Por Paloma Rodrigues, TV Globo — Brasília


O presidente da Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais, Marcos Camargo, afirmou nesta sexta-feira (1º) que análise das provas que envolvem o sistema que registra ligações de interfone no condomínio do presidente Jair Bolsonaro, no Rio, foi superficial e que a ausência de perícia oficial pode levar à nulidade do processo.

Segundo Camargo, o tempo para análise do material seria de, em média, de 30 dias, considerando a quantidade de informações acumuladas e a complexidade do caso. O Jornal Nacional apurou que o pedido de perícia que consta no processo foi protocolado às 13h05 de terça-feira (29) e a entrevista coletiva com o anúncio das conclusões começou pouco depois, às 15h30.

"O prazo padrão que nós damos dentro da pericia é normalmente 30 dias. Não quer dizer que vá demorar 30 dias. Pode ser um pouco antes disso, como pode ir um pouco além, mas esse é o padrão", diz.

Reportagem do Jornal Nacional mostrou na terça-feira (29) que um porteiro do Condomínio Vivendas da Barra, onde Jair Bolsonaro tem uma casa, contou à polícia que, horas antes do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista dela, Anderson Gomes, o ex-policial militar Élcio Queiroz, suspeito de participação no crime, chegou ao condomínio.

Segundo o porteiro, Queiroz disse que iria à casa 58 e que o "seu Jair" atendeu ao interfone e autorizou a entrada. Queiroz, entretanto, seguiu para a casa de Ronnie Lessa, outro apontado como envolvido no assassinato, no mesmo condomínio. Naquele horário, o então deputado Jair Bolsonaro estava em Brasília e participou de votações na Câmara no mesmo dia.

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Perícia oficial

A associação também questiona a ausência de uma perícia oficial. Isso porque as provas periciais, de acordo com o Código de Processo Penal, competem a peritos oficiais. No caso do Rio de Janeiro, os peritos oficiais estão vinculados à Polícia Civil. No caso da União, seriam peritos federais. A perícia do caso foi realizada por um técnico do Ministério Público do Rio de Janeiro.

A ausência de perícia oficial, afirma Marcos Camargo, pode levar à anulação do processo. "Lá na frente, se não tiver perícia, ele é passível de ser anulado", afirmou. A decisão sobre o arquivamento ou nulidade do processo cabe à Procuradoria Geral da República (PGR).

Ainda segundo o Código de Processo Penal, na falta de perito oficial, o exame será realizado por duas pessoas idôneas, portadoras de diploma de curso superior, preferencialmente na área específica, dentre as que tiverem habilitação técnica relacionada com a natureza do exame.

"O que vai diferir, principalmente, é a questão do rigor científico. Nossa perícia oficial vai trabalhar com autonomia técnica, científica e funcional", disse Camargo.

Ele argumenta que os peritos do Ministério Público, por estarem atrelados ao órgão, não contemplam esse requisito.

"É diferente do assistente técnico, que assiste alguma das parte. Pode assistir o Ministério Público, como é o caso, ou assistir algum particular que tem interesse no processo. Então, ele tem uma ligação direta com alguma das partes", afirmou.

O presidente da associação ainda acrescenta que o Ministério Público flexibilizou o conteúdo probatório nesse caso. "Poderia ter sido feito um pedido de perícia oficial para os órgãos competentes ou Polícia Civil ou Polícia Federal", disse.

"A opção que acabou se tendo, ao nosso ver, em discordância com o Código de Processo Penal, foi uma flexibilização para menor do conteúdo probatório", declarou.

Em nota, a Associação dos Peritos do Estado do Rio de Janeiro (Aperj) também afirma que não houve perícia oficial. "O material não foi encaminhado para a Perícia Oficial da Secretaria de Estado de Polícia Civil (SEPOL), não tendo sido realizado nenhum laudo oficial", diz o texto da nota (leia a íntegra abaixo).

Nota da Associação dos Peritos do Rio

Leia abaixo a íntegra de nota divulgada pela Associação dos Peritos do Estado do Rio de Janeirl.

Rio de Janeiro, 01/11/2019

A APERJ vem a público, diante dos últimos acontecimentos noticiados pela mídia, esclarecer sobre os exames nos arquivos que tratam da entrada de visitantes no condomínio Vivendas da Barra, onde reside o presidente Jair Bolsonaro; arquivos estes que foram objetos de exame do grupo de técnicos do MPRJ que, segundo reportagens, analisou um CD contendo as gravações questionadas.

Em primeiro lugar é importante esclarecer que este material não foi encaminhado para a Perícia Oficial da Secretaria de Estado de Polícia Civil (SEPOL), não tendo sido realizado nenhum laudo oficial.

Em segundo lugar, os Peritos do ICCE (Instituto de Criminalística Carlos Éboli) são altamente capacitados e competentes para realizar tais exames. Sabendo que o equipamento gravador é o meio original da gravação, este precisa ser arrecadado, preservado e examinado. Se não for assim, não há condições de identificar se houve montagem, com supressão ou acréscimo de arquivos.

A boa técnica jurídica exige que a perícia seja realizada diretamente na mídia original e por peritos oficiais.

Direção da APERJ

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