BRASÍLIA - O
adiamento em uma semana
da votação da
reforma da Previdência
pelo Senado, na reta final da tramitação da matéria no Congresso, deu brecha a
lobbies
do setor privado e pressões dos partidos de oposição que podem desidratar a proposta aprovada na Câmara dos Deputados. O governo admite a preocupação e vai designar uma tropa de choque de técnicos para acompanhar essas movimentações.
As mudanças têm potencial de reduzir o impacto fiscal em cerca de R$ 153,2 bilhões em dez anos, o equivalente a 17% da economia prevista de R$ 876,7 bilhões.
A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) está atuando para retirar do texto o aumento de 5% na alíquota de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), o que reduziria o ganho fiscal da reforma em R$ 19,2 bilhões em dez anos.
Já os partidos da oposição (PT, PROS, Rede, PDT, PSB e Cidadania) vão tentar derrubar pelo menos dois dispositivos: um que trata do abono salarial e prevê uma economia de R$ 76,4 bilhões em uma década e outro que fixa idade mínima para trabalhadores que lidam com atividades prejudiciais à saúde (aposentadorias especiais), cujo impacto estimado é de R$ 57,6 bilhões.
Todas as bancadas partidárias do Senado têm direito a apresentar um destaque para modificar o texto principal no plenário, sendo que MDB e Podemos, por serem as maiores, poderão sugerir duas propostas.
O líder do PT, senador Humberto Costa (PE), acredita que há chances de aprovação dos dispositivos da oposição, pois eles já foram apresentados na CCJ, e o governo ganhou por pouco:
- Já definimos dois pontos para destacar, o abono salarial e as aposentadorias especiais. Acreditamos que temos chances de vitória — disse Costa.
Os blocos PT/PROS e da Minoria no Senado querem negociar com outros partidos a possibilidade de propor três destaques cada um. Em contrapartida, a oposição se comprometeria a não obstruir a votação.
Em 2018, o rombo da Previdência (INSS) foi de R$ 194 bilhões. O país está envelhecendo rapidamente e é um dos poucos do mundo a não exigir idade mínima. Conheça as mudanças previstas na
reforma da Previdência
do presidente
Bolsonaro
e mantidas pelo relator Samuel Moreira (PSDB-SP).
Calcule aqui
quanto tempo falta para se aposentar pela proposta.
Depende da votação no Congresso. O texto-base do parecer do relator Samuel Moreira (PSDB-SP) já foi aprovado no plenário da Câmara. Como é uma mudança na Constituição, o projeto precisará ser aprovado em dois turnos na Câmara por pelo menos 308 votos (3/5 da Casa). Depois vai ao Senado, também precisando de votação em dois turnos.
Como será a idade mínima?
Será de 65 (homens) e 62 (mulheres). Poderá se aposentar quem contribuir por 35 anos (homens) e 30 anos (mulheres) para a Previdência.
Na transição, para quem já trabalha, a idade mínima subirá aos poucos
. Começa em 61 (homens) e 56 (mulheres) e terá acréscimo de 6 meses por ano. Em 2021, por exemplo, será de 62 (homens) e 57 (mulheres).
Quais as regras de transição?
Quem já contribui para a Previdência
terá regras de transição.
No INSS, haverá até 5 opções. De maneira geral, são 3 regras: por sistema de pontos; por tempo de contribuição (respeitando idade mínima); e pelo pedágio de 100%. Além disso, quem está perto de se aposentar, poderá ainda pagar um pedágio de 50%. E a aposentadoria por idade existente hoje também terá critérios de transição.
Similar ao atual sistema 86/96. O trabalhador tem de
somar idade e tempo de contribuição
e precisa ter contribuído por 30 anos (mulheres) e 35 anos (homens). Em 2019, poderá se aposentar aos 86 pontos (mulheres) 96 pontos (homens). A tabela sobe um ponto a cada ano, até chegar aos 100 para mulheres e 105 para homens.
