Política

Com quase mil processos, Janot manterá prioridade sobre a Lava-Jato até o fim do mandato

Procurador-geral deixará posto no dia 17 de setembro

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, durante uma sessão do Supremo Tribunal Federal: antes de entregar o cargo à sua sucessora, Raquel Dodge, ele fará uma maratona para analisar pareceres à Corte
Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo / 29-6-17
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, durante uma sessão do Supremo Tribunal Federal: antes de entregar o cargo à sua sucessora, Raquel Dodge, ele fará uma maratona para analisar pareceres à Corte Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo / 29-6-17

BRASÍLIA — Os próximos 33 dias serão os últimos de Rodrigo Janot à frente da Procuradoria-Geral da República (PGR) — e, também, uma corrida contra o tempo para colocar o trabalho em dia. Atualmente, dos 50.329 processos que aguardam decisão no Supremo Tribunal Federal (STF), 962 estão na PGR. O número corresponde a 1,9% do total. A intenção de Janot é devolver à Corte boa parte desses processos para limpar as gavetas antes de sua sucessora, a subprocuradora da República Raquel Dodge, assumir o cargo no dia 18 de setembro.

As prioridades serão despachar o quanto antes os processos referentes à Lava-Jato e analisar as ações diretas de inconstitucionalidade. Para fechar o mandato marcando posição, Janot deve remeter ao STF, nos próximos dias, nova denúncia contra o presidente Michel Temer — desta vez por obstrução à Justiça, organização criminosa ou por ambas.

O temor da equipe de Janot é que sua sucessora não dê continuidade ao trabalho feito por ele nos últimos quatro anos — em especial as investigações da Lava-Jato, incluindo a condução dos acordos de delação premiada que estão sendo negociados. As duas equipes têm feito reuniões para discutir a transição, embora o diálogo entre os investigadores não seja dos mais profícuos. Daí a preocupação de Janot de enviar ao STF o maior número de processos possível para deixar sua marca nas causas que considera mais importantes.

No dia 7 de agosto, estavam na PGR 988 processos de um total de 51.238 que tramitavam no STF — correspondentes ao mesmo percentual de 1,9%. Entretanto, o estoque numérico baixou recentemente, com 26 processos despachados na última semana. Procurada pelo GLOBO, a assessoria de imprensa da PGR não informou quantos casos Janot pretende devolver ao tribunal até o fim do seu mandato na PGR.

Nas ações da Lava-Jato que aguardam decisão de Janot, estão os inquéritos mais antigos sobre os desvios da Petrobras. Entre eles, as investigações contra o senador Fernando Collor (PTC-AL), o senador Humberto Costa (PT-PE) e o deputado José Mentor (PT-SP). A gaveta do PGR também contém casos que começaram a tramitar na Lava-Jato, mas sem ligação direta com os desvios da Petrobras, como a investigação contra o deputado Pedro Paulo (PMDB-RJ). Em alguns casos, Janot poderá apresentar denúncia contra políticos até o fim do mandato.

As ações estão nas mãos de Janot e da equipe dele pelos mais diversos motivos. Nas peças que questionam a constitucionalidade de uma lei, por exemplo, é necessário que a PGR emita um parecer para orientar o julgamento da Corte. Em processos criminais, a PGR precisa indicar diligências necessárias para instruir as investigações — como buscas e apreensões ou a tomada de depoimentos.

Aguardavam despacho de Janot, também no dia 7 de agosto, 16 ações penais e 137 inquéritos. Nesse montante, havia 23 inquéritos da Lava-Jato e sete que foram abertos a partir de provas colhidas na Operação Lava-Jato, mas acabaram sendo redistribuídos para a relatoria de outros ministros por falta de ligação direta com os desvios da Petrobras. Na sexta-feira, estavam na PGR 15 ações penais e 120 inquéritos.

Entre todos os casos que aguardam um despacho de Janot, o que está há mais tempo na PGR é um recurso que chegou ao STF em dezembro de 2013 e está nas mãos do procurador desde janeiro do ano seguinte. O processo trata de uma gratificação pedida por uma aposentada. Na área penal, o caso que aguarda despacho da PGR há mais tempo é um inquérito contra o deputado Arthur Lira (PP-AL), que chegou ao STF em setembro de 2014. Dias depois, o caso foi encaminhado para Janot e, desde então, não voltou de lá. O caso está sob segredo de Justiça.

BULLYING HOMOFÓBICO EM PAUTA

Nem todos os processos que aguardam despacho na PGR estão nas mãos de Janot. Muitos aguardam o trabalho de subprocuradores, em processos que tramitam na Primeira e na Segunda Turma do STF, formadas por cinco ministros cada. De um modo geral, os processos que tramitam no plenário, formado pelos 11 ministros, ficam sob a responsabilidade do procurador-geral da República.

Por questões operacionais, é pouco provável que Janot consiga esvaziar totalmente sua gaveta até o início da gestão de Raquel Dodge. Como os dois são de grupos diferentes dentro da PGR — e não é segredo para ninguém que eles não são amigos —, a intenção de Rodrigo Janot é despachar o maior número de processos possível.

Além da Lava-Jato, outra prioridade são as ações diretas de inconstitucionalidade, que hoje somam 98 aguardando um parecer da PGR. Entre os temas estão algumas polêmicas sobre as quais Janot faz questão de externar sua opinião em pareceres para orientar o julgamento do STF em plenário. Um exemplo é a ação do PSOL que pede para o Plano Nacional de Educação reconhecer o dever constitucional de escolas públicas e particulares de prevenir e coibir o bullying homofóbico — ou seja, discriminações por gênero, identidade e orientação sexual. A ação também pede que as escolas respeitem a identidade de crianças e adolescentes LGBT nas instituições de ensino do país.

Outra ação que deverá fazer questão de enviar parecer ao STF antes de deixar o cargo é a que questiona a Emenda Constitucional 95, responsável por estabelecer um teto para os gastos públicos da União pelos próximos 20 anos. Uma das ações que questionam a norma foi proposta pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Educação (CNTE).