• Raphael Salomão
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dalcin-aprosoja-mt (Foto: Divulgação/Aprosoja)

Endrigo Dalcin, presidente da Aprosoja-MT. "Essa tecnologia não é nova", diz ele, sobre a RR2 (Foto: Divulgação/Aprosoja)

Produtores de soja de Mato Grosso estão iniciando uma nova batalha contra a cobrança de royalties da Monsanto. A Aprosoja-MT anunciou, nesta quinta-feira (9/11), que está movendo uma ação contra a multinacional relativa aos direitos sobre a soja Intacta RR2, amplamente usada nas lavouras.

A ação foi protocolada na quarta-feira (8/11), disse o presidente da entidade, Endrigo Dalcin, em entrevista coletiva transmitida pelas redes sociais. O argumento é o que não foram cumpridos todos os requisitos para que a soja RR2 seja vista como uma nova tcnologia e, portanto, não poderia ser patenteada.

Advogado responsável pela ação em nome da Associação, Sidney Pereira de Souza Junior afirmou que a decisão de processar a empresa foi tomada depois de um amplo estudo técnico. O trabalho envolveu, segundo ele, especialistas em patentes de biotecnologia no Brasil e no exterior.

“Os produtores de Mato Grosso respeitam o direito de propriedade intelectual. Eles só estão questionando isso na Justiça porque essa patente tem fortes indícios e provas técnicas de que seja nula. Em sendo nula, você não pode cobrar royalties sobre a tecnologia”, resumiu.

Um dos argumentos é o de que a soja RR2 não traz, em si, uma inovação, mas apenas um “pequeno melhoramento” das tecnologias anteriormente utilizadas e que lhe serviram de base: tolerância ao glifosato (RR) e resistência a lagartas (Bt). Por conta disso, não poderia ser patenteada.

Outro ponto é o que o advogado chamou de “insuficiência descritiva”. Souza Junior explicou que, no momento em que pede o registro, a empresa deve descrever totalmente a tecnologia a ser registrada. É uma medida necessária para possibilitar o acesso quando a patente vence e seu objeto caia em domínio público.

“Houve também inclusão indevida de matéria”, disse ele. “Você não pode, no curso do processo administrativo de concessão de patente incluir matéria nova. Tem que seguir dentro do escopo. A partir do momento que se inclui coisas novas, e a Monsanto fez isso para corrigir o pedido inicial dela, está burlando o sistema”, acrescentou o advogado.

O processo movido pela Aprosoja com base nessas questões pede, em caráter liminar, a interrupção imediata da cobrança de royalties pela soja RR2. E caso isso não seja concedido, a Associação pede que o valor desses direitos sejam depositados em juízo até o encerramento do processo.

No mérito da ação, protocolada na Justiça Federal em Mato Grosso, o pedido é de que a patente da Monsanto seja declarada nula. E, em função disso, os royalties já pagos sejam devolvidos. Segundo o advogado, a declaração de nulidade de patente tem efeito retroativo.

Como a ação movida pela Associação é coletiva, se a Justiça anular a patente e decidir que os royalties sejam devolvidos, cada produtor terá que demonstrar, individualmente, o quanto pagou pelo uso da tecnologia.

“É uma ação que beneficia só os produtores de soja de Mato Grosso nesse primeiro momento”, ressaltou o advogado. “Existe a possibilidade de outras associações ingressarem com essa demanda nos seus respectivos estados”, disse.

Não há um levantamento do que foi pago até agora de royalties, afirmou o presidente da Aprosoja-MT. Mas a considerar o que disse Endrigo Dalcin, é uma conta que aumenta a cada ano, já que o uso dessa tecnologia nas lavouras também está em trajetória crescente.

Segundo Dalcin, os royalties variam de R$ 139 a R$ 150 por hectare, informou o executivo da Aprosoja de Mato Grosso. Só o valor relativo à safra 2016/2017 é estimado em R$ 733 milhões.

A Monsanto informou que ainda não foi notificada oficialmente e que, por este motivo, não irá se posicionar sobre o processo.

Disputa anterior

Não é o primeiro embate entre os produtores de soja mato-grossenses e a multinacional americana, cuja aquisição pela alemã Bayer está em andamento. Em 2013, foi protocolada uma ação na Justiça em torno dos direitos sobre a primeira geração da tecnologia, a RR.

Na época, os produtores de Mato Grosso argumentavam que a patente da RR1 estava vencida desde 2010 e a Monsanto não poderia mais cobrar pela licença. A empresa argumentava que a cobrança poderia ser estendida até 2014.

A Justiça deu ganho de causa para os agricultores em 2013, ano do lançamento comercial da soja RR2. Sindicatos rurais do Estado, Federação de Agricultura e Pecuária de Mato Grosso (Famato) e Monsanto fecharam, na época, um acordo para liquidar a questão dos royalties anteriores.

soja_intacta_RR2_monsanto_parana (Foto: Sérgio Zacchi/Divulgação Monsanto)

Intacta RR2, da Monsanto, lançada em 2013. Cobrança de direitos de uso é questionada na Justiça (Foto: Sérgio Zacchi/Divulgação Monsanto)

Produtores que decidissem não mais processar a empresa pela soja RR1 receberiam um desconto no pagamento pelo uso da RR2, vista naquele momento como uma tecnologia nova. Esse bônus era o valor relativo aos dois anos de cobrança considerada indevida.

O acordo previa ainda a assinatura da chamada Declaração de Princípios, pela qual era reconhecido o direito de propriedade sobre a tecnologia. Para o presidente da Aprosoja-MT, Endrigo Dalcin, mesmo o agricultor que aderiu a esse acordo poderá ser beneficiado pelos efeitos da ação iniciada nesta semana. 

“Não há problema maior para quem plantou até hoje. Estamos questionando uma patente que nunca deveria ter sido dada a Monsanto. O produtor reconhecia o direito sobre uma tecnologia nova. Mas essa tecnologia não é nova, como a gente comprovou depois de dois anos de estudos”, disse ele.

A Aprosoja-MT não descarta a possibilidade de outras patentes de soja serem questionadas. A direção da entidade afirma que está sendo feito o acompanhamento de todos os registros que chegam ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), órgão federal responsável pela concessão de patentes no Brasil.