Transição por tempo de contribuição
É preciso ter contribuído por 30 anos (mulheres) e 35 anos (homens) e
cumprir uma idade mínima
que vai subindo aos poucos, até chegar aos 62 anos (para mulheres) e 65 anos (para homens). A idade mínima começa aos 56 anos (mulheres) e 61 anos (homens) em 2019. E sobe seis meses por ano.
Como funciona o pedágio de 50%?
Esta regra só vale para quem está a até dois anos de se aposentar por tempo de contribuição pelas regras atuais. Funciona assim: se faltar um ano pelas regras atuais, a pessoa terá de trabalhar por um ano e meio (1 ano + 50%). Se faltarem dois anos, terá de ficar no mercado por 3 anos.
Como funciona o pedágio de 100%?
O pedágio de 100% valerá no INSS e no setor público. Se faltar 4 anos para se aposentar pelas regras atuais, será preciso trabalhar por mais 4 anos (4 anos+100%) para se aposentar, desde que cumprida a idade mínima (57 para mulheres e 60 para homens)
O que muda na aposentadoria por idade?
Mulheres se aposentarão aos 62 anos, e não mais aos 60. Para os homens, 65. Em vez de 15 anos de contribuição, para os homens serão exigidos 20 anos. O
relator manteve 15 anos para as mulheres.
Mas haverá regras de transição e uma “escada” para elevar idade e tempo de contribuição, até chegar a 62 anos para mulheres em 2023.
Servidores
também serão submetidos a regras de transição,
mas com pontos de partida diferentes. A transição será diferente para os funcionários mais antigos, que ingressaram antes de 2003. O relator Samuel Moreira (PSDB-SP) criou ainda a regra do pedágio de 100%, que garante a integralidade para os servidores pré-2003.
Servidores estaduais serão afetados?
A proposta enviada pelo presidente Jair Bolsonaro abrangia também
servidores estaduais
e municipais. O relator Samuel Moreira (PSDB-SP), porém, retirou estados e municípios da reforma da Previdência no seu parecer.
O que muda nas pensões?
Pensão por morte
não será mais 100%
do valor do benefício. Será de 50% mais 10% por dependente. Se a família for uma viúva com dois filhos, por exemplo, o benefício será de 80% (50%+10% para a viúva, além de 10% por cada filho). Quando o dependente atingir a maioridade, sua parcela da pensão deixará de ser paga.
Será possível acumular benefícios?
Quando houver acúmulo, o
benefício de menor valor terá um corte
, escalonado por faixa de renda. Professores e médicos poderão acumular duas aposentadorias em regimes diferentes (previdência estadual e federal, por exemplo). Mas ficam sujeitos a cortes no acúmulo de aposentadoria com pensão.
Como será calculada a aposentadoria?
Só receberá integralmente (até o teto do INSS) quem contribuir por 40 anos. Com 20 anos, 60% do valor. A cada ano a mais de contribuição, há acréscimo de 2%, até 100% aos 40 anos. Mas será mantido o piso de um salário mínimo. O cálculo do benefício vai mudar: será considerada a média de todas contribuições, sem descartar as 20% menores.
O desconto mensal para a Previdência vai mudar. No INSS, os percentuais serão de 7,5% a 14% e serão progressivas, como no IR, com cada fatia do salário pagando uma alíquota. Quem ganha acima do teto do INSS vai contribuir só até a parte do salário que fica dentro do limite. Para o servidor, as alíquotas vão de 7,5% a 22%, também progressivas.
Militares entram na reforma?
O
sistema dos militares
não está na Constituição, por isso não entra nesta reforma da Previdência. O governo enviou um outro projeto de lei para mudar o sistema das Forças Armadas que prevê, ao mesmo tempo, uma reestruturação na carreira dos militares, com aumento de gratificações.
O que muda em benefícios assistenciais?
O relator vai retirar de seu parecer a mudança nos
benefícios assistenciais
(BPC). Continuará valendo a regra atual: quem tem mais de 65, não recebe nenhum benefício e cuja renda familiar é inferior a 1/4 do salário mínimo (atualmente, R$ 294,50) tem direito ao BPC, no valor de um salário mínimo (hoje em R$ 998).
Haverá regime de capitalização?
