Política

Juízes do Paraná movem 36 ações contra jornal e repórteres

Motivo foi reportagem sobre salários além do teto de magistrados
O Tribunal de Justiça do Paraná: juízes de Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná defendem proposta Foto: Divulgação / TJPR
O Tribunal de Justiça do Paraná: juízes de Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná defendem proposta Foto: Divulgação / TJPR

SÃO PAULO — Magistrados do Paraná ingressaram com uma série de ações contra a “Gazeta do Povo” e cinco repórteres do jornal por causa de uma reportagem publicada em fevereiro que revelou os rendimentos dos membros do Judiciário e do Ministério Público do estado. Os processos foram abertos em diferentes cidades paranaenses no Juizado Especial, que aceita causas de pequeno valor (até 40 salários-mínimos) e obriga os profissionais a comparecerem a todos as audiências de conciliação para não serem condenados à revelia.

A reportagem mostrou que o rendimento médio de juízes e membros do Ministério Público no Paraná, em 2015, superou o teto constitucional (de R$ 30.471,10) em mais de 20%. Como reação, os juízes já ingressaram com 36 ações e os promotores, com duas, contra o jornal e os profissionais. Numa mensagem enviada para o grupo de WhatsApp da Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar), o presidente da entidade, Frederico Mendes Junior, diz, logo após a publicação da reportagem, que está “providenciando um modelo de ação individual” para os associados irem à Justiça se considerarem “conveniente”.

Para a Associação Nacional dos Jornais (ANJ), as ações têm o objetivo de atrapalhar a defesa.

— Estamos acompanhando o caso com muita preocupação. São ações completamente descabidas porque o que o jornal fez foi fazer jornalismo — diz o diretor executivo da ANJ, Ricardo Pedreira.

Pedreira destaca que o caso lembra o expediente usado, em 2007, por fieis da Igreja Universal para contestar uma reportagem da “Folha de S. Paulo” sobre as atividades empresariais da instituição. Na ocasião, foram 107 ações contra a repórter e o veículo em diversas cidades.

Em nota, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) repudiou a retaliação.

Segundo o diretor de redação da “Gazeta”, Leonardo Mendes Júnior, as ações são “idênticas”.

— Na prática, eles (os profissionais) já estão condenados com a pena de não conseguir exercer a profissão — diz o diretor.

Os jornalistas ficam até quatro dias da semana sem trabalhar para irem às audiências.

— Já percorremos mais de 6 mil quilômetros pelo estado, às vezes saindo correndo de uma cidade para dar tempo de dormir no meio do caminho e chegar na outra audiência no dia seguinte a tempo de não sermos julgados à revelia — conta Rogério Galindo, um dos alvos das ações.

O jornal ingressou no Supremo Tribunal Federal com pedido para que o caso seja julgado na Corte, já que as ações são apreciadas por juízes citados na reportagem, o que configuraria conflito de interesse. A ministra Rosa Weber negou o pedido.

A Amapar alega que a reportagem tem conteúdo “ofensivo à magistratura” e, de forma equivocada, diz que juízes e promotores receberiam acima do teto legal. Ainda alega que recebeu centenas de reclamações. “Colegas de todo Estado passaram a experimentar algum tipo de dissabor ou constrangimento, a exemplo da indagação de populares sobre os supersalários”. A Amapar diz que não tem a intenção “de inviabilizar o trabalho dos jornalistas, mas que a parte que se sente lesada tem o direito de entrar com ação no local em que reside”. Nas audiências, os juízes contestam o uso na reportagem do termo “supersalário”.