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Política

Comissão de juristas prepara propostas para combater o crime organizado

Grupo, formado a pedido da Câmara, é presidido pelo ministro do STF Alexandre de Moraes
Alexandre de Moraes é favorável à revisão do foro provilegiado Foto: Jorge William / Agência O Globo
Alexandre de Moraes é favorável à revisão do foro provilegiado Foto: Jorge William / Agência O Globo

BRASÍLIA — Enquanto os deputado se apressam para votar projetos relacionados à segurança pública, uma comissão de juristas formada a pedido da própria Câmara começa a preparar propostas para combater o crime organizado. Terrorismo , fontes de financiamento do crime organizado e controle das comunicações dos chefes de facções . Essas são algumas das preocupações dos integrantes da comissão de juristas. O grupo é presidido pelo ministro Alexandre de Moraes , do Supremo Tribunal Federal (STF) .

À exceção do bloqueio de comunicação dentro dos presídios, a comissão de juristas passa longe das propostas aprovadas na semana passada pela própria Câmara, que se dedicou a enfrentar questões relacionadas aos criminosos que já estão na cadeia. Moraes disse que a comissão estuda métodos de investigação usados hoje nos Estados Unidos e na Europa contra o terrorismo e quer adaptar a experiência dos outros países para combater criminosos brasileiros. Até agora houve apenas uma reunião, na qual foi traçado um plano de trabalho. Ainda serão feitas novas audiências, inclusive com participação de convidados para debater o tema. Isso inclui Ministério Público, Judiciário, advocacia, polícias, Receita Federal e acadêmicos.

— É preciso utilizar mecanismos, que a comissão já começou a estudar, hoje usados nos Estados Unidos e Europa não só contra o crime organizado violento, como para o terrorismo. Existem hoje métodos especiais de investigação do terrorismo. E todo o terrorismo na Europa no ano passado não matou um quarto do que o crime organizado matou no Brasil. Para crimes excepcionais, medidas excepcionais, dentro da Constituição — declarou Moraes.

Além do ministro, compõem a comissão oito pessoas, como o procurador-geral de Justiça do Ministério Público de São Paulo, Gianpaolo Poggio Smanio. Ele argumenta que, mais do que discutir penas, o importante é encontrar formas de “sufocar” o financiamento do crime organizado. Segundo ele, as medidas existentes hoje, como leilão de bens de traficantes, são insuficientes.

— Insuficiente mesmo, porque não ocorre com a rapidez que precisa e não ocorre com o alcance que precisa. Não é apenas o bem diretamente ligado (ao criminoso), mas todo o sistema de financiamento empresarial. Vamos imaginar que exista uma lavagem de dinheiro para montar uma empresa de fachada, que exista dinheiro com os familiares, com laranjas. Todos os bens tem que ser extintos, apreendidos, leiloados, para sufocar qualquer ligação das pessoas com tráfico de drogas e de armas — disse Smanio.

Um dos argumentos mais citados por quem é contra a legalização dos jogos de azar, proposta defendida agora por governadores e encampada por parlamentares, é justamente o de que isso permitiria a lavagem de dinheiro do crime organizado. Ironicamente, a medida é vista pelos chefes dos Executivos estaduais como um forma de gerar recursos para a segurança pública.

Moraes e o advogado Renato da Costa Figueira, que também faz parte da comissão, defendem a pena de prisão apenas para criminosos perigosos. Segundo Moraes, seria o caso, por exemplo, do chefe do tráfico e do político corrupto. Para crimes menores, o ministro acredita que penas alternativas sejam suficientes. Essa seria uma solução inclusive para a crise do sistema penitenciário, que está cada dia mais lotado. Figueira pensa parecido, mas evita entrar em detalhes sobre quem especificamente deve passar um tempo atrás das grades e quem pode cumprir outras medidas.

— Ele (o preso) lá experimenta uma verdadeira universidade do crime. É necessário que as prisões sejam reservadas para os crimes graves, em que os criminosos apresentam elevada periculosidade. Crimes de bagatela, de menor potencialidade que sejam reservados a eles outro tipo de penalidade, como penas restritivas de direitos nas suas mais variadas possibilidades e natureza — disse Figueira.

Smanio, por outro lado, acha melhor a comissão não tratar dessa questão. Além de encontrar formas de sufocar financeiramente o crime organizado, ele aponta outras prioridades. Uma delas é o endurecimento do regime de execução penal para grandes chefes do crime organizado, do tráfico de drogas e de armas, para que eles não possam dar ordens dentro do presídio. Segundo Smanio, é preciso haver bloqueio de celular e controle de comunicações. Questionado se isso inclui monitoramento de conversas com advogados, ele respondeu:

— É o tema mais polêmico. A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) é contra. Na comissão, é polêmico. O que precisamos é fazer controle de comunicação de uma ou outra maneira. É um tema que ainda vai ser debatido na comissão.

Assim como Smanio, Moraes também defende punições mais severas para os chefes do tráfico, que deveriam cumprir a pena sempre em presídio de segurança máxima. Para o ministro, eles não deveriam ter direito a visitas íntimas. Visitas de familiares seriam possíveis somente gravadas e monitoradas.

— Ele cometeu crimes gravíssimos contra a sociedade. Se não quiser ser gravado, se não quiser ter visita no parlatório, é muito fácil: não comete o crime — resume Moraes.