• Barbara Bigarelli
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Carreira ; trabalhando no final de semana ; respondendo e-mails e telefonemas do chefe ;  (Foto: Thinkstock)

Atender ligações e responder mensagens nos dias de folga é obrigação ou conta para o banco de horas? (Foto: Thinkstock)

No início deste ano, entrou em vigor na França a lei que garante aos funcionários "folga" dos emails fora do horário de trabalho. Na prática, os trabalhadores franceses ganharam o "direito de se desconectar", ou seja, ignorar mensagens ou se negar a respondê-las se elas chegarem após o expediente ou no final de semana. Mas e no Brasil? O que a lei diz sobre o uso de e-mails ou WhatsApp fora do expediente?

Por aqui, saiba que responder a e-mails e utilizar o WhatsApp para finalidades profissionais fora do horário de trabalho pode ser considerado hora extra e, portanto, um tempo a ser pago pela empresa ao funcionário. “A legislação obriga todo empregador a pagar hora extra para toda e qualquer atividade que o funcionário executa após o expediente, no fim de semana ou quando tem de ficar de sobreaviso”, afirma Andrea Giamondo Rossi, sócia da área trabalhista do escritório de advocacia Machado Meyer. Mas há poréns e condições.

Confira abaixo: 

O que diz a CLT?

Não há uma lei específica que trate especificamente do uso dessas ferramentas pelos funcionários fora da empresa. Juízes, porém, têm recorrido ao artigo 6 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) quando precisam analisar se o uso do WhatsApp, e-mail e outros tipos de mensagens em determinados casos deve ser visto como hora extra. O artigo 6 iguala o trabalho remoto ao presencial – abarcando assim questões como o home office, por exemplo. Mas o artigo também discorre sobre os chamados “meios telemáticos". 

Tratam-se de meios informatizados – como o e-mail, mensagens de texto e, mais recentemente o WhatsApp e aplicativos similares, como Messenger, Skype e Telegram – que, segundo a CLT, devem ter peso igual ao dos meios pessoais e diretos de controle e supervisão do trabalho. Ou seja: quem fica fora do escritório e utiliza e-mail e WhatsApp para o trabalho deve receber a mesma remuneração que um funcionário que faz seu trabalho in loco. "Eles são vistos como ferramentas de trabalho que, dependendo do uso e da finalidade, podem ser considerados trabalho à distância e, portanto, estar sujeitos ao pagamento de horas extras", diz Andrea Giamondo Rossi. 

Esta análise, entretanto, está sujeita a diversas interpretações. Não é porque um funcionário utilizou o WhatsApp fora de seu expediente para marcar uma reunião ou respondeu a vários e-mails no fim de semana que ele receberá horas extras automaticamente.

Quando vale hora extra?

Desde 2015, os tribunais vêm discutindo com mais critério o uso dessas ferramentas. Diversas ações trabalhistas – tendo como prova comunicações por tais instrumentos – surgiram nos últimos anos. Como provar que o uso foi excessivo? Como comprovar que a empresa bombardeia o funcionário com mensagens no celular? Ou ainda: como analisar se não foi o próprio funcionário quem exagerou?

“A jurisprudência passou a entender que não basta o uso desses recursos fora do trabalho para que as horas extras passem a valer", afirma Boriska Ferreira Rocha, consultora da área trabalhista do escritório de advocacia Lobo & de Rizzo Advogados. "É possível que o e-mail e o WhatsApp sejam usados como prova, mas eles precisam estar dentro de um contexto maior – que implique trabalho direto por várias horas”. Ou seja, a mensagem no WhatsApp precisa levar o funcionário a realizar outra tarefa ou trabalho durante mais do que alguns minutos. Responder um e-mail por dez minutos não confira pagamento de hora extra, mas se o empregador enviou uma comunicação pedindo que o funcionário trabalhe em um projeto no fim de semana para adiantar a entrega, o que vai demandar algumas horas, o profissional deverá receber pelas horas trabalhadas.

Na prática, o que os juízes do trabalho têm entendido é que WhatsApp, e-mail e mensagens do tipo tornaram-se “provas adicionais” de um trabalho realizado fora do expediente e que mereceria, portanto, pagamento de horas extras. “A empresa pode até ter uma política do uso dessas ferramentas, mas aí você analisa as tarefas dos funcionários e vê que seria impossível realizar aquilo dentro de seu expediente. Precisa levar para casa, trabalhar de final de semana", diz Gabriela Locks, do escritório Lobo & de Rizzo Advogados. "Neste caso, o uso dos e-mails e do WhatsApp ajuda a provar esse contexto”. 

Esquema de sobreaviso

No regime de sobreaviso, o funcionário pode ser convocado pelo empregador a prestar serviços fora de seu horário habitual de trabalho. Os tribunais têm entendido que permanecer de sobreaviso, sujeito a comunicação por meio de um aparelho como o celular ou ferramenta como e-mail, dá direito ao pagamento de horas extras. Mas o simples fato de o funcionário receber e-mail ou WhatsApp durante o período de sobreaviso não configura pagamento automático de hora extra, adicional àquele que já está recebendo por estar de plantão. “Hora extra começa a contar a partir do momento que ele, de sobreaviso, recebe uma convocação e passa a trabalhar efetivamente. O resto é remunerado seguindo a regra do sobreaviso: um terço do salário para cada hora trabalhada”, diz Gabriela Locks, do Lobo & de Rizzo Advogados. 

Posso me negar a responder?

O funcionário tem o direito de ignorar um e-mail, mensagem ou WhatsApp fora de sua jornada de trabalho. “Se não houver uma justificativa para trabalhar fora do horário, se não for remunerado por isso, o funcionário legalmente tem o direito de se negar a responder", diz Boriska Ferreira Rocha, do Lobo & de Rizzo Advogados. Por outro lado, quando o funcionário é comunicado previamente, seja no momento da contratação ou mais tarde, ao fazer parte de um projeto, de que será contatado quando houver necessidade, ele deverá responder, pois está ciente da política da empresa. "Caso se trate de uma função que demanda flexibilidade, um cargo que implica no trabalho com questões mais urgentes – e você recebe pelo trabalho extra – você não pode se recusar a responder”, acrescenta Boriska.

Relembre: pagamento de hora extra

Segundo a lei, um trabalhador pode fazer no máximo duas horas extras por dia.

De acordo com o art. 7º, XVI, da Constituição Federal/1988, o profissional deve receber por hora extra, no mínimo, 50% a mais do que em sua hora normal de trabalho. Esse percentual pode ser maior em determinadas categorias profissionais devido a convenções coletivas.

Com relação ao trabalho em domingos e feriados, a remuneração será paga em dobro, salvo se o empregador determinar outro dia de folga.