Rio

'O Exército matou meu filho', diz mãe de catador baleado por militares em Guadalupe

Após 11 dias internado e duas cirurgias, Luciano Macedo morreu na madrugada desta quinta-feira; ele foi alvejado na ação que também matou músico Evaldo Rosa
Enterro do catador Luciano Macedo no cemitério de Caju, morto pelo Exército Foto: Guilherme Pinto / Agência O Globo
Enterro do catador Luciano Macedo no cemitério de Caju, morto pelo Exército Foto: Guilherme Pinto / Agência O Globo

RIO -  Mãe do catador de material reciclável Luciano Macedo , de 27 anos, que morreu na madrugada desta quinta-feira , Aparecida Macedo disse que não queria que ele morasse no Favela do Muquiço, em Guadalupe, na Zona Norte do Rio. A mulher conta que tinha medo dos tiroteios, mas era tranquilizada pelo próprio filho, que explicava que não havia motivo para preocupação justamente porque a área é próxima da Vila Militar.

Luciano Macedo foi baleado pelos militares no último dia 7 de abril, ao tentar ajudar o músico Evaldo Rosa , fuzilado pelo Exército. O catador de material reciclável, cuja mulher está grávida, faleceu após ficar 11 dias internado e passar por duas cirurgias. Ele foi enterrado nesta sexta-feira, no Cemitério São Francisco Xavier, no Caju.

—  Ele dizia: "Fica calma, coroa. O Exército tá ali" — disse Aparecida durante o sepultamento, antes de desabafar: — O Exército matou meu filho!

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Aparecida se queixou de não ter recebido ajuda do Exército:

— Foi uma covardia o que fizeram com meu filho. Eles não chegaram em nenhum momento, no Hospital Carlos Chagas. Passavam para lá e para cá. O único apoio que tive foi o Rio de Paz, que esteve comigo desde o começo.Se não fossem eles, eu estaria perdida.  Eles não foram me perguntar se eu precisava de alguma ajuda, se eu queria um copo d'água. Ainda vem falar que é negligência? Eles botam assassinos para matar meu filho e ainda dizem que é negligência? —  indagou.

Aparecida Macedo afirma que não queria que seu filho morasse no Muquiço, mas Luciano a tranquilizava ao mencionar a proximidade com a Vila Militar. “Ele dizia: ‘Fica calma, coroa. O Exército tá ali’. O Exército matou meu filho!”
Aparecida Macedo afirma que não queria que seu filho morasse no Muquiço, mas Luciano a tranquilizava ao mencionar a proximidade com a Vila Militar. “Ele dizia: ‘Fica calma, coroa. O Exército tá ali’. O Exército matou meu filho!”

Aparecida disse que o filho tentava ter sua casa.

— Ele tinha as carterinhas (de trabalho) dele, mas não tinha oportunidade de trabalho. Queria ter a casinha com a mulher dele.

Luciano foi sepultado com a camisa do Flamengo, seu time do coração. A mulher, Daiana, que está grávida de Luciano, passou mal e não conseguiu acompanhar o enterro.

Luciano morreu na madrugada desta quinta-feira no Hospital Estadual Carlos Chagas. Ele seria pai em breve: Daiana está grávida de cinco meses. O casal vivia nas ruas, e o catador estava juntando pedaços de madeira para construir um barraco na Favela do Muquiço. No momento em que o carro de Evaldo foi fuzilado pela patrulha dos militares na Estrada do Catonho, Luciano e Daiana passavam com um carrinho de mão a caminho do local onde o catador coletava vigas para a construção de sua casa.

O Exército já encaminhou a investigação ao Ministério Público Militar (MPM), que ainda apresentará a denúncia à Justiça. Segundo fontes ouvidas pelo GLOBO, os presos responderão pelos dois homicídios e pelas tentativas de homicídio dos quatro parentes de Evaldo que estavam no carro.

Nove militares estão presos pelo crime. Eles alegaram que dispararam porque confundiram o carro de Evaldo com um veículo que, mais cedo naquele mesmo dia, havia atirado contra a patrulha.