Por Murillo Velasco, G1 GO


MPF diz que Goiás deixou de usar recursos para presídios antes da fuga em Trindade

MPF diz que Goiás deixou de usar recursos para presídios antes da fuga em Trindade

O Ministério Público Federal (MPF) em Goiás recomendou, antes da fuga de 20 presos após parte do muro ser explodido na cadeia de Trindade, na Região Metropolitana de Goiânia, que o Estado não deixasse de aplicar recursos públicos repassados pelo governo federal para melhoria no sistema prisional. Segundo o órgão, nos últimos 10 anos, R$ 19 milhões foram devolvidos sem ser utilizados em melhorias.

Em nota à TV Anhanguera, o Governo de Goiás disse que vem usando o dinheiro da União em dias e que, até o final do ano, vai entregar três novos presídios, abrindo 988 vagas.

No texto do documento, expedido no último dia 6 de junho, o procurador da República Rafael Perissé Rodrigues Barbosa destaca que a não aplicação dos recursos acarreta a prática do crime de “improbidade administrativa” por parte dos gestores.

“Diante desse cenário de precariedade, a devolução de recursos sem a devida utilização configura grande incoerência administrativa, fato que inquestionavelmente contribui para o agravamento da já precária situação dos presídios do estado”, afirma o procurador na recomendação.

O documento foi divulgado pelo MPF depois da fuga de 20 presos da unidade prisional de Trindade, na tarde de domingo (15). Os detentos fugiram no fim do horário de visitas, após duas explosões. A primeira aconteceu em uma cela para distrair os agentes que estavam de plantão. A segunda atingiu parte do muro nas proximidades da guarita, abrindo um buraco para que os internos escapassem.

Inicialmente a diretoria divulgou que 19 presos tinham fugido da unidade. Porém, após nova verificação, o órgão disse que, na realidade, foram 20 internos. Quatro deles já foram recapturados. Na ação, que aconteceu no domingo (15), oito presos ficaram feridos, mas só dois seguem internados.

Presos foragidos do Presídio de Trindade, em Goiás — Foto: Arte/G1

Equipamentos insuficientes

A Diretoria-Geral de Administração Penitenciária (DGAP) afirmou que os equipamentos de segurança e revista do presídio de Trindade são insuficientes para detectar a presença de explosivos.

"A revista é feita com o que chamamos de raquete, que não detecta material explosivo, apenas materiais metálicos. Além disso, não é feito mais revistas íntimas, conhecidas como vexatórias. Uma das suspeitas é que mulheres entraram com esse material nas partes íntimas”, disse o diretor do órgão, coronel Edson Costa.

Ainda na segunda-feira, a mulher de um preso foi detida suspeita de facilitar a entrada dos explosivos usados para explodir parte de uma cela e o muro do presídio. A mulher foi identificada como Akylla Ferrão Antunes, de 24 anos. O marido dela, Matheus Fernandes Assis, de 23 anos, não conseguiu fugir e ainda se machucou durante a explosão.

Além de Akylla, Jacson Delúbio Santana de França, de 24 anos, também foi detido suspeito de ajudar na fuga. De acordo com a Polícia Militar, ele levaria a chave reserva do Honda Civic para a jovem. A corporação informou ainda que, segundo o rapaz, quem o contratou integra uma facção criminosa responsável por tráfico de drogas.

Presídio de Trindade teve parte do muro explodido, em Goiás — Foto: Reprodução/TV Anhanguera

Crise no sistema

A fuga dos 20 presos da cadeia de Trindade foi um dos casos envolvendo a crise no sistema prisional do estado nos últimos dois dias. Na segunda-feira (16), o detento Rivail Lopes Bento morreu após ser agredido pelos demais presos durante o banho de sol, na unidade prisional de Jataí, na região sudoeste de Goiás.

No mesmo dia, segundo a DGAP, uma arma calibre 38 foi encontrada no pátio do pavilhão C, do Centro de Inserção Social Luiz Ilc, em Anápolis, a 55 km de Goiânia.

Também na segunda-feira, quatro presos conseguiram fugir da unidade prisional de Luziânia, no Entorno do Distrito Federal. Conforme informações divulgadas pela DGAP, os detentos serraram a grade, invadiram o consultório médico, subiram ao telhado e evadiram do local. No momento da ação, o alarma da unidade foi acionado, impedindo a fuga de outros 10 presos.

Em todos os casos, a Diretoria-Geral de Administração Penitenciária (DGAP) diz que os fatos são investigados.

Outro caso que também chamou a atenção nos últimos dias foi a soltura irregular do preso Leomar Oliveira Barbosa, de 55 anos, apontado como ex-braço-direito do traficante Fernandinho Beira-Mar. Ele recebeu um alvará de soltura do Presídio Estadual de Formosa, no Entorno do Distrito Federal, mas cumpria pena por outros crimes e não poderia ter sido solto.

O coronel Edson Costa, diretor do órgão, informou que existia uma série de procedimentos que deveriam ter sido adotadas no momento da liberação e que não foram feitos. O responsável não teve a identidade revelada, mas foi afastado do cargo até que as investigações sejam concluídas.

“Existem sérias suspeitas de facilitação contra o servidor. Ele deveria ter feito a consulta a nível estadual e veria que tinham outras condenações contra ele. E essas informações constavam em toda documentação dele”, disse o coronel.

Presos fogem do presídio de Trindade após parte do muro ser explodido, Goiás — Foto: Danila Bernardes/TV Anhanguera

Recursos devolvidos

Mesmo com a falta de estrutura e equipamentos relatada pela DGAP, o MPF afirma que o governo devolveu uma série de repasses ao governo federal. As verbas, segundo a procuradoria, deveriam ter sido investidas na construção e melhoria de presídios. No documento, o procurador destacou cinco contratos (veja relatório abaixo).

  • R$ 2,2 milhões deveriam ter sido aplicados na reforma da Penitenciária Odenir Guimarães (POG). Foram usados R$ 286 mil e devolvidos, com correção, R$ 3,1 milhões ao Tesouro Nacional.
  • R$ 1,3 milhões deveriam ser investidos na adaptação e ampliação da Colônia Agroindustrial do Semiaberto. O contrato sofreu distrato e a devolução, em valores corrigidos, foi de R$ 1,7 milhões.
  • R$ 4,5 milhões para construção da Penitenciária de Segurança Máxima em Aparecida de Goiânia foram devolvidos ao governo federal no valor de R$ 5,2 milhões.
  • R$ 600 mil para reforma da cadeia pública de Santa Helena de Goiás foram cancelados por conta da demora no início da execução das obras.
  • R$ 8,6 milhões para construção do Presídio Regional de Senador Canedo não chegaram a ser transferidos, pois o contrato foi cancelado. (Fonte: MPF-GO)

Presos fogem após criminosos explodirem parte do muro do presídio de Trindade, Goiás — Foto: Divulgação/Sinesp-GO

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