O doleiro Lúcio Bolonha Funaro Foto: Gustavo Miranda / Agência O Globo / 28-4-2010

As principais acusações da delação de Lúcio Funaro

Presidente Michel Temer e ministros são citados pelo doleiro em proposta de acordo

O doleiro Lúcio Bolonha Funaro - Gustavo Miranda / Agência O Globo / 28-4-2010

por O Globo

Novo delator da Operação Lava-Jato, o doleiro Lúcio Bolonha Funaro relacionou o presidente Michel Temer e outros políticos do PMDB , partido para o qual operava, segundo própria confissão, à pagamentos de propina e doações eleitorais da Odebrecht e de empresas de Joesley Batista, o dono da JBS. Descreveu esquemas de pagamentos no Ministério da Agricultura e em Angra 3 e a atuação de parlamentares, em especial o ex-deputado Eduardo Cunha, na negociação de interesses privados em Medidas Provisórias e em Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs). Sua delação foi homologada pelo ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF). Veja a seguir os principais pontos da proposta que ele apresentou à Procuradoria-Geral da República.

Presidente na mira

O presidente Michel Temer - Evaristo Sá / AFP

O doleiro Lúcio Funaro envolveu o presidente Michel Temer em esquemas de corrupção em Angra 3 e em pagamentos da Odebrecht e das empresas de Joesley Batista. Segundo o delator, além de ser beneficiário de pagamentos, Temer também atuou para que outros políticos do PMDB recebessem dinheiro de empresas como doações de campanha.

Lúcio Funaro disse que Temer sempre soube e se beneficiou do esquema de corrupção em Angra 3 . O doleiro nomeou quatro pessoas que teriam atuado como operadores do presidente: José Yunes, seu ex-assessor especial e amigo há 40 anos; o coronel João Batista Lima Filho, dono da Argeplan; Wagner Rossi, ex-ministro da Agricultura e ex-presidente da Companhia Docas de São Paulo (Codesp) e Marcelo Azeredo, que também presidiu a Codesp, a administradora do Porto de Santos.

Também está na proposta de delação de Funaro a informação de que Temer dividiu propina da Odebrecht com Geddel Vieira Lima, ex-homem forte do governo. Funaro esclareceu o episódio sobre o envio de dinheiro ao escritório de Yunes, revelado por um ex-executivo da Odebrecht e também delator na Operação Lava-Jato. O doleiro disse que buscou uma caixa com R$ 1 milhão no escritório de Yunes em 2014 e remeteu o dinheiro para Geddel em Salvador. O dinheiro pertenceria a Temer a partir de um acordo de caixa 2 feito com a empreiteira. Após a divulgação da delação do ex-executivo da Odebrecht, Yunes deixou o cargo de assessor especial da Presidência e procurou o Ministério Público Federal para dar sua versão da história.

Temer também foi citado como beneficiário de propina paga pela JBS para obtenção de mudanças de regras no Ministério da Agricultura que favoreceram o frigorífico. Nesta parte da delação, Funaro cita o ex-ministro da Agricultura, Antônio Andrade (PMDB), hoje vice-governador de Minas Gerais, como recebor de R$ 3 milhões em propina. Outros R$ 1,5 milhão teriam sido destinados ao ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

O doleiro também vinculou o presidente a repasses de uma empresa de Joesley Batista , a Eldorado Celulose. Parte da propina teria sido usada para pagamento de gastos de campanha de Gabriel Chalita à prefeitura de São Paulo em 2012 — Funaro disse ainda que Chalita usou por 11 vezes seu helicóptero durante a campanha. Outra menção ao presidente foi feita no relato sobre o envio de R$ 500 mil em dinheiro vivo à campanha de Paulo Skaf (PMDB) ao governo de São Paulo em 2014. O pagamento atenderia a um pedido de Temer, apontado como padrinho político de Skaf.

Acusações a ministros

Moreira Franco e Eliseu Padilha - Montagem sobre fotos da Agência O Globo

Além das acusações contra Michel Temer, o doleiro Lúcio Funaro envolveu os dois ministros mais próximos do presidente : Moreira Franco (Secretaria-Geral) e Eliseu Padilha (Casa Civil), ambos do PMDB.

O delator disse que Moreira Franco atuou para a liberação de um crédito de R$ 300 milhões para a empresa CIBE, do grupo Bertin. Em troca, houve o pagamento de comissão de R$ 12 milhões, tendo o hoje ministro ficado com 60% dos recursos. Funaro ficou com 15% e o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB) com 25%. Funaro afirmou também que Moreira Franco tinha um operador que atuava na Infraero enquanto Moreira ocupou o cargo de ministro da Aviação Civil — André Luiz Marques teria beneficiado empresas com renovações de contratos sem licitação e distribuição de balcões de atendimento em aeroportos.

Sobre Eliseu Padilha, Funaro afirmou que o ministro teria acertado pagamento de R$ 10 milhões da Odebrecht por meio de caixa dois. Padilha teria combinado a entrega de R$ 4 milhões no escritório de José Yunes, ex-assessor do presidente Michel Temer. Desse montante, Funaro teria operacionalizado o envio de R$ 1 milhão para a Bahia a pedido de Geddel Vieira Lima, ex-ministro do governo Temer. O delator relatou ainda que o advogado Daniel Gerber, que atua para Padilha, teria monitorado sua intenção de fazer delação .

