Cultura

Após obra de R$ 76,6 milhões, Museu de Arte do Rio abre as portas em setembro

Projeto na Zona Portuária terá 15 mil metros quadrados, acervo próprio e quatro andares para exposições

Projeto arquitetônico do Museu de Arte do Rio
Foto: Divulgação
Projeto arquitetônico do Museu de Arte do Rio Foto: Divulgação

RIO - Uma das peças mais ousadas da revitalização cultural da Zona Portuária do Rio ganhou, nesta semana, uma data para se encaixar no ambicioso projeto do Porto Maravilha. No dia 10 de setembro, o Museu de Arte do Rio (MAR) abre suas portas, na Praça Mauá, após uma obra orçada em R$ 76,6 milhões que uniu dois prédios vizinhos de estilos arquitetônicos diferentes sob uma gigantesca cobertura de cimento ondulado — uma estrutura cinzenta que mais lembra um tapete voador.

Segundo a Fundação Roberto Marinho, realizadora da obra, a data de inauguração do complexo — composto por um pavilhão expositivo e um educativo — está ligada à agenda da ArtRio, a feira internacional de arte da cidade. A ideia é aproveitar o burburinho que a segunda edição do evento deve provocar na região entre os dias 12 e 16 de setembro para firmar o museu como novo ponto turístico e cultural da cidade. No ano passado, a ArtRio recebeu 46 mil visitantes em quatro dias.

Para que o MAR estreie em grande estilo, no entanto, Paulo Herkenhoff, o curador que ficará à frente do museu, trabalha na montagem de quatro exposições temporárias — uma para andar do espaço.

‘Ligação entre antigo e novo’

Na semana passada, O GLOBO percorreu os 15 mil metros quadrados da nova instalação e, durante a visita, ouviu o curador antecipar detalhes do projeto:

— No térreo, teremos a mostra "Abrigo, poética e o direito de morar", reunindo obras contemporâneas que dialogam com a crônica "Mineirinho", de Clarice Lispector (no texto, a autora contrapõe o sentimento de um nativo ao de um forasteiro). Lá estarão, por exemplo, trabalhos de Flávio de Carvalho, Miguel Rio Branco, Paula Trope e Grupo Usina.

No segundo andar, Herkenhoff fará a exposição "Vontade construtivista", com 150 das cerca de 200 peças da coleção Hecilda e Sérgio Fadel, uma das mais importantes do país. Nela, estarão à mostra obras de Lygia Pape, Lygia Clark, Sergio Camargo e Cildo Meireles, entre outras.

No terceiro andar, ficará a mostra "A arte brasileira e internacional", com a coleção de Jean Boghici, o marchand há mais tempo em atividade no Rio, com obras de Kandinsky e Tarsila do Amaral, entre outros. O quarto andar sediará uma exposição de paisagens e documentos inéditos do Rio.

— Nos últimos meses acumulamos também um acervo próprio de grande consistência — comemora Herkenhoff. — Mil documentos sobre a cidade, 1.500 cartões-postais e 500 fotografias. E temos duas obras de arte cedidas pela prefeitura: um banco barroco de Alberto Guignard e uma paisagem do Rio de Tarsila. Isso sem falar em todas as doações (elas já ultrapassam 300).

Ao assumir a curadoria do MAR, Herkenhoff subverteu a proposta inicial de um museu sem acervo próprio. Mobilizou dez doadores e os convenceu a ceder à instituição pelo menos 20 peças de arte cada um. A lista de doadores inclui o empresário Alexandre Accioly, o economista Luiz Chrysóstomo e o marchand Jones Bergamin. A de obras tem desde o óleo sobre tela "Praia e Igreja de Santa Luzia", de Giovanni Castagneto, até a aquarela "Infinito", de Tunga, passando por pinturas de Alfredo Volpi e Joaquim Tenreiro.

A expectativa de Herkenhoff é que o MAR receba de 500 a mil pessoas por dia.

