Edição do dia 17/03/2017

17/03/2017 15h03 - Atualizado em 20/03/2017 16h35

Operação revela venda de carne vencida e moída com papelão

A maior operação da história da PF mira os grandes frigoríficos do país.
Justiça cumpre 38 mandados de prisão contra pessoas ligadas a frigoríficos e ao Ministério da Agricultura.

Dulcinéia Novaes / Claudia BomtempoCuritiba / Brasília

Operação em frigoríficos revela que carne vencida e moída com papelão era vendida no país
A maior operação da história da PF mira os grandes frigoríficos do país. A Justiça expediu 38 mandados de prisão contra pessoas ligadas a frigoríficos e ao Ministério da Agricultura nesta sexta-feira (17).Os presos são suspeitos de burlar a fiscalização sanitária e vender carne contaminada e vencida. A operação, batizada de Carne Fraca, foi deflagrada pela PF de Curitiba.

Dos 34 funcionários públicos federais investigados, 20 foram presos até o começo da tarde. Também foram presos executivos de grandes grupos - Ronei Nogueira dos Santos, gerente de relações institucionais governamentais do grupo BRF e também o diretor do grupo André Luis Baldissera e o funcionário empresa da JBS, Flávio Evers Cassou.

A operação mobilizou 1.100 policiais federais principalmente nos estados do Paraná, Minas Gerais e Goiás. A Polícia Federal diz que grandes frigoríficos de todo o Brasil pagavam propina para vender produtos vencidos e até carne moída com papelão.

No despacho, o juiz Marcos Josegrei da Silva afirma que o ex-superintendente regional do Ministério da Agricultura no Paraná Daniel Gonçalves Filho e a chefe do departamento de inspeção de produtos de origem animal do Ministério da Agricultura, Maria do Rocio Nascimento eram os chefes do esquema.

Um dos frigoríficos investigados é o Larissa, que tem uma filial em Iporã, interior do Paraná. Em uma conversa gravada em  maio de 2016, o dono Paulo Rogério Sposito, manda um funcionário usar produtos vencidos há três meses.

Funcionário: seu Paulo.
Paulo Sposito: oi.
Funcionário: achamos umas paletas 127, que estão vencidas desde fevereiro. Manda embora ou deixa na produção pra eles usar?
Paulo Sposito: deixa na produção pra eles usar.

Paulo Sposito é um dos presos. Em Goiás, o principal apontado como responsável pelo esquema é o chefe do departamento de inspeção de produtos de origem animal, Dinis Lourenço da Silva. No despacho do juiz, está escrito que Dinis "viabilizou a manutenção em funcionamento de unidade da BRF em Mineiros (GO) cuja indicação era de suspensão de atividades”.

Ainda de acordo com as investigações, a fábrica da BRF em Mineiros estava contaminada pela bactéria salmonela e mesmo assim continuou exportando carne para a Europa.

Outro grande frigorífico investigado é o JBS. Em uma conversa entre o gerente de produção do frigorífico, Luiz Fossati, e um funcionário, eles falam em colocar papelão junto com a carne moída, que eles chamam de cms.

Funcionário: o problema é colocar papelão lá dentro do cms também né. Tem mais essa ainda. Eu vou ver se eu consigo colocar em papelão. Agora se eu não consegui em papelão, daí infelizmente eu vou ter que condenar.
Luiz Fossati: ai tu pesa tudo que nós vamos dar perda. Não vamos pagar rendimentos isso.

Na entrevista coletiva o delegado da Polícia Federal disse que um dos fatos descobertos nas investigações também foi a fraude no fornecimento de carne para merenda escolar com a troca de ingredientes mais baratos do que a carne bovina.

“Inclusive há uma dessas empresas investigadas que fornecia alimento, merenda escolar pro estado do Paraná, que não havia composição de carne dentro da substância. Ganhou a licitação e dentro dessa licitação, não havia composição ideal que era obrigatório pras merendas escolares”, disse o delegado da PF Maurício Moscardi Grillo.

Por meio de nota, em relação à operação realizada pela polícia federal na manhã de hoje, a JBS afirmou que não há nenhuma medida judicial contra os seus executivos e que três unidades produtivas da companhia foram alvo da operação de hoje. Declarou também que a JBS, no Brasil e no mundo, adota rigorosos padrões de qualidade, e que tem certificações emitidas por entidades reconhecidas. A companhia disse estar à disposição para esclarecer os fatos.

O frigorífico Souza Ramos não retornou às nossas ligações e o Larissa não vai se manifestar. A BRF informou que está colaborando com as investigações. O Jornal Hoje não conseguiu contato com Dinis Lourenço da Silva, nem com Daniel Gonçalves Filho e Maria do Rocio Nascimento. O PMDB disse que desconhece o teor da investigação.

O ministro da Justiça, Osmar Serraglio, também é citado na operação Carne Fraca. Ele aparece numa interceptação telefônica, gravada na época em que ainda era deputado federal do PMDB do Paraná, falando com o suposto líder do esquema criminoso. Na conversa, Serraglio questiona a atuação de um fiscal num frigorífico envolvido na operação.

A Polícia Federal enviou a conversa para a Procuradoria-Geral da República - que afirmou não ter encontrado indícios de irregularidades da atuação do ministro. Em nota, o Ministério da Justiça informou que Serraglio só ficou sabendo hoje que seu nome apareceu na investigação e destacou o fato de nem o Ministério Público e nem o juiz do caso terem visto ilegalidade na conversa gravada.

* Em nota, a JBS afirmou que Luiz Fossati não é funcionário da empresa. O nome dele aparece em dois documentos da Polícia Federal. No primeiro, em que se baseou a reportagem, Luiz Fossati aparece como funcionário da JBS. Em outro documento, ele aparece como funcionário da BRF. Até o fim desta edição, a Polícia Federal não prestou esclarecimentos sobre o assunto. Veja nota, exibida na reportagem da edição de sábado:

"Na sexta-feira (17), o Jornal Hoje informou que o gerente de produção Luiz Fossati trabalhava na JBS. A informação errada teve base em um documento da operação. Na verdade, Fossati é gerente de produção da BRF em Carambeí, no Paraná. Na gravação, segundo a PF, ele fala com um funcionário sobre colocar papelão junto com a carne moída. A JBS, responsável pelas marcas Seara, Friboi, Big Frango e Swift, também é investigada."