Comissão de R$ 40 milhões

O ex-ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira - Ueslei Marcelino 22/11/2016 / Reuters

Políticos do PMDB foram citados por Lúcio Funaro como beneficiários de propina do grupo Bertin. O delator envolveu Geddel, Moreira Franco e o ex-deputado Eduardo Cunha nos pagamentos do grupo. Eles teriam atuado para facilitar a liberação de financiamentos da Caixa Econômica Federal (CEF) para o grupo. Somente em uma das comissões recebidas pelos políticos, Funaro disse ter dividido R$ 40 milhões com Cunha e Geddel.

Financiamento para empresa de Joesley

O ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) - Eraldo Peres / AP

Em sua proposta de delação, Lúcio Funaro relata que Eduardo Cunha, Michel Temer e o ex-ministro Henrique Eduardo Alves compunham o grupo político que recebeu propina para ajudar uma empresa de Joesley Batista a obter financiamento da Caixa Econômica Federal. Ao relatar como atuou para a liberação de mais de R$ 900 milhões do FI-FGTS, Funaro conta que a operação rendeu mais de R$ 33 milhões em propina, pagos em 2012. Este total teria sofrido descontos e, no fim, sido dividido entre o próprio Funaro e Cunha "e seu grupo político, que era composto também por Henrique Eduardo Alves, Michel Temer e Fabio Cleto (então vice-presidente da Caixa)". Uma parte, não determinada pelo delator, teria sido destinada a pagamento de fornecedores da campanha de Gabriel Chalita (PMDB) à prefeitura de São Paulo em 2012. Mais R$ 1 milhão teria sido doado ao PSC no mesmo ano.

Picciani e Jacob Barata Filho

O presidente da Alerj, deputado Jorge Picciani (PMDB) - Carlos Senna/divulgação

Lúcio Funaro envolveu o Jorge Picciani (PMDB) , o presidente da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), em sua delação. Em um dos anexos, ele afirma que operou pagamento de 5 milhões de fancos suíços de Jacob Barata Filho para Picciani em 2014. O repasse teria sido feito na Suíça. O doleiro disse ter atuado nesta operação a pedido de Eduardo Cunha. Na época, 5 milhões de francos suíços correspondiam a R$ 12,4 milhões; a conversão para valores atuais apontam R$ 16,2 milhões. O montante seria usado por Picciani e Cunha na campanha eleitoral daquele ano, quando ambos se reelegeram. As defesas de Picciani e Jacob Barata Filho negaram as denúncias.

Fundos de pensão

O ex-governador Anthony Garotinho - Alexandre Cassiano / O Globo

Dois anexos da delação premiada do doleiro Lúcio Funaro são dedicados a fundos de pensão e envolvem diretamente as previdências complementares dos Correios (Postalis) e da Cedae (Prece). No caso da estatal de águas e esgostos do Rio, o delator narra a participação do ex-deputado Eduardo Cunha e dos ex-governadores Rosinha e Anthony Garotinho na divisão de propinas. Funaro revelou ainda um acerto de R$ 9 milhões para evitar a convocação e citação do ex-presidente da Petros Wagner Pinheiro na CPI dos Fundos de Pensão, em 2015. Segundo ele, os valores foram acertados entre o deputado Sérgio de Souza (PMDB-PR), relator da comissão, um dos advogados de Cunha à época, Marcos Joaquim Gonçalvez, e o investidor Arthur Pinheiro Machado, quem teria feito a oferta.

Doações ao PT

A ex-presidente Dilma Rousseff - Ailton de Freitas / Agência O Globo

Em um dos anexos, Funaro relata que o Grupo Bertin fez doações de cerca de R$ 40 milhões à campanha presidencial do PT de 2010, mas que, após as eleições, eles se sentiram abandonados pela ex-presidente Dilma Rousseff, uma vez que a maior parte dos investimentos da Bertin era concentrado no setor elétrico, e não houve investimento do governo nessa área. De acordo com Funaro, foram essas doações eleitorais que aproximaram os irmãos Bertin do ex-ministro Antonio Palocci. Também foram eles, segundo o delator, que abriram contato com Palocci e outros políticos para Joesley Batista, dono da JBS.

Propina de planos de saúde

O ex-deputado Eduardo Cunha - Jorge Willian/ Arquivo O Globo

De acordo com Lúcio Funaro, o ex-deputado Eduardo Cunha cobrou propina da operadora de planos de saúde Amil e da Rede D´Or, que comanda hospitais no Rio, para aprovar uma emenda numa Medida Provisória (MP) que permitia a participação de capital estrangeiro nesses setores. Em sua proposta de delação, Funaro afirma que a negociação entre Cunha e representantes da Amil e da Rede D'Or, entre eles o banqueiro André Esteves. O delator contou ainda que as medidas provisórias eram os principais veículos de cobrança de propinas no Congresso e que Cunha, por ter amplo conhecimento do regimento interno da Câmara e influência política, era sempre procurado pelas empresas para incluir seus interesses nas MPs.

Negócios com Eike Batista

O empresário Eike Batista - Mauro Pimentel / AFP / 8-2-17

O empresário Eike Batista também foi citado pelo delator . Funaro disse que Eduardo Cunha ajudou Eike a obter um empréstimo do fundo de investimentos da Caixa Econômica Federal para um projeto da LLX no Porto do Açu. Embora afirme não conhecer o empresário, Funaro disse ter acompanhado a operação por meio de Cunha e leu troca de mensagens entre um executivo do grupo de Eike e o ex-vice-presidente da Caixa, Fabio Cleto, que também é delator. Um ex-sócio de Fynaro já havia confirmado, também em delação premiada, que Eike pagou propina para ter acesso a um investimento de R$ 750 milhões na LLX.