Política Bolsonaro

Bolsonaro compartilha texto que classifica país de 'ingovernável fora de conchavos'

Presidente enviou para os próprios contatos mensagem que remete a pressões sofridas pelo governo
O presidente Jair Bolsonaro Foto: Agência O Globo
O presidente Jair Bolsonaro Foto: Agência O Globo

BRASÍLIA E RIO — Prestes a completar cinco meses de governo sob o risco de não conseguir aprovar no Congresso a medida provisória que reduz ministérios e reorganiza o Executivo, o presidente Jair Bolsonaro divulgou nesta sexta-feira um texto em que o Brasil é descrito como um país “ingovernável” fora dos “conchavos políticos”.

O artigo foi escrito pelo servidor público Paulo Portinho , que trabalha na Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Ao compartilhá-lo com seus contatos no WhatsApp, como revelou o jornal “O Estado de S.Paulo”, Bolsonaro comentou que tratava-se de “um texto no mínimo interessante e que a “sua leitura é obrigatória”.

ANÁLISE : Texto divulgado por Bolsonaro é estratégia populista e cria cortina de fumaça para denúncias contra Flávio, dizem analistas

Endossado pelo presidente, o texto apresenta um tom de desabafo sobre as dificuldades de se conseguir governar, e encerra com a preocupação de que o governo seja “desidratado até morrer de inanição". A ideia principal é que Bolsonaro sofre resistência de “corporações”, e que o Congresso o impede de aprovar medidas.

Nas últimas duas semanas, sucessivas alianças do centrão com a oposição têm resultado em derrotas do governo no Congresso. O ministro Sergio Moro, da Justiça, não conseguiu, por ora, impedir a transferência do Conselho de Controle de Controle Atividades Financeiras (Coaf) de sua pasta para a Economia, no exemplo mais recente.

“Descobrimos que não existe nenhum compromisso de campanha que pode ser cumprido sem que as corporações deem suas bênçãos. (...) Nem uma simples redução do número de ministérios pode ser feita. Corremos o risco de uma MP caducar e o Brasil ser obrigado a ter 29 ministérios”, diz um trecho do texto, sobre a MP que terá que ser votada até 3 de junho para não perder a validade.

Outras passagens do texto expressam incômodo com os limites dados pelo Congresso e o Judiciário ao poder Executivo. Recentemente, áreas técnicas da Câmara e do Senado sinalizaram que é inconstitucional o decreto de Bolsonaro que amplia o porte de armas, uma das principais bandeiras de campanha do presidente. Além disso, o Ministério Público Federal entrou com ação na Justiça para derrubar a medida.

“Que poder, de fato, tem o presidente do Brasil? Até o momento, como todas as suas ações foram ou serão questionadas no Congresso e na Justiça, apostaria que o presidente não serve para nada, exceto para organizar o governo no interesse das corporações”, diz o texto.

Ao detalhar quais seriam essas corporações, o texto cita “não só políticos, mas servidores-sindicalistas, sindicalistas de toga e grupos empresariais bem posicionados nas teias de poder. Verdadeiros donos do orçamento”.

Se a classe política, representada pelo Congresso, é o objeto central da publicação, há também referências críticas ao Judiciário e mesmo aos militares, que não teriam “interesse” na agenda do presidente.

Referência aos militares

Na campanha eleitoral, a principal bandeira de Bolsonaro na área política foi se posicionar como um opositor à “velha política”, que se caracterizaria pelo loteamento de cargos do governo em troca de apoio no Parlamento. Ao formar seu ministério, o presidente não entregou pastas a caciques partidários. A estratégia, no entanto, é alvo de críticas no Congresso. Ao avalizar o texto por Whatsapp, Bolsonaro se queixa da constatação de analistas políticos de que ainda não foi capaz de formar uma base:

“Se não negocia com o Congresso, é amador e não sabe fazer política. Se negocia, sucumbiu à velha política. O que resta, se 100% dos caminhos estão errados na visão dos ‘ana(lfabe)listas’ políticos?”.

