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Política Lava-Jato

MP: Sem delações, prejuízos reais não seriam revelados

Procuradores defendem acordos, em documento enviado ao TCU
O coordenador da força-tarefa da Lava-jato, procurador Deltan Dallagnol Foto: Lucas Tavares / Agência O Globo 30/06/2017
O coordenador da força-tarefa da Lava-jato, procurador Deltan Dallagnol Foto: Lucas Tavares / Agência O Globo 30/06/2017

BRASÍLIA — A força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba defendeu os acordos de delação premiada e de leniência assinados com os principais investigados na operação e argumentou que, sem essas colaborações, as investigações estariam concentradas em crimes que envolvem menos de R$ 100 milhões. Hoje, segundo a força-tarefa, a estimativa dos prejuízos causados pelos esquemas investigados ultrapassa R$ 40 bilhões.

As afirmações estão em documento assinado no último dia 20 pelos procuradores da República Deltan Dallagnol, Jerusa Viecili e Paulo Galvão. O documento de oito páginas foi enviado ao Tribunal de Contas da União (TCU), que suspendeu punições a empreiteiras signatárias de acordos de leniência com o Ministério Público Federal (MPF), à espera de que elas colaborem com as investigações em curso no tribunal e admitam a prática de superfaturamento.

“Sem os acordos, a Lava-Jato provavelmente estaria apurando crimes da monta de menos de R$ 100 milhões, quando hoje a estimativa de prejuízos pode ultrapassar R$ 40 bilhões segundo laudo da Polícia Federal (PF) e chega perto de R$ 30 bilhões segundo estudo econométrico desse tribunal”, argumentaram os procuradores. Eles defenderam que provas produzidas nos acordos de leniência não sejam usadas contra as empreiteiras em processos em curso no TCU.

“As provas produzidas nas leniências não podem ser validamente utilizadas contra as próprias empresas colaboradoras, para produzir punições para além daquelas pactuadas no acordo, sob pena de se desequilibrar a relação entre colaborador e Estado”, afirmaram. O “desequilíbrio” em desfavor do colaborador pode desestimular futuros acordos, segundo eles.

A força-tarefa também afirmou no documento que não faz mais sentido continuar a intermediar as posições das empreiteiras junto ao TCU. Segundo os procuradores, essa negociação deve ser feita diretamente entre empresas e tribunal.

Reportagem publicada pelo GLOBO no último dia 22 revelou que as principais empreiteiras investigadas na Lava-Jato resistem em admitir um superfaturamento de R$ 3 bilhões estimado pelo TCU em sete processos, relacionados a contratos para obras da usina nuclear Angra 3, Ferrovia Norte-Sul, Complexo Petroquímico do Rio (Comperj) e Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar). Nos sete processos, o tribunal abriu um canal de negociação com empresas que assinaram leniência e chegou a suspender punições. Caso a colaboração não ocorra, as empreiteiras poderão ser declaradas inidôneas e sofrer sanções como pagamento integral do dano, acrescido de multa de 100% do valor.

O primeiro processo em que o TCU abriu um canal de negociação diz respeito a Angra 3. Por fraudes em licitações, o tribunal declarou a inidoneidade de Queiroz Galvão, Empresa Brasileira de Engenharia, Techint e UTC. Ao mesmo tempo, suspendeu a punição à Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez, em razão da leniência assinada com o MPF. O documento enviado ao TCU pela força-tarefa diz respeito apenas a este processo, relatado pelo ministro Bruno Dantas. Os outros ainda aguardam uma iniciativa de colaboração.

Junto com o documento de oito páginas, a força-tarefa enviou “propostas formais” das três empreiteiras. “O encaminhamento das propostas de modo algum importa o endosso desta força-tarefa”, afirmaram os procuradores.

“Os acordos feitos na Lava-Jato permitiram a revelação de provas da existência de cartéis em mais de 30 diferentes mercados, os quais estão sob investigação no Cade. Tais acordos continuarão a surtir efeitos por muitos anos”, argumentou a força-tarefa. Para os procuradores, os benefícios do Estado aos colaboradores devem ser garantidos. “A sociedade abre mão de algo em troca de muito mais, a fim de atrair a cooperação do criminoso e, consequentemente, gerar grandes benefícios à sociedade. Na Lava-Jato, mais de 280 pessoas foram acusadas por crimes como corrupção, lavagem e organização criminosa. Muitas dessas pessoas estão dentre as mais poderosas do país. Mais de R$ 10 bilhões vêm sendo recuperados para os cofres públicos”, citou o documento.

Os procuradores disseram ainda não ter sido possível alcançar um consenso entre MPF, TCU e empreiteiras. Eles sugeriram a criação de uma comissão no tribunal para as tratativas, além de audiências com as próprias empresas. “Após várias tratativas, chegamos à conclusão de que a intermediação desta força-tarefa, no processo de diálogo, tem sido um fator que tem dificultado o alcance de um possível entendimento comum.”