidiárias da Petrobras, como a Transportadora Associada de Gás S.A (TAG) e a BR Distribuídora. Um movimento mais amplo deve ocorrer no ano que vem, na avaliação do ministro.

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- Nossa meta, de R$ 80 bilhões, foi praticamente atingida antes do fim do ano, com BR Distribuidora e outras pequenas desestatizações. As maiores vamos avançar no ano que vem, vamos criar um fast track para as privatizações, para acelerar (o processo) -- afirmou.

O ministro destacou ainda as medidas realizadas pelo governo parar abrir o mercado de gás natural no país, como a diminuição do papel da Petrobras no mercado e a criação do Comitê de Monitoramento da Abertura do Mercado de Gás Natural (CMGN), com vigência até o fim de 2021.

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Guedes estima que,  em um ano e meio, o Brasil consiga reindustrializar sua estrutura produtiva, em cima da energia barata.

- Vamos trazer, de US$ 13 para US$ 6, o milhão de BTU de gás (unidade de medida), pelo menos, nesse momento inicial, que é o preço na Europa e Japão - destacou aos jornalistas.

Saneamento

O ministro também confirmou que deve encaminhar nas próximas duas semanas uma nova medida provisória (MP) do saneamento básico, a fim de flexibilizar o investimento privado na área. Segundo Guedes, o objetivo é reduzir as desigualdades entre regiões e as taxas de mortalidade, uma vez da falta de recursos estatais para investimento na área.

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Nesta sexta, Guedes se reuniu com representantes do setor para discutir as medidas de flexibilização que devem integrar a nova MP.

- O saneamento é importante para o país, para a redução das desiguladades e das taxas de mortalidade entre as regiões - afirmou Guedes.

Guerra comercial

Guedes voltou a ressaltar que o governo não vai compactuar com um possível uso ideológico do Mercosul em caso de vitória da oposição nas eleições presidenciais na Argentina. Ele defende que o país vizinho prossiga aberto aos negócios, dentro da proposta do bloco econômico. Sobre a guerra comercial entre Estados Unidos e China, disse que o Brasil seguirá negociando com ambos.

- Você quer que eu diga que vou dançar com uma e brigar com outro, nós dançamos com os dois, com Argentina, europeus, chineses. Nós lamentamos o ambiente de desaceleração na Argentina e no mundo, mas vamos seguir, queremos nos integrar às cadeias produtivas  - disse.

O ministro comemorou avanços no acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia, e disse estar negociando possíveis parcerias econômicas com outros países.

- Estamos conversando agora com Cingapura, Coreia, Canadá e também com os americanos. disse. - Estamos comercializando com todo mundo, independentemente de ideologia.