Política Lava-Jato

Em depoimento, Funaro afirma que levava malas de dinheiro para Geddel

Segundo doleiro, entregas eram feitas no aeroporto de Salvador

Geddel Vieira Lima ao deixar o prédio da Justiça Federal, onde prestou depoimento após ser preso, no início de julho
Foto: DIDA SAMPAIO/06-07-2017 / Agência O Globo
Geddel Vieira Lima ao deixar o prédio da Justiça Federal, onde prestou depoimento após ser preso, no início de julho Foto: DIDA SAMPAIO/06-07-2017 / Agência O Globo

RIO E BRASÍLIA — O doleiro Lúcio Funaro afirmou, em depoimento, que levou malas de dinheiro ao ex-ministro Geddel Vieira Lima em várias ocasiões. As entregas teriam sido feitas no aeroporto de Salvador, no hangar da empresa de táxi aéreo Aero Star. Em duas ocasiões, quando ia para Trancoso e Barra de São Miguel, na Bahia, Funaro parou em Salvador apenas para entregar a propina a Geddel.

As declarações, dadas em depoimento à Polícia Federal, foram corroboradas por Raquel Pitta, mulher de Funaro. Em depoimento, ela também contou sobre a viagem em que pararam em Salvador para levar as remessas a Geddel Vieira Lima.

“Que o declarante fez várias viagens em seu avião ou em voos fretados, para entregar malas de dinheiro para Geddel Vieira Lima. Que essas entregas eram feitas na sala vip do hangar Aero Star, localizada no aeroporto de Salvador, diretamente nas mãos de Geddel. Que, realmente, em duas viagens que fez, uma para Trancoso e outra para Barra de São Miguel, o declarante fez paradas rápidas em Salvador, para entregar malas ou sacolas de dinheiro para Geddel Vieira Lima”, disse Funaro, segundo a transcrição do depoimento.

As declarações de Funaro e Raquel foram usadas pelo Ministério Público Federal (MPF), em um segundo pedido de prisão contra o ex-ministro, que desde esta quinta-feira cumpre prisão domiciliar. Este novo pedido de prisão foi rejeitado nesta quinta pelo juiz federal Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília.

A perícia feita no celular de Raquel identificou que Geddel ligou para ela 16 vezes em 19 dias, entre 13 de maio e 1º de junho, período em que ele já havia deixado o governo de Michel Temer. A mulher de Funaro ligou para Geddel uma vez no mesmo período. O doleiro, que já assumiu que atuava como operador financeiro do PMDB, disse à PF que a insistência nos contatos fez com que tivesse receio de que sua família pudesse sofrer alguma retaliação.

“Que, embora possuísse uma amizade com Geddel Vieira Lima, e não houvesse manifestações expressas de uso de violência por parte dele ou de outra pessoa, essas ligações insistentes por parte de Geddel, provocavam no declarante um sentimento de receio sobre algum tipo de retaliação caso viesse a fazer algum acordo de colaboração premiada, tendo em vista que Geddel era membro do 1º escalão do governo e amigo íntimo do presidente Michel Temer, e considerava possível que Geddel ou outros ligados a ele pudesse, exercer influências políticas sobre algum órgão, ou até mesmo o Poder Judiciário, a fim de prejudicar o declarante, no caso de resolver firmar acordo de colaboração premiada; Que por isso o declarante sempre orientou sua esposa a atender os chamados de Geddel e informar que estava calmo e tranquilo, justamente para transmitir a ideia de que não tinha a intenção de firmar acordo de colaboração; Que essas comunicações reiteradas de Geddel geravam no declarante o sentimento de que estava sendo monitorado e em dado momento passou a ter receio sobre a segurança de sua esposa e filha, já que faziam deslocamentos para o presídio da Papuda em estrada pouco movimentada”, disse Funaro, de acordo com a transcrição.

A prisão preventiva do ex-ministro havia sido decretada porque o juiz Vallisney Oliveira, da 10ª Vara Federal do Distrito Federal, entendeu que os contatos frequentes representavam uma tentativa de obstruir a Justiça. O juiz entendeu que a intenção de Geddel seria monitorar uma possível delação premiada de Funaro. O desembargador Ney Bello, do Tribunal Regional Federal da 1ª região (TRF-1), transformou a prisão preventiva em domiciliar.

JUIZ: NO FUTURO, NOVA PRISÃO É POSSÍVEL

Em petição enviada à Justiça Federal, o advogado de Geddel, Gamil Föppel, chamou o novo pedido de prisão de “absurdo” e “verdadeiro terrorismo processual". Ele afirma ainda que a alegação do MPF de que existem fatos novos que justificam o pedido não é verdadeira e que o desembargador que concedeu a prisão domiciliar já tinha conhecimento do conteúdo dos depoimentos de Raquel e Funaro.

No pedido de prisão, o MPF acrescentou que Geddel alegou que seria capaz de “exercer influência criminosa sobre o Poder Judiciário da União". Os procuradores citam um trecho do depoimento em que Raquel conta que o ex-ministro reclamou da troca de advogado de Funaro. Segundo a mulher do doleiro, Geddel afirmou que “o advogado (de Funaro) era bom e estaria fazendo tudo certinho e que estaria tudo certo para a saída dele", mas que com a troca, “tinha ficado ruim para o juiz". O relatório, no entanto, explica em detalhes a referência feita a um magistrado.

“É certo, no entanto, que, ao mencionar o possível contato com um membro julgador, Geddel Vieira Lima tenta macular a credibilidade e a moralidade do Poder Judiciário Federal, vendendo sua pretensa influência a fim de obter benefício ilegal (não ser delatado ou incriminado por Lúcio Bolonha Funaro)", escreveram os procuradores.

Ao rejeitar o novo pedido de prisão, o juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília, afirmou que decretar novamente a prisão seria desrespeitar decisão do desembargador federal Ney Bello, que, na quarta-feira, mandou converter a prisão preventiva de Geddel em prisão domiciliar.

Por outro lado, Vallisney destacou que, futuramente, se surgirem novas provas, a prisão poderá ser determinada novamente. “É que, como há indícios dos crimes noticiados pelo MPF, em especial o crime de exploração de prestígio de que é vítima também a administração da justiça, inclusive pela gravidade das condutas a que se atribui ao requerido, devem os fatos ser apurados com profundidade e atenção", anotou o juiz.