Por Guilherme Mazui, G1 — Brasília


O procurador-geral do Trabalho, Ronaldo Fleury, enviou um ofício ao Ministério do Trabalho no qual questionou o governo sobre a suspensão de uma operação contra o trabalho escravo que aconteceria na região Norte neste mês. A informação foi divulgada nesta quarta-feira (31).

De acordo com o Ministério Público do Trabalho (MPT), a ação foi cancelada por falta de passagens aéreas para os auditores do trabalho e policiais rodoviários federais que atuariam na operação.

Procurado, o Ministério do Trabalho informou em nota (leia a íntegra mais abaixo) que a operação, no Acre, precisou ser remarcada em razão de dificuldades burocráticas para a emissão das passagens.

Ainda na nota, a pasta acrescentou que a compra dos bilhetes já foi autorizada e, por questão de segurança, não poderia informar a nova data da operação.

O MPT diz que "o corte do orçamento na política de combate ao trabalho escravo em 2017 já resultou em uma drástica redução do número de operações e trabalhadores resgatados".

Segundo o Observatório Digital de Trabalho Escravo, acrescenta o Ministério Público, em 2016 foram realizadas 106 operações de combate ao trabalho escravo, com 658 trabalhadores resgatados. "Em 2017, os números caíram, respectivamente, para 88 e 341."

Compra das passagens

Segundo o Ministério do Trabalho, em 1º de janeiro deste ano, o Ministério do Planejamento suspendeu a compra direta de bilhetes aéreos via Sistema de Concessão de Diárias e Passagens. O sistema era usado, por exemplo, na compra de passagens para ações contra o trabalho escravo, feitas pela Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), órgão do Ministério do Trabalho.

Com a suspensão do sistema, as passagens passaram a ser emitidas por meio de um contrato que o Ministério Trabalho tem para "situações excepcionais". Com isso, a pasta diz que só tem autorizado compras "imprescindíveis".

Ainda segundo o ministério, as passagens aéreas dos auditores que atuariam no Acre já estavam aprovadas quando chegou à Secretaria-Executiva da pasta um pedido para emissão de mais sete bilhetes para policiais rodoviários federais que acompanhariam a ação.

O pedido foi feito em 18 de janeiro e autorizado no dia 22 "sem mais delongas para não prejudicar a ação".

"Têm-se conhecimento que a operação foi cancelada pela indisponibilidade de bilhetes, entretanto, o Ministério do Trabalho nada tem a ver com tal fato, que, infelizmente, acabou por cancelar a ação de fiscalização", informou a pasta.

Conforme o Ministério do Trabalho, o aval à compra das passagens foi feito uma semana antes da ação contra o trabalho escravo. A empresa responsável pela compra dos bilhetes "justificou o atraso na emissão de bilhetes em decorrência do aumento inesperado da demanda".

Polêmica

As ações do governo federal no combate ao trabalho escravo foram alvos de polêmica nos últimos meses.

Em outubro, por exemplo, o Poder Executivo recebeu duras críticas de setores da sociedade ao editar uma portaria que mudou as regras para caracterização do trabalho escravo.

Diante da repercussão negativa, o Ministério do Trabalho publicou uma nova portaria, tornando mais rigorosas as definições de jornada exaustiva e condição degradante do trabalhador.

Ausência de ministro

Desde dezembro do ano passado, quando o então ministro Ronaldo Nogueira pediu demissão da pasta, o Ministério do Trabalho está sem um chefe definitivo - a pasta é atualmente comandada pelo secretário-executivo, Helton Yomura.

O presidente Michel Temer nomeou para o cargo a deputada federal Cristiane Brasil (PTB-RJ), mas ela teve a posse suspensa pela Justiça Federal do Rio de Janeiro e, posteriormente, pela ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal.

