Por Letícia Macedo, G1 — Santiago de Cuba


O líder da revolução cubana foi enterrado na manhã deste domingo (4) no cemitério de Santa Efigenia, em Santiago de Cuba. As ruas da cidade foram bloqueadas e a população aguardou a passagem da urna funerária ao longo de 3 km desde a Praça da Revolução, onde as cinzas de Fidel Castro passaram a noite.

'Somos milionários sem termos um peso no bolso', disse Yamila Ruiz — Foto: Letícia Macedo/G1

A funcionária da empresa de alimentação Yamila Ruiz, de 49 anos, fez um discurso muito emocionado no ponto mais próximo do cemitério que os admiradores de Fidel podiam chegar.

"Somos milionários sem termos um peso no bolso. Por quê? Porque temos o coração aberto. Respiramos em uma Cuba liberta do domínio estrangeiro. Andamos por uma Cuba livre e soberana", disse, em lágrimas.

Wiliberto Gomes Cordoba, de 78 anos, se alistou no exército combatente por influência de Fidel — Foto: Letícia Macedo/G1

Detalhe da medalha de Wiliberto Gomes Cordoba — Foto: Letícia Macedo/G1

Wiliberto Gomes Cordoba, de 78 anos, disse que se alistou no exército combatente por influência de Fidel. "Eu vim ficar ao seu lado até o último momento. Perdemos nosso grande líder. É um dos dias mais tristes da minha vida", declarou, com voz tranquila. Ele levava medalhas de combatente no peito.

As irmãs Dinorá e Maria Riso estavam muito emocionadas — Foto: Letícia Macedo/G1

As irmãs Maria Riso e Dinorá, de 76 e 69 anos, respectivamente, também estavam muito emocionadas. "Vivemos a revolução com ele. Era o maior homem do país", disse Maria. "Perdemos a alma de Cuba", concluiu Dinorá.

Em uma cerimônia privada, ele foi enterrado perto do túmulo de José Marti, filósofo inspirador da revolução que era citado frequentemente nos discursos de Fidel.

Moradores de Santiago de Cuba esperam pelo cortejo que carrega as cinzas do líder Fidel Castro — Foto: Letícia Macedo/G1

Cubanos prestam as últimas homenagens antes do enterro de Fidel Castro — Foto: Letícia Castro/G1

Sob sol forte, os cubanos esperaram desde a madrugada pelo cortejo que carregou as cinzas de Fidel — Foto: Letícia Macedo/G1

Caravana e vigília
Desde o dia de sua morte, Fidel tem recebido homenagens. As suas cinzas saíram em caravana por várias províncias do país. A cena se repetia a cada cidade: as pessoas iam para as ruas para dar adeus ao líder da revolução. Depois do ato que encerrou as homenagens públicas ao líder cubano, um grupo passou a noite na praça em vigília cantando antigas canções revolucionárias.

Fidel Castro recebeu homenagens ao longo da semana dos cubanos; neste domingo, foi a vez dos moradores de Santiago de Cuba — Foto: Letícia Macedo/G1

"Ficamos lembrando tudo o que ele fez pela revolução e pelo nosso povo. Queríamos ficar com ele até o último momento. Ninguém em Cuba vai esquecê-lo. É outro domingo triste", afirmou lydi lago Milan, de 47 anos.

Conforme o cortejo ia passando, os cubanos gritavam "Eu sou Fidel" — Foto: Letícia Macedo/G1

Um grupo de brasileiros que participa do Programa Mais Médicos chegou cedo à praça para ver as cinzas passarem. "O que mais me impressionou foi a mobilização para dar dar adeus a Fidel. Ele representa muito para quem quer uma sociedade diferente", disse João Batista Cavalcante Filho, de 39 anos, que mora em Aracaju, Sergipe.

Admiradora de Fidel Castro segura cartaz em Santiago de Cuba — Foto: Letícia Macedo/G1

Cartazes colocados ao longo do trajeto do cortejo com a urna funerária de Fidel Castro — Foto: Letícia Macedo/G1

Casa de morador nos arredores de Santiago de Cuba com homenagens a Fidel Castro — Foto: Letícia Macedo/G1

Cubanos esperam pelo cortejo antes de urna funerária com Fidel chegar ao Cemitério Santa Efigência, em Santigo de Cuba — Foto: Letícia Macedo/G1

O ex-presidente de Cuba, Fidel Castro, morreu à 1h29 (hora de Brasília) do dia 26 de novembro, aos 90 anos, na capital Havana. A informação foi divulgada pelo seu irmão Raúl Castro em pronunciamento na TV estatal cubana.

Visto como um grande líder revolucionário por uns, e como ditador implacável por outros, Fidel foi saindo de cena progressivamente ao longo da última década, morando em lugar não divulgado e fazendo aparições esporádicas nos últimos anos.