O Supremo Tribunal Federal, um dos alvos preferenciais da militância bolsonarista nas redes sociais, também é citado negativamente. O texto se refere a uma compra que seria feita pelo Supremo — as “lagostas do STF e os espumantes com quatro prêmios internacionais” — para atacar um suposto “absolutismo orçamentário” da Corte. Os ataques virtuais ao STF motivaram um inquérito aberto pelo presidente da Corte, Dias Toffoli.

A parte referente aos militares diz que “a agenda de Bolsonaro não é do interesse de praticamente nenhuma corporação (pelo jeito nem dos militares)”. Nas últimas semanas, militares do primeiro escalão, como o ministro Carlos Alberto dos Santos Cruz, foram alvos de críticas de um dos filhos do presidente, o vereador Carlos Bolsonaro.

Texto compartilhado nesta sexta-feira, 17, por Bolsonaro já estava circulando nas redes sociais desde segunda; no grupo 'Bolsonaro Família Deus' no Whatsapp, por exemplo, um integrante enviou a mensagem de autor desconhecido na quarta, 15 Foto: Reprodução / Whatsapp
Texto compartilhado nesta sexta-feira, 17, por Bolsonaro já estava circulando nas redes sociais desde segunda; no grupo 'Bolsonaro Família Deus' no Whatsapp, por exemplo, um integrante enviou a mensagem de autor desconhecido na quarta, 15 Foto: Reprodução / Whatsapp

O fim do texto apresenta previsões pessimistas para o futuro do país:

“Na hipótese mais provável, o governo será desidratado até morrer de inanição, com vitória para as corporações. (...) Na pior hipótese ficamos ingovernáveis (...), teremos um orçamento destruído, aumentando o desemprego e a inflação”.

O tom mais catastrofista do artigo fez o meio político comparar as palavras endossadas por Bolsonaro ao ex-presidente Jânio Quadros, que em agosto de 1961 renunciou à Presidência. Na carta de renúncia, Jânio queixou-se, de forma generalista, de ser impedido de governar por “forças terríveis”.

Para cientistas políticos ouvidos pelo GLOBO, Bolsonaro ataca as instituições para tentar se fortalecer junto a seu eleitorado:

— Vai culpar o Congresso e as instituições por tudo que não consegue fazer. Está colocando a figura dele contra as instituições democráticas e quer o apoio do povo para isso, o que é típico do populismo — afirmou o cientista político da Unicamp Oswaldo Amaral.

Para Adriano Oliveira, professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a carta ataca outros poderes.

— Ele não respeita os limites que as instituições impõem no exercício da governabilidade.

Leia  a íntegra do texto

"TEXTO APAVORANTE - LEITURA OBRIGATÓRIA

Temos muito para agradecer a Bolsonaro.

Bastaram 5 meses de um governo atípico, "sem jeito" com o congresso e de comunicação amadora para nos mostrar que o Brasil nunca foi, e talvez nunca será, governado de acordo com o interesse dos eleitores. Sejam eles de esquerda ou de direita.

Desde a tal compra de votos para a reeleição, os conchavos para a privatização, o mensalão, o petrolão e o tal "presidencialismo de coalizão", o Brasil é governado exclusivamente para atender aos interesses de corporações com acesso privilegiado ao orçamento público.

Não só políticos, mas servidores-sindicalistas, sindicalistas de toga e grupos empresariais bem posicionados nas teias de poder. Os verdadeiros donos do orçamento. As lagostas do STF e os espumantes com quatro prêmios internacionais são só a face gourmet do nosso absolutismo orçamentário.

Todos nós sabíamos disso, mas queríamos acreditar que era só um efeito de determinado governo corrupto ou cooptado. Na próxima eleição, tudo poderia mudar. Infelizmente não era isso, não era pontual. Bolsonaro provou que o Brasil, fora desses conchavos, é ingovernável.

Descobrimos que não existe nenhum compromisso de campanha que pode ser cumprido sem que as corporações deem suas bênçãos. Sempre a contragosto.

