Brasil Educação

Câmara propõe que União invista R$ 80 bilhões a mais na educação básica até 2026

Hoje, governo federal arca com 10% do Fundeb, fundo que financia educação básica no país; deputados querem aumentar para 20%, ao longo de seis anos
O ministro da Educação, Abraham Weintraub, durante sessão na Comissão Especial do Fundeb, no ano passado; MEC propõe aumentar participação da União para 15%, em cinco anos; deputados querem 20% Foto: Daniel Marenco/25-6-19 / Agência O Globo
O ministro da Educação, Abraham Weintraub, durante sessão na Comissão Especial do Fundeb, no ano passado; MEC propõe aumentar participação da União para 15%, em cinco anos; deputados querem 20% Foto: Daniel Marenco/25-6-19 / Agência O Globo

BRASÍLIA — O relatório da Proposta de Emenda à Constituição ( PEC ) que reformula o Fundeb , fundo de financiamento da educação básica, prevê aumento da participação da União dos atuais 10% para 20% no prazo de seis anos.

A partir de 2021, o governo federal entraria com 15% do fundo, elevando esse aporte em um ponto percentual a cada ano. A projeção de impacto orçamentário apresentado pela relatora, deputada Professora Dorinha Seabra (DEM-TO), é de R$ 79,7 bilhões em seis anos.

Dorinha recuou de uma proposta anterior, que fixava o aporte da União em até 40%. O aumento sugerido agora (de 10%), no entanto, ainda é o dobro do aumento que o governo defende, de 5 pontos percentuais ao longo de cinco anos, chegando a no máximo 15%.

A deputada afirma no texto que o impacto orçamentário será compensado com "acréscimo de receitas ou a redução de despesas". Os critérios de distribuição do fundo serão revistos ao fim dos seis anos, prevê o texto da PEC que foi apresentado.

O Fundeb reúne impostos municipais e estaduais, além da complementação da União para estados que não atingem o valor mínimo por aluno definido a cada ano. Em 2019, o total do fundo foi de cerca de R$ 150 bilhões. O Fundeb perde sua vigência no fim deste ano.

A reunião na comissão especial que analisará o texto foi aberta por volta das 10h30. Após a leitura do relatório, a deputada Chris Tonietto (PSL-RJ), que representa os interesses do governo na comissão, pediu vista, sendo seguida por outros parlamentares. Segundo ela, é preciso analisar o texto apresentado.

Tonietto disse que não se pode votar um assunto tão sério, com impactos tributários, a "toque de caixa". A parlamentar afirmou que o governo estava presente no debate, ao contrário das críticas até mesmo internas no Executivo de que o Ministério da Educação (MEC) não articulou o tema com a Câmara ao longo do ano passado. Uma série de audiências públicas foram realizadas ao longo de 2019.

- O governo sempre acompanhou os debates, mas só tivemos acesso ao texto hoje. Então, é preciso analisar com a área técnica, estudar as mudanças para buscarmos aperfeiçoamentos - disse a deputada.

Para a relatora, o pedido de vista já era esperado e não deve atrasar o cronograma traçado pela comissão, que tem expectativa de retomar o debate na primeira semana de março. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, já se comprometeu a pautar a matéria no plenário assim que estiver pronta.

Na tarde desta terça-feira, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse que o relatório será aprovado na comissão especial "logo depois do carnaval". Ele avaliou que ainda é preciso "encontrar caminhos" para os recursos que vão constituir o fundo. O presidente da Câmara alertou que algumas fontes não podem ser usadas, mas exemplificou como origem possível a economia que será feita com as desonerações.

— As fontes do petróleo não podem estar no Fundeb, porque são provisórias e finitas para despesas que são permanentes. Então, nós estamos ainda atrás de parte do salário-educação, não pode ser todo, porque há parte da merenda. Não podemos acabar com a merenda — avaliou.

Ele confirmou ainda a decisão dos deputados de aumentar para 20% a participação do governo federal no fundo. O governo queria ter participação de apenas 15%.

— Nós vamos fazer mais 10%, isso está decidido. Só que nós queremos fazer isso com dados reais do orçamento público.