As últimas imagens de Fidel Castro são do dia 15 de novembro, quando recebeu em sua residência o presidente do Vietnã, Tran Dai Quang. Antes, ele foi visto em um ato público no dia 13 de agosto, na comemoração de seu 90º aniversário. A festa reuniu mais de 100 mil pessoas. Na época, Fidel apresentou um semblante frágil, vestido com um moletom branco e acompanhado pelo seu irmão Raúl e o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro.

Doença e saída do poder
Na noite de 31 de julho de 2006, Fidel Castro surpreendeu Cuba e o mundo com o anúncio de que cedia o poder ao irmão Raúl, em caráter provisório, depois de sofrer hemorragias. Foi a primeira vez que saiu do poder. Sem revelar qual doença o afetava, Fidel admitiu que esteve à beira da morte.

Desde março de 2007, já afastado do cenário público, sendo visto apenas em vídeos e fotos, Fidel Castro se dedicava a escrever artigos para a imprensa sob o título de "Reflexões do Comandante-em-Chefe".

Fidel deixou o poder definitivamente em fevereiro de 2008. Em um texto publicado no jornal estatal “Granma”, ele anunciou sua renúncia.

Trajetória
Fidel nasceu em 13 de agosto de 1926, na província de Holguín, sul de Cuba, e foi batizado durante a infância de Fidel Hipólito. Sua mãe trabalhava para a mulher de seu pai, o bem sucedido latifundiário espanhol Ángel Castro.

Apenas quando Fidel era adolescente seu pai se separou da primeira mulher e assumiu a família com a mãe de Fidel, Lina Ruz Gonzalez, com quem teve outros cinco filhos. Nesta época, Fidel foi assumido oficialmente pelo pai e recebeu o nome de Fidel Alejandro Castro Ruz.

Em 1948, Fidel viajou para a República Dominicana em uma expedição para tentar derrubar o ditador Rafael Trujillo, que foi fracassada.

Revolução
Na década de 1950, Fidel teve contato com as famílias ricas de Cuba, e se candidatou a um posto no parlamento. Entretanto, o golpe do general Fulgêncio Batista derrubou o governo da época e cancelou as eleições.

Junto com outros membros do Partido Ortodoxo, Fidel organizou uma insurreição. Em 26 de julho de 1953, cerca de 150 pessoas atacaram o quartel de Moncada, em Santiago de Cuba, em uma tentativa de derrubar Batista. O ataque falhou e Fidel foi capturado. Após julgamento, ele foi condenado a 15 anos de prisão. Entretanto, o incidente o tornou famoso no país.

Em 1955, Fidel foi anistiado, e fundou o movimento 26 de Julho, de oposição ao governo. Nessa época, ele se encontrou pela primeira vez com o revolucionário Ernesto ‘Che’ Guevara e se exilou no México.

Em 1957, junto com Guevara e mais 79 expedicionários, chegou a Cuba a bordo de um navio e tentou derrubar o presidente, mas foi surpreendido pelo Exército e derrotado. Fidel, seu irmão Raúl e Che conseguiram escapar e se refugiaram na Sierra Maestra, onde travaram combates com o governo.

Em 30 e 31 de dezembro de 1958, as vitórias revolucionárias assustaram Batista, que fugiu de Cuba e foi para a República Dominicana. Aos 32 anos, Fidel conseguiu o controle do país.

Reforma para o comunismo
Um novo governo foi criado, e Fidel assumiu como primeiro-ministro em 1959, após a renúncia de Jose Miro Cardona. Nesta época, foram iniciadas as relações com a então União Soviética.

O líder passou então a sua reforma para o comunismo. Em 1961, o governo proclamou seu status socialista. Houve uma fuga em massa dos ricos do país para Miami, nos Estados Unidos, que rompem as relações diplomáticas com Cuba.

Crise com os EUA
Em abril, Castro formalizou Cuba como um estado socialista. No dia seguinte, cerca de 1,3 mil exilados cubanos apoiados pela CIA atacaram a ilha pela Baía dos Porcos, em uma tentativa de derrubar o governo.

O ataque foi um fracasso – centenas de pessoas foram mortas e quase mil capturadas. Os EUA negaram seu envolvimento, mas revelaram que os exilados foram treinados pela CIA. Décadas depois, o país confirmou que a ação vinha sendo planejada desde 1959.

Em 1962, os EUA ordenaram o bloqueio econômico total à ilha, isolando o regime, uma política que se seguiu até a atualidade.

Durante seu governo, Fidel investiu na educação – foram criadas cerca de 10 mil novas escolas, e a alfabetização atingiu 98% da população. Os cubanos têm um sistema de saúde universal, que reduziu a mortalidade infantil para 11 a cada mil nascidos vivos.

Entretanto, as liberdades civis foram confiscadas. Sindicatos perderam o direito de realizar greves, jornais independentes foram fechados e instituições religiosas perseguidas. Castro removeu seus opositores com execuções e prisões, além do exílio forçado.

Centenas de milhares de cubanos fugiram do país ao longo das décadas, muitos seguindo para a Flórida, bastante próxima da costa da ilha.

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