Nem uma simples redução do número de ministérios pode ser feita. Corremos o risco de uma MP caducar e o Brasil ser OBRIGADO a ter 29 ministérios e voltar para a estrutura do Temer.

Isso é do interesse de quem? Qual é o propósito de o congresso ter que aprovar a estrutura do executivo, que é exclusivamente do interesse operacional deste último, além de ser promessa de campanha?

Querem, na verdade, é manter nichos de controle sobre o orçamento para indicar os ministros que vão permitir sangrar estes recursos para objetivos não republicanos. Historinha com mais de 500 anos por aqui.

Que poder, de fato, tem o presidente do Brasil? Até o momento, como todas as suas ações foram ou serão questionadas no congresso e na justiça, apostaria que o presidente não serve para NADA, exceto para organizar o governo no interesse das corporações. Fora isso, não governa.

Se não negocia com o congresso, é amador e não sabe fazer política. Se negocia, sucumbiu à velha política. O que resta, se 100% dos caminhos estão errados na visão dos "ana(lfabe)listas políticos"?

A continuar tudo como está, as corporações vão comandar o governo Bolsonaro na marra e aprovar o mínimo para que o Brasil não quebre, apenas para continuarem mantendo seus privilégios.

O moribundo-Brasil será mantido vivo por aparelhos para que os privilegiados continuem mamando. É fato inegável. Está assim há 519 anos, morto, mas procriando. Foi assim, provavelmente continuará assim.

Antes de Bolsonaro vivíamos em um cativeiro, sequestrados pelas corporações, mas tínhamos a falsa impressão de que nossos representantes eleitos tinham efetivo poder de apresentar suas agendas.

Era falso, FHC foi reeleito prometendo segurar o dólar e soltou-o 2 meses depois, Lula foi eleito criticando a política de FHC e nomeou um presidente do Bank Boston, fez reforma da previdência e aumentou os juros, Dilma foi eleita criticando o neoliberalismo e indicou Joaquim Levy. Tudo para manter o cadáver procriando por múltiplos de 4 anos.

Agora, como a agenda de Bolsonaro não é do interesse de praticamente NENHUMA corporação (pelo jeito nem dos militares), o sequestro fica mais evidente e o cárcere começa a se mostrar sufocante.

Na hipótese mais provável, o governo será desidratado até morrer de inanição, com vitória para as corporações. Que sempre venceram. Daremos adeus Moro, Mansueto e Guedes. Estão atrapalhando as corporações, não terão lugar por muito tempo.

Na pior hipótese ficamos ingovernáveis e os agentes econômicos, internos e externos, desistem do Brasil. Teremos um orçamento destruído, aumentando o desemprego, a inflação e com calotes generalizados. Perfeitamente plausível. Claramente possível.

A hipótese nuclear é uma ruptura institucional irreversível, com desfecho imprevisível. É o Brasil sendo zerado, sem direito para ninguém e sem dinheiro para nada. Não se sabe como será reconstruído. Não é impossível, basta olhar para a Argentina e para a Venezuela. A economia destes países não é funcional. Podemos chegar lá, está longe de ser impossível.

Agradeçamos a Bolsonaro, pois em menos de 5 meses provou de forma inequívoca que o Brasil só é governável se atender o interesse das corporações. Nunca será governável para atender ao interesse dos eleitores. Quaisquer eleitores. Tenho certeza que esquerdistas não votaram em Dilma para Joaquim Levy ser indicado ministro. Foi o que aconteceu, pois precisavam manter o cadáver Brasil procriando. Sem controle do orçamento, as corporações morrem.

O Brasil está disfuncional. Como nunca antes. Bolsonaro não é culpado pela disfuncionalidade, pois não destruiu nada, aliás, até agora não fez nada de fato, não aprovou nada, só tentou e fracassou. Ele é só um óculos com grau certo, para vermos que o rei sempre esteve nu, e é horroroso.

Infelizmente o diagnóstico racional é claro: "Sell".

Autor desconhecido"