Cinema

Por Alysson Oliveira, do Cineweb*, Reuters


Cena de 'Introdução à música do sangue' — Foto: Divulgação

Em “Introdução à música do sangue”, o diretor e roteirista Luiz Carlos Lacerda (“Leila Diniz”, “For all: O trampolim da vitória”) deixa de lado o tom mais cínico e cômico que caracteriza seus filmes para mergulhar no universo denso e introspectivo da obra do escritor mineiro Lúcio Cardoso. O resultado, que conta com uma bela fotografia (assinada por Alisson Prodlik), é um tanto irregular.

Adaptar a obra de Cardoso – sobre quem Lacerda fez um curta documental, em 1968 – não é tarefa simples. Sua prosa psicológica é pesada e claustrofóbica, a ação, por assim dizer, é quase toda de cunho interior. Poucos se aventuraram na empreitada e, de longe, Paulo César Saraceni (a quem este filme é dedicado) foi o mais bem sucedido, com “A casa assassinada”, de 1971, baseado em “Crônica da casa assassinada”. Em “Introdução à música do sangue”, o diretor e roteirista parte de um texto inacabado do escritor.

Logo de cara, durante os quase 8 minutos de créditos iniciais, o filme impõe seu ritmo que, se não lento de todo, é cadenciado e convida à introspecção da narrativa, situada em algum lugar do interior de Minas Gerais. Numa pequena casa moram Uriel (Ney Latorraca), sua mulher, a costureira Ernestina (Bete Mendes), e a garota Isabel (Greta Antoine). Não há luz elétrica, é um ambiente arcaico.

Há uma atmosfera de repressão de desejos no ar, que serão libertados com a chegada de um peão, Chico (Armando Babaioff). Isabel logo se interessa pelo rapaz, mas pouco sabemos sobre ela. Seu comportamento, às vezes, é estranho, sensual; em outros momentos, ela parece infantilizada.

A fotografia do filme, que aproveita bastante a luz natural, salienta a ausência de eletricidade na região – isso, aliás, gera constantes reclamações de Ernestina por conta do trabalho numa máquina de costura pesada. “Se tivesse eletricidade, eu poderia ganhar mais para ajudar em casa” é algo que ela sempre diz. Uriel, por sua vez, que cuida da horta ouvindo rádio a pilha, é completamente contra essa modernidade toda. Um conflito esboçado, portanto, mas que nunca é aprofundado, resumindo-se apenas a essa ladainha o tempo todo.

Lacerda constrói de forma satisfatória a claustrofobia da repressão e das relações fraturadas entre o trio de personagens dentro da mesma casa. Mas a chegada do estranho no ninho, Chico, faz com que o filme perca seu eixo. Quando a ciranda de interesses – mais carnais do que espirituais ou românticos – de um personagem por outro se desenha, a narrativa se desorienta e a trama não sabe muito bem para onde ir, até seu clímax óbvio, mal preparado e mal encenado – Latorraca está num tom e Greta em outro completamente diferente; ele parece estar fazendo comédia e ela, drama. Ainda assim, apesar dos altos e baixos, é sempre uma satisfação ver a grande Bete Mendes na tela.

*As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb

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