Por Globo Rural


A história de Luís Eduardo Magalhães, cidade que cresceu junto com o agronegócio

A história de Luís Eduardo Magalhães, cidade que cresceu junto com o agronegócio

A expansão do agronegócio no Oeste da Bahia trouxe desenvolvimento, mas também gerou problemas sociais e ambientais.

Formado gente vinda de vários lugares, principalmente do Sul do país, o jovem município de Luís Eduardo Magalhães hoje tem muitos outros sotaques. A capital do agronegócio baiano, com apenas 19 anos, é uma das cidades que mais crescem no país. O nome é uma homenagem ao político baiano que presidiu o Congresso Nacional e morreu em 1998.

Quando se desmembrou de Barreiras, no ano 2000, o então povoado de Mimoso do Oeste não passava de um ponto de apoio na BR 242, a estrada que liga a Bahia a Goiás. A população, que era de 18 mil habitantes, saltou para 85 mil.

Hoje, a cidade é a principal referência da região conhecida como Matopiba, nome dado à nova fronteira agrícola que fica na divisa dos estados de Maranhão, Tocantins, Bahia e Piauí.

A cidade cresceu junto com o agronegócio. E com a expansão da soja e do algodão, chegaram indústrias, lojas, grandes revendedoras. Sem falar da expansão urbana: o que era rua de chão batido, agora tem prédios subindo por todo lado.

A construção civil, os serviços e o comércio são as áreas da economia que mais crescem. Só as lojas de máquinas e equipamentos agrícolas movimentam mais de R$ 1 bilhão por ano.

Em apenas 8 anos, o PIB de Luís Eduardo Magalhães, que é a soma da riqueza gerada no município, aumento 145%, alcançando quase R$ 4 bilhões.

"O dinheiro circula com uma certa grandeza porque nossos agricultores produzem muito grão, e isso, claro, é um recurso que vem para a cidade. Nosso crescimento tem sido em média de 20% ao ano", diz Jother Lopes Arcanjo, presidente da Associação Comercial da cidade.

Problemas sociais

Mas nem tudo são flores… "Da mesma forma que a cidade cresce, crescem os problemas sociais que nós temos na cidade. Nós tivemos mais de 30 homicídios neste ano. Infelizmente isso é uma realidade: quando cresce a desigualdade social, vem junto a violência, os problemas de saúde, a falta de educação. O crescimento na cidade tem um preço", diz Jother.

Quem conhece a cidade vê logo o contraste: condomínios de luxo de um lado, bairros pobres, sem urbanização do outro. E a prefeitura tem uma das melhores receitas entre os municípios do Oeste baiano: R$ 370 milhões por ano.

"Uma cidade que cresce 250% em 10 anos sempre vai ter vários problemas de infraestrutura, por exemplo. Mas nós estamos fazendo vários investimentos nessa área", diz o prefeito Oziel de Oliveira.

Dez novas escolas estão sendo construídas para atender a uma demanda que não para de crescer. A cada ano, aproximadamente 2 mil novos alunos entram para o sistema de ensino do município.

Os novatos geralmente são filhos de pessoas que vão para a cidade em busca das mesmas oportunidades que, no passado, abriram portas para tanta gente.

O iraniano Paknoosh Kharaghani é dono do restaurante mais popular da cidade. Mora há 28 anos em Luís Eduardo. Fugiu da guerra do Irã com o Iraque e se refugiou no Brasil. Chegou no fim dos anos 1990, sem dinheiro no bolso, uma Kombi velha e algumas galinhas.

"As pessoas comiam em pé, sem mesa, sem cadeira, bem informal. Na Kombi, meu almoço custa entre R$ 1 e R$ 2, muitas vezes conforme a situação a pessoa comia até de graça. No fim do dia, ganhava entre R$ 12 e R$ 15, quando muito. Isso só pagava o aluguel, a gente comia a mesma comida que fazíamos e não sobrava praticamente nada."

Hoje, ele vende 300 refeições por dia e de um hotel de 50 quartos. Tem 40 funcionários.

"Sou um vitorioso. Onde cheguei, raramente as pessoas conseguem."

O 'milagre' da irrigação

Vinte cidades formam a região agrícola do Oeste baiano. Todas elas, assim como Luís Eduardo, dependem do agronegócio.

A expectativa da colheita do algodão é mais de 1,6 milhão de toneladas. E a soja, o carro-chefe, de mais de 5 milhões de toneladas. Milho, 1,2 milhão de toneladas. No total, as três culturas somam quase 8 milhões de toneladas.

Dos 3,1 milhões de hectares cultivados, 171 mil são irrigados. No sequeiro, os produtores colhem só uma safra por ano, mas com os pivôs eles levam vantagem.

Além da garantia de duas colheitas por ano, uma de soja, e uma de algodão, nas áreas irrigadas a produtividade costuma ser em média entre 15% e 20% maior que no sequeiro.

Uma só fazenda da região, por exemplo tem 28 pivôs de 1,8 mil metros de extensão. Cada um irriga 350 hectares. A cada minuto, o pivô avança 5 metros e a cada 21 horas ele fecha o círculo. Para dar a volta inteira, 15 milhões de litros de água são gastos.

O agricultor Antonio Franciosi irriga 12,5 mil hectares dos 72 mil plantados em suas terras. A captação é feita no rio Branco, que passa dentro de sua propriedade. São 16 motores de bombeamento e um reservatório de 800 metros de diâmetro, que fica sempre cheio para não faltar água na época da seca.

Franciosi diz que utiliza menos da metade da vazão que está autorizado a retirar do rio.

"A gente acaba tirando ao longo do ano apenas 30%, porque quando chove não irrigo. No auge da seca estou colhendo algodão e não irrigo. Eu preciso de água para arrancar o plantio da soja, depois começa a chuva e aí não irrigo. Eu preciso de água para complementar o plantio do algodão, em maio e início de junho, então só nesses dois meses, outubro e maio é que eu faço minha irrigação mais pesada."

O maior volume da água que irriga as terras do Oeste vem de duas bacias hidrográficas: rio Corrente e rio Grande, afluentes do São Francisco. O aquífero Urucuia, que passa na região, também ajuda.

Uso racional da água

Há divergências na avaliação dos impactos pela irrigação. Estudos apontam que a vazão dos rios vem diminuindo nos últimos anos e que no futuro eles podem secar. Mas também tem pesquisas que afirmam que há equilíbrio entre a demanda e a oferta de água.

"Estudos demonstram que existe uma grande potencialidade de recursos hídricos na região, principalmente do aquífero Urucuia. Há um potencial de expandir a área irrigada na região, entretanto estudos vão nortear onde e de que maneira pode se expandir essa irrigação", diz Glauciana Pereira, analista ambiental da Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba).

O geógrafo Tássio Cunha analisou dados da Agência Nacional de Águas e afirma que já é possível mensurar as perdas. "Há uma diminuição da vazão dos rios em torno de 27%. Também há uma diminuição das chuvas nesse período, porém, os dados de chuva equivalem a praticamente metade da diminuição da vazão, então há um apontamento de que pode existir um déficit no balanço hídrico presente na região."

O desafio hoje é fazer com que as lavouras, que trouxeram tanto desenvolvimento, tanta riqueza, cresçam sem comprometer a disponibilidade de água da região. Uma tarefa que compete essencialmente aos agricultores.

"A gente tem que fazer a nossa parte, porque se eu não fizer a minha, estou sendo omisso com um problema que pode prejudicar a mim mesmo, meus filhos, netos, no futuro", diz Franciosi.

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