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Política

Senado articula boicote à votação nesta terça-feira de crédito extra que beneficia deputados

Congresso vai analisar proposta de verba de R$ 3 bilhões ao governo federal para pagar emendas. Câmara e Senado disputam recursos públicos
Os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre 29/08/2019 Foto: Marcelo Camargo / Agência O Globo
Os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre 29/08/2019 Foto: Marcelo Camargo / Agência O Globo

BRASÍLIA — Irritados com deputados em meio à queda de braço por verbas nas últimas semanas, senadores vão tentar impedir a votação, na sessão do Congresso marcada para esta terça-feira, de um crédito extra de R$ 3 bilhões ao governo federal, que o Palácio do Planalto usaria para honrar acordo com deputados. Para parte dos senadores, o montante serve para atender o centrão pelas negociações da reforma da Previdência na Câmara e, portanto, não deve ser votado, por ser uma espécie de “toma lá, dá cá”. A votação foi adiada na semana passada, depois de obstrução de senadores.

— O objetivo mais importante de votar esse PLN (Projeto de Lei do Congresso Nacional), que o governo e os presidentes das Casas querem, é o pagamento das emendas. Enquanto pudermos continuar obstruindo, obstruiremos — diz Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder da oposição no Senado.

Para outros, porém, o que falta é o governo incluir o Senado no acordo. Esperam que o Executivo encaminhe uma nova proposta, liberando uma verba maior, de até R$ 5 bilhões, sinalizando que irá pagar também emendas e verbas extraorçamentárias a prefeituras indicadas por senadores.

— Enquanto não chegar o PLN do Senado, eles não vão deixar votar o PLN da Câmara — resume José Nelto (GO), líder do Podemos na Câmara.

O ministro Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, tem estudado como elaborar uma nova proposta e atender aos senadores, mas ainda não teve uma liberação da equipe econômica.

Os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), mantêm boa relação, mas o grupo que influencia Maia — líderes do PP, PL, DEM, SD, Republicanos — tem interesses antagônicos aos de uma parcela do Senado.

Na semana passada, Alcolumbre foi cobrado por líderes partidários da Câmara, mas não conseguiu votos no Senado para a derrubada de vetos do presidente Jair Bolsonaro à reforma partidária — que flexibiliza gastos dos partidos com dinheiro público — nem para a votação do crédito extra. O impasse irritou deputados.

— O Senado está usando a estratégia de esvaziar o plenário para não dar quórum nas votações de interesse da Câmara há quatro semanas. Posam como ‘Casa do bem’, colocam a Câmara como ‘Casa do mal’ e ficam nessa queda de braço querendo impor determinadas pautas — critica o líder do PL na Câmara, Wellington Roberto (PB).

Disputa evidente

A disputa entre as Casas foi escancarada na semana passada com a briga entre o senador Cid Gomes (PDT-CE) o deputado Arthur Lira (AL), líder do PP, por causa dos critérios para dividir com estados e municípios os recursos do megaleilão do petróleo. Ao analisar uma proposta aprovada pelo Senado com critérios para a divisão, deputados não gostaram das projeções. Os senadores aprovaram a partilha de 67% para a União, 15% para estados e 15% para municípios e 3% para o Rio, o estado produtor.

Em meio à disputa, o senador Cid chamou Lira de “achacador” e disse que o Senado não pode ficar refém de decisões da Câmara sobre a destinação do dinheiro.

A discussão tem como pano de fundo a tentativa de reduzir os valores que serão liberados aos governos estaduais. Isso porque a maioria dos líderes na Câmara faz oposição aos governadores. O caso se aplica a Lira, cujo estado de Alagoas é comandado por Renan Filho (MDB), seu adversário.

— Todas as questões que envolvem disputas de recursos entre estados e municípios sempre têm dificuldades de avançar no Congresso e claro que essa briga acende um sinal amarelo para o que vai acontecer na reforma tributária — afirmou o presidente nacional do DEM, ACM Neto, que é prefeito de Salvador.

No mês passado, Senado e Câmara disputaram protagonismo também pela reforma tributária. O Senado deu início à tramitação do parecer de Roberto Rocha (PSDB-MA), enquanto a Câmara tocou a proposta do relator Baleia Rossi (MDB-SP). Na semana passada, Maia afirmou que o ministro Paulo Guedes (Economia) vai encaminhar à Câmara sua proposta:

— Precisamos da liderança do governo nesse processo.

Senadores temem que ocorra como na reforma da Previdência, na qual, na visão de alguns, o Senado foi uma “casa carimbadora” das alterações feitas pela Câmara.

Em um gesto ao Senado, Maia colocou na pauta da Câmara o projeto de securitização da dívida dos entes federados, que permite a cobrança de impostos e pode aumentar a arrecadação. Para Otto Alencar (BA), líder do PSD no Senado, a Casa não deve votar o segundo turno da Previdência antes que a Câmara analise essa proposta e resolva o que fazer com a cessão onerosa:

— O grande problema é que o Senado não é casa revisora coisa nenhuma, porque se a gente muda, tem que voltar para a Câmara. Tem que mudar isso. E o grupo que comanda a Câmara, o centrão, não se entende com o Senado.