— O complexo do MAR é mais uma evidência da retomada da vocação cultural da região — defende Jorge Arraes, diretor-presidente da Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio. — Ele faz uma ligação harmônica entre antigo e novo, e isso já está em sua arquitetura.

Salgueiro ajudou na construção

O MAR ocupa dois edifícios vizinhos que foram erguidos na Praça Mauá na primeira metade do século XX. O Palacete Dom João VI, tombado, em estilo eclético, e o prédio modernista que um dia abrigou o hospital da Polícia Civil. Seguindo o projeto dos arquitetos Thiago Bernardes, Paulo Jacobsen e Bernardo Jacobsen, o palacete será recheado com exposições, e o antigo hospital, com projetos pedagógicos da futura Escola do Olhar — que, a partir de janeiro de 2013, quer envolver alunos dos ensinos médio e fundamental da rede pública do Rio em pesquisas sobre arte.

— Foram aproximadamente três anos de trabalho, e o MAR sempre teve que ser ousado em termos arquitetônicos — conta Paulo Jacobsen. — Não queríamos fazer retrofits nos dois edifícios, mas uni-los de forma inovadora. Apresentamos umas dez propostas, mas só tivemos a certeza do caminho certo quando surgiu a ideia da cobertura fluida, esse lençol ondulado que cobre os dois prédios.

A cobertura — que já se destaca no horizonte da Baía de Guanabara — consiste numa estrutura de concreto ondulado com 1.500 metros quadrados sustentada por 39 pilares por onde escoa a água da chuva. Para lhe dar forma, os arquitetos recorreram a uma expertise bem carioca: a dos carnavalescos.

— A equipe do Salgueiro cortou o isopor que serviu de molde para a concretagem, que levou 12 horas — lembra Paulo Jacobsen.

O projeto também fugiu da lógica tradicional ao determinar que o fluxo de visitação vá do último andar para o térreo.

— Quem for ao MAR entra pelo pilotis da Escola do Olhar, pega um elevador até o último andar do prédio modernista, cruza uma passarela externa e entra no palacete pelo último andar — avisa o arquiteto. — Achamos mais natural fazer com que as pessoas desçam escadas. Fora que esse tipo de trajeto instiga o visitante a conhecer todos os andares.

A administração do MAR seguirá o modelo dos museus do Futebol e da Língua Portuguesa, em São Paulo. Uma organização social (OS) comandada pelo grupo Odeon, que cuida da Praça da Liberdade, em Belo Horizonte, terá R$ 12 milhões por ano da prefeitura do Rio para manter a infraestrutura do museu. Caberá à OS encontrar outros recursos para enriquecer a agenda do MAR.

O lado educativo do Museu de Arte do Rio

O lado educativo do Museu de Arte do Rio (MAR), batizado de Escola do Olhar, também tem uma meta ambiciosa. Segundo o secretário-geral da Fundação Roberto Marinho, Hugo Barreto, o objetivo é fazer com que todas as crianças da rede pública do Rio visitem o novo museu pelo menos três vezes durante os nove anos dos ensinos fundamental e médio.

— Serão aproximadamente 570 mil alunos envolvidos em projetos pedagógicos do MAR todos os anos — ele destaca. — Queremos aguçar o olhar deles para a arte, não só em seu stricto sensu, mas também estimular a compreensão da vida social.

Segundo o curador-chefe do museu, Paulo Herkenhoff, a Escola do Olhar também atenderá adultos. Será um centro de pesquisas e sede de futuros seminários de curadoria.

Ainda chama a atenção de quem circula pelas instalações a preocupação com a sustentabilidade. O novo museu trabalha para obter a certificação LEED, o principal selo de construção sustentável do mundo. Assim, todo o material de demolição foi reaproveitado, e só foram usados madeira certificada e aço reciclado. Os bueiros permaneceram tapados durante a obra para evitar que resíduos sólidos chegassem à rede de esgoto, e todos os operários tiveram aulas sobre sustentabilidade.

Além de querer ser referência em arte e educação e ajudar na revitalização do Porto, o MAR ainda sonha ser modelo do chamado greenbuilding.