Ela Moda

Em tempos de inclusão, rostos maduros estão em alta da moda

Movimento tem acontecido no Brasil e no mundo
Marcos Luko Foto: Tato Bellini
Marcos Luko Foto: Tato Bellini

Há mais ou menos quatro anos, Costanza Pascolato percebeu um movimento interessante naindústria da beleza: de repente, rostos joviais cediam espaço, ainda que timidamente, a traços maduros. A moda foi impregnada pela ideia, e a passarela deixou de ser um território povoado somente por adolescentes, várias recém-saídas da puberdade. Muita gente se perguntou: seria o fim do mito da juventude?

Veja a última temporada internacional: a Valentino resgatou Kristen McMenamy, de 54. A Versace trouxe Shalom Harlow, de 45, para fechar seu desfile. Enquanto a Dolce & Gabbana recrutou Carla Bruni, de 50, Helena Christensen, de 49, e Eva Herzigova, de 45, para vestir suas criações. Naomi Campbell, de 48, segue nas cabeças, emplacando trabalhos da Miu Miu à H&M, assim como Cindy Crawford, de 52, Kate Moss, 44, Stephanie Seymour, de 50, Monica Bellucci, de 54, e Christy Turlington, de 49.

Naomi Campbell na passarela da Miu Miu Foto: Pascal Le Segretain / Getty Images
Naomi Campbell na passarela da Miu Miu Foto: Pascal Le Segretain / Getty Images

Na São Paulo Fashion Week, em outubro, a Água de Coco escalou Constanze von Oertzen, de 53, e Marcos Luko, de 49; já a Lilly Sarti elegeu ShirleyMallmann, de 41.

— O mundo da moda sempre foi radical para o outro lado. Não entendo o porquê de uma garota de 17 anos estar na passarela de uma marca que não seja teen. Não tem a menor graça. Só uma mulher que sabe bem quem é consegue carregar uma roupa perfeitamente — diz Costanza. — O que acontece na maioria dos desfiles é a despersonalização do ser humano.

Para a empresária e consultora de moda, falta militância aos maduros, especialmente no Brasil:

— Minha filha Consuelo (Blocker, influenciadora digital) costuma brincar que por aqui não é ruim ser velho; é errado. Temos uma sociedade machista, na qual a mulher com uma certa idade não é contemplada. Daí, o sucesso enorme das cirurgias plásticas. É necessário reivindicar, representamos um mercado extraordinário. Queremos peças bacanas e confortáveis.

Liana Thomaz, dona e diretora criativa da Água de Coco, afirma que a escolha de modelos mais velhos tem a ver com a fase interna da grife de beachwear e do mundo:

Cindy Crawford, garota propaganda da Omega Foto: Divulgação
Cindy Crawford, garota propaganda da Omega Foto: Divulgação

— É um momento de quebra de paradigmas, então foium caminho natural. Não consigo encontrar uma razão que explique o fato de a moda ter seguido por tanto tempo um determinado padrão. Só encontro pontos positivos por deixá-lo para trás. Com essa atitude, passamos a falar com mais gente. Recebemos mensagens de internautas dizendo o quanto estão felizes por se sentirem representadas. Isso faz todo o trabalho valer a pena!

Gloria Kalil, consultora e editora de moda, diz que essa mudança de postura foi esperta:

— Os empresários se deram conta de que essas pessoas são consumidoras a quem se deu muita pouca atenção até agora.

A indústria cortejava a juventude. Hoje, corre atrás de mercados novos e crescentes, como o plus-size e o maduro. A modelo alemã Constanze von Oertzen, radicada no Brasil desde 1989, sugere que o movimento ainda é tímido por aqui, diante do potencial de compra dessa parcela da população:

— Muitas grifes deveriam ter rostos maduros em suas campanhas, criando, assim, uma identificação maior com o público. Mas existe um preconceito com a idade.

Aos 42 anos, a top paulistana Luciana Curtis diz com conhecimento de causa que uma mulher de 40 quer ver outra da mesma faixa promovendo o produto que vai usar.

— Não desejamos ser representadas por uma menininha, é até estranho uma mocinha numa campanha de creme antissinais, não acha? — questiona Luciana, que não acreditava que sua trajetória seria tão longa. — Dei meus primeiros passos nesse universo na década de 1990, quando era impensável sobreviver nesta indústria depois dos 20 e poucos. Mas os convites nunca pararam de chegar, e ainda estou aqui em 2018.

Luciana Curtis, 42 anos Foto: Divulgação
Luciana Curtis, 42 anos Foto: Divulgação

A supermodelo gaúcha Shirley Mallmann confirma que a carreira era realmente curta, baseada no frescor da mocidade:

— Tínhamos que virar atrizes ou qualquer outra coisa. Hoje, graças a Deus, podemos continuar trabalhando — festeja ela, que considera a idade “só um número”. — Faço laser no rosto, uso cremes, tudo para ficar bem. No entanto, não dá para ser radical e aparentar algo que não seja natural. O importante é gostar de quem você é, mostrar sua melhor versão. Não adianta entrar numa briga contra o tempo, porque ele vai passar.

Às vésperas de completar meio século de vida, Marcos Luko está numa ascendente. Na São Paulo Fashion Week, além do desfile da Água de Coco, foi visto na passarela da Handred. Aposentadoria nem passa por sua cabeça:

— Estou trabalhando bastante. Jamais parei, mas o cenário vem melhorando a cada dia. Não me preocupo com o envelhecimento. Vivo o agora, vencendo os desafios, sempre com os pés no chão.

Para o catarinense Jorge Gelati, de 53 anos, esse movimento está ligado diretamente à longevidade da sociedade:

— Estamos vivendo mais e de forma saudável, ou seja, existe uma demanda maior dessa parte da população. A idade acabou se tornando algo aceitável.

Costanza Pascolato garante que esse movimento é irreversível, um caminho sem volta:

— Ninguém mais se identifica com aqueles modelos que encontramos nas passarelas de Paris ou São Paulo. Não dá. Estão completamente fora de lugar.