Um grupo de advogados ingressou com ação após o G1 revelar que a deputada foi condenada a pagar R$ 60 mil por dívidas trabalhistas. O governo federal tem travado uma batalha judicial para Cristiane Brasil assumir a pasta.

Íntegra

Leia abaixo a íntegra da nota divulgada pelo Ministério do Trabalho:

1. O Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão suspendeu em 01/01/2018 a funcionalidade de compra direta de bilhetes aéreos no Sistema de Concessão de Diárias e Passagens - SCDP, por meio da qual os órgãos da Administração Pública realizavam a compra de passagens para a realização das ações afetas às suas áreas de atuação (incluindo o Ministério do Trabalho e a Secretaria de Inspeção do Trabalho - SIT, responsável pela coordenação e planejamento das ações de fiscalização do trabalho escravo).

2. Os órgãos da Administração foram informados da suspensão em 29/12/2018. Desde então, todas as passagens aéreas para a realização de ações da Administração Central e das unidades descentralizadas tiveram que ser emitidas através de um contrato que o MTb possuía para ser utilizado em situações excepcionais e para a aquisição de bilhetes aéreos internacionais, já que, de praxe, os bilhetes aéreos devem ser comprados e emitidos via SCDP.

3. Por se tratar de um contrato “excepcional”, o valor e o quantitativo total de emissões permitidas é muito baixo e não corresponde a 1/10 da demanda mensal de toda Pasta. Entretanto, é a única alternativa para a compra de bilhetes enquanto durar a suspensão de compra direta do SCDP pelo Planejamento (prevista para perdurar por 180 dias) ou enquanto não se realiza licitação para nova contratação.

3. Tendo em vista o exíguo saldo orçamentário do tal contrato, o Ministério iniciou um rígido procedimento de análise das emissões de bilhetes de todas as Secretarias e unidades descentralizadas, autorizando apenas aquelas consideradas imprescindíveis. As ações de fiscalização do trabalho foram definidas como prioritárias, especialmente aquelas que se referem à fiscalização do trabalho escravo, como aquela prevista na região Norte.

4. Acerca desta ação específica, o pedido de autorização para emissão dos bilhetes aéreos dos auditores fiscais do trabalho que realizariam a ação já havia sido aprovado, visto sua importância. Posteriormente, chegou à Secretaria Executiva da Pasta a solicitação de autorização para emissão de bilhetes de 07 policiais rodoviários federais de Brasília que acompanhariam a operação no Acre. O deslocamento dos policiais ficou orçado em aproximadamente R$ 15.000,00. Tendo em vista que o saldo do contrato mencionado era de aproximadamente R$ 100.000,00 para execução de TODAS as ações do órgão nos próximos 06 meses, questionou-se à Secretaria responsável a possibilidade de redução do número de policiais, rateio de custos de deslocamento com a PRF ou, ainda, a possibilidade de utilização de pessoal do efetivo estadual (PRF do Acre). Ante os argumentos apresentados pela SIT, o pedido foi autorizado dois dias depois (uma semana antes da viagem), sem mais delongas, para não prejudicar a ação. Ressalte-se que, após as autorizações, a emissão de bilhetes é feita pela empresa contratada. Têm-se conhecimento que a operação foi cancelada pela indisponibilidade de bilhetes, entretanto, o Ministério do Trabalho nada tem a ver com tal fato, que, infelizmente, acabou por cancelar a ação de fiscalização. Procuramos a empresa Voetur, CONTRATADA, que justificou o atraso na emissão de bilhetes em decorrência do aumento inesperado da demanda. Já estamos tomando as medidas cabíveis, entretanto, o contrato com a referida empresa continua sendo o único meio factível para emissão de bilhetes.

5. Cabe ainda informar que já iniciamos os trâmites necessários para uma nova contratação de agência com vistas à emissão de bilhetes aéreos que atendam a demanda da Pasta. Até lá, as ações de fiscalização continuarão sendo prioritárias para o ministério, como já informado.

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