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Professores da Unicamp criam modelo de moradia para quem quer envelhecer em comunidade

por Maria da Luz Miranda

Instituição de longa permanência, a casa dos filhos, a própria casa. A escolha do lugar onde morar na velhice exige muito além de cuidado. As alternativas crescem e os empreendimentos para quem já passou dos 60 anos se avolumam no país, que  terá 35% de sua população nessa faixa etária em 2070, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Mas além de convivência e suporte médico 24 horas, há quem queira garantir a autonomia a todo custo. Um grupo de professores aposentados da Unicamp saiu na frente e, com inspiração em modelos de outros países, aderiu a um modelo nada convencional de moradia para os padrões brasileiros, o cohousing para maiores.

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O recém-criado Vila ConViver, cuja inauguração está prevista para 2020, é um projeto elaborado a partir de pesquisas do Grupo de Trabalho Moradia/ADunicamp, a associação de docentes da universidade paulista, voltado para docentes aposentados ou em vias de se aposentar. Segundo o professor aposentado Bento da Costa Carvalho Junior, 71, foram mais de dois anos de estudo até que a proposta ficasse pronta para colher adesões. Se os modelos existentes no Brasil não serviam, a turma foi buscar, fora do país, propostas com foco nas “comunidades intencionais” construídas especialmente para esse público específico, que quer vida boa e saudável além de longa.

Incentivadora do projeto e estudiosa de novas formas de moradia para a terceira idade, a professora do departamento de antropologia da unicamp Guita Grin Debert autora do livro “A reinvenção da Velhice” (Edusp), defende o modelo surgido na Dinamarca na década de 1960. A tendência, assegura ela, é de aumento no número daqueles que moram separados dos filhos. Os novos arranjos estão surgindo. Se em comunidade, tanto melhor, defende Guita, já que  a satisfação na velhice também tende a aumentar se estão acompanhados. 

O princípio da Vila ConViver, que já tem 65 adeptos e fila de espera, é exatamente o da comunidade. O objetivo é promover a reflexão e a transformação da rotina dos moradores, criar uma nova arquitetura social que privilegie a vizinhança, prevenir o isolamento social e a depressão, e contribuir para uma vida mais longa dos moradores. Uma comunidade solidária apoiada na troca mútua.

"As pessoas querem viver e envelhecer com amigos. Ter amigos nesta fase da vida gera segurança em todos os sentidos", afirma Bento, que iniciou a jornada para atender a uma demanda dos associados mais velhos da ADunicamp. "Quando estudamos com cuidado essa opção, vi que era muito mais que uma moradia segura e agradável, mas um novo modo de se viver, uma experiência que envolve cooperação e participação em atividades comuns, além de desenvolver interesses e responsabilidades numa fase da vida em que isso deixa de existir. Essas atividades comuns exigem diálogo, compreensão do outro, e isso gera amizades", diz ele, que aderiu e não somente pela própria velhice.

O Vila ConViver será instalado em uma área ainda a ser definida, no subúrbio de Campinas. O custo para cada participante será em torno de R$ 350 mil por unidade. Pode parecer caro, mas o modelo também pode servir para bolsos menos abastados.

"Num certo momento, descobri que o cohousing sênior era uma grande solução para a segunda fase da minha vida também. Além disso, como os homens geralmente morrem mais cedo do que as mulheres, fico mais tranquilo que a minha companheira de vida e na jornada de construção estará num grande lugar quando eu tiver partido. E, claro, isso é o que quero hoje, não só para mim, mas que esse conceito esteja disponível para todos os envelhecentes, de todas as camadas sociais", completa Bento.

O exemplo está dado, sugere o engenheiro Edgar Werblowsky, criador do Fórum de Moradia para a Longevidade que pesquisa modelos de moradia pelo mundo adaptáveis à realidade brasileira.

"O principal desafio para o florescimento do modelo no Brasil é a governança. Para um país que não tem tradição em associativismo, em trabalho em comunidade, os processos de tomadas de decisão são cruciais e sua falta podem por tudo a perder", sugere.

As dificuldades, claro, vem a reboque. Entre os integrantes, ainda há desconhecimento desse tipo de comunidade residencial intencional e dos benefícios associados ao modelo, além da resistência à adoção de um modelo não hierárquico, participativo e cooperativo, segundo Bento. E na hora de construir e legalizar, ainda faltam legislação adequada e compreensão por parte dos órgãos públicos. Mas, devagar e sempre, eles estão caminhando e propagando a ideia.

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