Crime na Lagoa: mais um jovem se apresenta à polícia e inocenta primeiro detido

Adolescente vai a delegacia e diz ter assaltado Jaime Gold com jovem de 15 anos entregue pela família na semana passada
O médico Jaime Gold, de 55 anos: ele foi esfaqueado por ladrões quando pedalava na Lagoa, atividade que era uma de suas paixões Foto: Divulgação

RIO — O caso do assassinato do cardiologista Jaime Gold, de 57 anos, esfaqueado na Lagoa na noite de 19 de maio, teve uma reviravolta. Na madrugada desta terça-feira, um adolescente de 16 anos, morador da Favela do Jacarezinho e com 20 anotações criminais por crimes contra o patrimônio, foi à delegacia do Engenho Novo com uma irmã e o padrasto para confessar sua participação no crime, cuja investigação já havia sido dada como encerrada pela Divisão de Homicídios do Rio. O suspeito inocentou o jovem de 16 anos que, apontado pela polícia como o autor dos golpes de faca na vítima, foi apreendido dois dias depois do crime. Segundo ele, o esfaqueador foi um adolescente de 15 anos, o segundo a ser detido. O terceiro jovem envolvido no caso já foi ouvido por promotores no Ministério Público estadual.

Policiais escoltam adolescente de 15 anos (de bermuda estampada azul) na chegada à DH, na Barra da Tijuca Foto: Pedro Teixeira / Agência O Globo

O rapaz contou a policiais ter assaltado o médico na companhia do segundo adolescente apreendido, que se entregou na semana passada. A nova versão pode mudar o rumo do inquérito. No dia da detenção do segundo suspeito, o diretor da Divisão de Homicídios, Rivaldo Barbosa, e a delegada Patrícia Aguiar, responsável pelo caso, afirmaram que os dois jovens capturados atacaram o médico, sendo que o primeiro teria desferido os golpes que causaram a morte de Gold.

DEPOIMENTO DE TESTEMUNHA CAUSOU POLÊMICA

Os dois delegados da DH afirmaram ainda que uma testemunha, que trabalha perto do local onde aconteceu o ataque, havia sido categórica ao reconhecer os suspeitos. No entanto, em um primeiro depoimento, dado à 14ª DP (Leblon), a mesma testemunha disse que não tinha condições de reconhecer os criminosos. Depois, na Divisão de Homicídios, garantiu que um dos assaltantes era branco e o outro, negro. Mas os dois suspeitos detidos, que até esta terça-feira eram os únicos a responder pelo crime, são negros. A confusão em torno da investigação chegou às redes sociais. No Facebook, a titular da delegacia do Leblon, Monique Vidal, chamou a atenção para as contradições do inquérito e para o fato de a principal testemunha ter prestado depoimentos diferentes.

Quando o segundo jovem foi detido, autoridades também divulgaram versões discrepantes. Depois de revelar sua participação no crime à família, ele foi levado pela avó e pelo padrasto a uma unidade da Secretaria municipal de Desenvolvimento Social no Rio Comprido. O órgão chegou a informar que ele havia confessado a uma assistente social que esfaqueou o médico. Em seguida, a secretaria o convenceu a falar com os policiais que investigavam o assassinato. No mesmo dia, algumas horas depois de ter conversado com a assistente social, ele prestou depoimento na DH, mas o teor da confissão à polícia era outro: ele teria admitido a participação no assalto, mas acusava o primeiro detido de esfaquear o médico. A Secretaria de Desenvolvimento Social fez uma retratação pública, afirmando ter havido um equívoco nas primeiras informações que divulgou. No dia seguinte, o órgão não quis mais se pronunciar sobre o caso.

Procurados nesta terça-feira, Rivaldo Barbosa e Patrícia Aguiar não quiseram comentar o surgimento de um terceiro jovem envolvido no assassinato. A assessoria de imprensa da Polícia Civil informou que os dois não se pronunciariam porque estavam checando a veracidade das novas informações. Nesta terça-feira, no final da noite, um outro delegado da DH, Gineton Lages, disse que ‘‘todo o trabalho será reavaliado’’. Ele informou que os três jovens investigados deverão ser submetidos a uma acareação.

CONFISSÕES NO FACEBOOK

De acordo com policiais que investigam o crime, o novo suspeito de envolvimento no caso afirmou, em mensagens publicadas na internet, estar arrependido de ter deixado o primeiro jovem responder por um crime que não cometeu. Segundo investigadores, ele disse em redes sociais que “não aguentava mais” ser julgado pelas pessoas e lamentava o sofrimento de seu cúmplice, que havia se entregado. “Tou (sic) sentindo que os caras tão fazendo a maior covardia com meu parceiro lá dentro”, teria escrito, referindo-se ao segundo suspeito detido.

O advogado Alberto de Oliveira Júnior, que representa o primeiro adolescente detido, afirmou que vai apresentar nesta quarta-feira um pedido de habeas corpus. A defesa do jovem sustenta que ele estava em casa, em Manguinhos, na noite em que Jaime Gold foi esfaqueado. Nesta terça-feira, por telefone, o advogado chamou o trabalho da polícia de “lambança’’ e disse que vai processar o governo do estado. Quando apresentou o adolescente como o assassino do médico, a polícia informou que ele já tinha 15 anotações criminais por roubos e furtos, a maioria na Zona Sul.

— Cada um vai ter que assumir as suas responsabilidades. A gente espera que os responsáveis (pela condução do caso) apareçam — afirmou Alberto de Oliveira Júnior.

MAIS DOIS ATAQUES

Nesta terça-feira, por volta das 20h, uma mulher foi esfaqueada na Avenida Maracanã, perto do Shopping Tijuca. Natália Deskow, de 27 anos, foi levada ao Hospital do Andaraí e recebeu alta duas horas depois. Testemunhas contaram que ela foi abordada por três jovens. Pela manhã, Fabio Martiniano, de 34 anos, foi preso após tentar roubar, com uma faca, uma pedestre no Aterro do Flamengo.