Acordo

A queda de 40% para 20% no índice de complementação da União, o ponto mais controverso da proposta, foi acordado com Maia. Para Dorinha, não é o suficiente, mas contribuirá para a melhoria da educação básica pública no país, principalmente porque logo no primeiro ano de vigência do novo Fundeb, nos termos da PEC, o aporte federal já sobe para 15%.

- Seria necessário muito mais do que estamos colocando. Mas acho que com 20% podemos ter influência direta nas mudanças. É preciso garantir um novo fundo para corrigir distorções e chegar às regiões mais pobres - afirmou a deputada.

O relatório de Dorinha traz a possibilidade de que a fatia federal do salário-educação, uma contribuição social paga por empresas, seja usado para compor a complementação da União no Fundeb. Ela afirmou que o dispositivo só foi incluído porque uma PEC do próprio governo prevê a transferência direta desses recursos, da ordem de R$ 9 bilhões por ano, a estados e municípios.

Com isso, programas que hoje são bancados pelo governo federal para a educação básica, como merenda escolar e livro didático, deixariam de ser obrigação da União, pela proposta do Executivo. Dorinha afirma que seu texto mantém esses programas, mesmo que o dinheiro seja usado no Fundeb, o que obrigaria o governo a conseguir outras fontes de arrecadação:

- Quem disponibilizou para (parte do salário-educação) ser enviado para estados e municípios não foi essa PEC (do Fundeb). Já está nos projetos do governo. Estamos colocando que as regras para essa distribuição se deem via Fundeb. Um dos cuidados que tivemos no texto foi de preservar os programas que hoje são financiados pelo governo.

Daniel Cara, representante da Campanha Nacional pelo Direito à Educação que acompanhou a apresentação do texto na Câmara, considera que os programas federais custeados com os recursos do salário-educação serão prejudicados com a medida:

— Por mais que no relatório a deputada diga que os programas suplementares, como de alimentos e de livros, estão assegurados, é inegável que o orçamento deles está em risco.

Dorinha destacou que não é tarefa do Legislativo apontar fontes de recursos para a complementação do Fundeb feito pela União, mas sim do Executivo. Mesmo assim, ela menciona que recursos do fundos vinculados à exploração de petróleo, segundo documentos recebidos, são crescentes nos próximos 32 anos.

A deputada destacou também que o próprio governo, em reuniões capitaneadas pela equipe econômica com parlamentares, apresenta proposta de usar parte dos recursos alocados nos fundos constitucionais. Isso demonstra, para a parlamentar, que há fontes disponíveis para viabilizar o crescimento da complementação.

'Sistema híbrido'

O relatório de Dorinha também propõe um "sistema híbrido" para a repartição da complementação da União. Os 10% já existentes continuariam com as mesmas regras. Esse dinheiro abastece os estados que não atingem na média um valor mínimo anual definido (considerando apenas as receitas do Fundeb).

Dos 10 pontos percentuais a mais que a União colocará no Fundeb, 7,5 pontos percentuais terão como critério as redes de educação. Isso significa que municípios e estados que não atingirem um valor mínimo definido anualmente (considerando outras receitas vinculadas à educação, além do Fundeb) terão direito à complementação.

E os 2,5 pontos percentuais restantes serão distribuídos com base em indicadores de atendimento e melhoria da aprendizagem, visando a redução das desigualdades, a serem detalhados em regulamentação posterior. As novas regras são mais justas, segundo Dorinha, porque acaba com distorções como as verificadas em estados ricos na média, mas com municípios pobres.

Na regra atual com base no valor por aluno no estado, apenas sete unidades da Federação do Nordeste e duas do Norte recebem a complementação do Fundeb. Cidades do Vale do Jequitinhonha, área pobre em Minas Gerais, por exemplo, não são contempladas devido à média de investimento estadual ser alta, aponta a relatora.

A proporção mínima do Fundeb a ser gasta com pagamento de profissionais da educação básica em efetivo exercício foi definida em 70% no relatório. A deputada explica que o critério hoje é 60%, mas que a lei fala em professores somente. Ela quis ser mais abrangente, estipulando um aumento da proporção mínima a ser usada.