Opinião

‘Não mate, dê para mim’

É verdade que são cruéis os dados sobre abortos clandestinos. Mas no meio do caminho tem um feto

A ideia de um estado que protege as pessoas integralmente começa com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que no seu artigo 3° defende: todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. Aqui nasce um questionamento indesejável, a pergunta que nós empurramos literalmente com a barriga: a partir de que momento um ser humano “merece” ser protegido? Quando começa a vida? Um debate jurídico, bioético, social e urgente.

A recente discussão em torno da PEC 181 reacendeu o debate sobre o aborto no Brasil. A PEC não tratava inicialmente sobre o estado defender a vida desde a concepção, mas sobre o benefício de licença maternidade. A inclusão deste ponto polêmico no texto foi uma ação da bancada cristã. Alguns grupos criticam a proposta dizendo que a mulher será penalizada. A visão concepcionista fere a Constituição?

O Código Penal Brasileiro prevê excludentes de punibilidade para o aborto em três casos específicos: gravidez por estupro, risco de morte da mãe e gestação de crianças com má formação cerebral. Quem defende o “aborto legal” usa fatos do século passado. O perigo da gestante, que é o risco de morte da mãe, está contextualizado na década de 1940, quando mulheres morriam por infecção no parto. Hoje elas morrem no aborto. Já a interrupção da gravidez por anencefalia do feto parece arbitrário. Quem pode afirmar que num futuro próximo a medicina não possa garantir a vida destes seres humanos com total dignidade? Há 40 anos era baixa a expectativa de vida das pessoas com síndrome de Down.

O tema mais delicado é o estupro. A culpa não é da mulher. Mas também não é da criança. E o estado deve proteger a vida de ambos. É aqui que a discussão sobe o tom. Na França, país onde o aborto é legal desde 1975, existem casas de apoio à vida. Mulheres que não querem abortar fazem pré-natal e recebem amparo social e psicológico. Madre Teresa de Calcutá dizia: “Se não quer, não mate, dê para mim”. Pode parecer um contrassenso obrigar uma criança a crescer num ambiente onde não a querem, mas num ambiente onde ela será acolhida não é um contrassenso. Abortar é desistir. É quando alguém abre mão da vida de outro alguém. Desistir de ser mãe é um direito, matar não.

É verdade que a mulher é dona do próprio corpo e que são cruéis os dados do Brasil sobre abortos em clínicas clandestinas. Mas no meio do caminho tem um feto. O feto é um fato. As consequências são ruins para as mulheres, porém são piores para a criança, o ser intruso, indesejada pelo estado, pelo pai e pela mãe. O nascituro não é menos importante em detrimento de sua mãe. Estatísticas mostram que a interdição legal não impede as mulheres de fazerem abortos. Mas políticas públicas podem impedir. A negligência nos faz cúmplices das mortes. O Brasil não precisa legalizar o aborto, precisa proteger a vida da mulher e das crianças.

Márcio Pacheco é deputado estadual (PSC)