A capitalização, no qual o
trabalhador poupa hoje para financiar sua aposentadoria
no futuro, estava prevista na proposta do governo. Seria adotada para quem ainda não ingressou no mercado de trabalho. Mas o relator retirou a capitalização do seu parecer.
Pode haver mudanças no futuro?
A proposta do governo previa retirar da Constituição algumas regras previdenciárias, facilitando mudanças no futuro. Líderes partidários pressionaram para manter todas as regras na Constituição, e o relator Samuel Moreira (PSDB-SP) alterou o projeto do governo para evitar a “desconstitucionalização” da Previdência.
O relator retirou os estados e municípios da reforma. Mas a inclusão dos governos regionais pode ser feita por emenda, durante a votação da reforma no plenário da Casa. Além disso, governadores poderão apresentar nas suas próprias assembleias propostas para alterar os regimes previdenciários locais.
Como é em outros países?
Na América Latina, somente o Brasil e o Equador não exigem idade mínima para a aposentadoria. Na Europa, só a Hungria. A maioria dos países adotou pisos de 60 anos para cima. Na União Europeia, até o ano que vem, apenas sete países terão idade mínima inferior a 65 anos.
Entre os demais destaques previstos, está um para retirar do texto principal as regras que reduzem o valor do benefício, que passará a ser calculado com base na média de todas as contribuições e não só das 80% maiores, como é hoje.
Querem ainda mudar o valor da pensão, que deixará de ser integral, caindo a 60%, mais 10% por dependente. Também faz parte do cardápio da oposição derrubar o pedágio de 100% para os servidores que ingressaram na carreira até 2003.
Os pontos que mais preocupam o governo são o abono salarial e as aposentadorias especiais. Os demais, na avaliação de integrantes da equipe econômica, não oferecem risco, pois foram muito discutidos e rejeitados nas votações anteriores.
No caso da majoração da CSLL, o governo deverá se manter neutro, pois ela não fazia parte do texto enviado pelo Executivo e foi incluída pelo relator da proposta na Câmara, Samuel Moreira (PSDB-SP), como alternativa de receita para compensar as perdas.
Procurada, a Febraban não quis se manifestar. A alíquota da CSLL está atualmente em 15%. A entidade já se manifestou publicamente alertando que o alto custo do crédito no país tem entre suas causas o peso dos impostos. Ela reclama ainda que o sistema seria discriminatório, pois a CSLL para os demais setores é de 9%.
Uma tropa de choque da Secretaria de Previdência foi acionada para participar da votação, prevista para terça-feira, da última versão do relatório do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) na CCJ e em primeiro turno no plenário para tentar evitar que o texto seja desidratado. Esse grupo será formado pelo secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho; pelo secretário de Previdência, Leonardo Rolim; e por auxiliares.
Sem correr riscos
Na apreciação da matéria no plenário, a equipe econômica também vai pedir ao partido do governo, o PSL, para apresentar um destaque a fim de reincluir no texto o critério para a concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC), que é renda
per capita
de um quarto do salário mínimo. O objetivo é reduzir as despesas com sentenças judiciais, o que representaria uma economia de R$ 23,4 bilhões em dez anos.
Se, por um lado, o adiamento da votação ressuscita
lobbies
, por outro, integrantes da equipe econômica consideram que o prazo maior acabou sendo positivo, pois o clima no Senado azedou após a busca e apreensão no gabinete do líder do governo, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), na semana passada.
Segundo interlocutores, é importante não correr riscos, apesar de haver consenso sobre a necessidade de aprovar a reforma. A matéria precisa ter o aval de 49 dos 81 senadores, em dois turnos de votação.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que decidiu com os líderes adiar a votação da reforma para a próxima semana, declarou que
o cronograma está mantido
. Por ele, o Senado concluirá a tramitação da proposta ainda na primeira quinzena de outubro, para que ela seja promulgada pelas duas Casas em seguida.
Já a chamada PEC paralela, desmembrada do texto principal e que busca incluir estados e municípios na reforma, além de fazer outras modificações, ainda precisa tramitar no Senado e na Câmara e não tem prazo para votação.