Política Geraldo Alckmin

Vice-procurador-geral da República critica Justiça Eleitoral, que vai julgar Geraldo Alckmin

Em parecer, Luciano Mariz Maia questiona presença de advogados na composição dos tribunais
Representante do Ministério Público, Luciano Mariz Maia Foto: Roberto Jayme / Roberto Jayme/ Ascom /TSE
Representante do Ministério Público, Luciano Mariz Maia Foto: Roberto Jayme / Roberto Jayme/ Ascom /TSE

BRASÍLIA - Autor do pedido de envio do processo do ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB) à Justiça Eleitoral , feito no começo de abril, o vice-procurador-geral da República, Luciano Mariz Maia , assina parecer encaminhado recentemente ao Supremo Tribunal Federal (STF) com duras críticas às cortes eleitorais . Ele coloca em dúvida a imparcialidade dos advogados que nelas atuam como magistrados e se posiciona contra o envio à Justiça Eleitoral de processos que envolvam crimes complexos, como os investigados pela Operação Lava-Jato.

Para sustentar suas críticas, Maia afirma que os juízes eleitorais não teriam isenção suficiente nem capacidade técnica para julgar processos de políticos envolvidos no escândalo da Petrobras. A Justiça comum teria, na avaliação dele, magistrados mais capacitados para analisar esses crimes de difícil apuração, como corrupção e lavagem de dinheiro. Ainda no parecer, Maia apresenta o que chama de "razões de natureza pragmática", entre elas o calendário eleitoral de 2018. Assim, diz ele, "fica fácil concluir que os complexos e trabalhosos crimes comuns, caso também fossem de competência da Justiça Eleitoral, ficariam relegados a segundo plano, sendo enfrentados em momento posterior às eleições".

Maia critica a composição do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e dos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs). Seus sete integrantes são trocados periodicamente. Cinco deles são oriundos de outros órgãos do Judiciário, e dois são advogados. O problema maior, entende ele, são justamente os advogados, que, apesar da nova função, não são proibidos de continuar exercendo a profissão, desde que não assumam processos eleitorais.

"Há, ainda, que se questionar se seria conveniente, desejável, e, até mesmo, compatível com a Constituição, permitir-se que advogados em pleno exercício da advocacia possam emitir juízos decisórios em sede de investigações ou ações penais que tratem desse tipo de crime", escreve Maia, que ainda diz: "isso significa que, caso se entenda que a competência penal da Justiça Eleitoral abrange crimes comuns federais, ter-se-á um cenário em que advogados, e não juízes, serão os responsáveis por processar e julgar esses crimes".

Apesar da preferência pela Justiça comum, a posição da Procuradoria-Geral da República (PGR) não é de evitar a remessa de processos às cortes eleitorais. Na avaliação do órgão, investigações como a de Alckmin, acusado de receber milhões da Odebrecht via caixa dois, devem seguir para a Justiça Eleitoral porque tratariam exclusivamente de crimes eleitorais. Procuradores do braço da Lava-Jato em São Paulo, no entanto, discordam do vice-procurador e entendem que a investigação de Alckmin também deveria ser analisada na Justiça comum.

Além do processo de Alckmin, outros com origem na Operação Lava-Jato também já foram enviados para a Justiça Eleitoral este ano. Eles envolvem a ex-presidente Dilma Rousseff, o ex-ministro Guido Mantega, o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, Paulo Skaf, e a Cervejaria Petrópolis, entre outros. Neses casos, a PGR foi contra seu encaminhamento para a Justiça Eleitoral. Os processos tinham sido enviados pelo ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no STF, para a Justiça Federal, mas, depois, por decisão da Segunda Turma da Corte, acabaram tendo novo destino.

ENTENDA: PGR pede que inquérito contra Alckmin vá para Justiça Eleitoral

Deflagrada em 2014, a Lava-Jato descortinou um gigantesco esquema de corrupção envolvendo pagamento de propina por empreiteiras a políticos em troca de contratos no governo. O repasse do dinheiro era mascarado, segundo os investigadores, na forma de doações eleitorais. Por esse motivo, parte dos investigados sustenta que os processos devem ser analisados pela Justiça Eleitoral. Com isso, deixariam de ser julgados por juízes federais como Sergio Moro.

O parecer de Maia é anterior à decisão do Supremo que, em 3 de maio, restringiu o foro privilegiado de integrantes do Congresso. O documento é uma resposta a um pleito do ex-ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços Marcos Pereira apresentado ao Supremo. Ele é alvo de um inquérito baseado na delação da Odebrecht que apura a suposta compra de apoio político de partidos para apoiar a candidatura de Dilma Rousseff à Presidência da República em 2014. Na época, ele comandava o PRB, legenda que fez parte da coligação de Dilma. Quando Pereira deixou o cargo no governo federal e perdeu o foro privilegiado no STF, o ministro Edson Fachin mandou o inquérito para o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), com sede em São Paulo. Pereira recorreu e pediu que o processo fosse enviado à Justiça Eleitoral do Distrito Federal, mas não houve decisão ainda.

Segundo Luciano Mariz Maia, caso prevaleça o argumento de Pereira, "a consequência prática daí decorrente seria remeter milhares de investigações e ações penais hoje em curso, que tratam de (complexos) crimes federais praticados em conexão a crimes eleitorais, à Justiça Eleitoral, órgão esse que, a toda evidencia, não é vocacionada a julgar crimes comuns, além de não estar aparelhado para tanto."

No caso específico de Pereira, a PGR alegou que as investigações apontam para a possibilidade de cometimento de crimes como peculato e lavagem de dinheiro, não se restringindo à esfera eleitoral. E, caso haja crimes eleitorais e comuns, o correto não é entregar tudo para a Justiça Eleitoral, mas repartir a investigação em duas, mandando uma parte também à Justiça Comum. Esse foi o caminho adotado, por exemplo, em inquérito que saiu do STJ após o ex-governador do Paraná Beto Richa (PSDB) deixar o cargo em abril.