Supremo suspende dívida de SP com a União por seis meses

Medida cautelar assinada por Alexandre de Moraes prevê que valores sejam destinados à saúde
O ministro Alexandre de Moraes. Foto: Daniel Marenco / Agência O Globo

SÃO PAULO - O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu nesta domingo o pagamento da dívida do governo do estado de São Paulo com a União por causa da epidemia de coronavírus. A decisão vale para os próximos 180 dias, o que pode postergar o pagamento de cerca de R$ 7,2 bilhões aos cofres públicos federais. Hoje, o governo de João Doria (PSDB) teria de pagar R$ 1,2 bilhão à União, referente ao prazo final da parcela de março.

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Na avaliação de especialistas, a decisão do Supremo abre um precedente para que outros governadores recorram ao Judiciário para obter a mesma solução. A avaliação é que diante da gravidade da crise da Covid-19, é razoável que os estados empreguem estes recursos em ações de prevenção e combate ao vírus.

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No pedido, a Procuradoria Geral de São Paulo sustenta que “o estado concentra quase um quarto da população nacional e cerca de 70% do número de infectados pelo novo vírus no país”. Na decisão, o ministro Alexandre de Moraes afirma que é plausível a alegação do governo do estado de que está impossibilitado de cumprir a obrigação com a União em razão da pandemia.

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“A medida pleiteada comprova ser patente a necessidade de efetividade de medidas concretas para proteção da saúde pública e da vida dos brasileiros que vivem em São Paulo, com a destinação prioritária do orçamento público”, afirma o ministro na decisão. Moraes acrescenta, porém, que o estado terá de comprovar que os valores estão sendo integralmente aplicados na Secretaria de Saúde para o custeio das ações de prevenção, contenção, combate e mitigação da pandemia. Enquanto a liminar estiver em vigor, a União não poderá adotar medidas decorrentes do descumprimento do contrato.

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A decisão tem caráter liminar, ou seja, precisa ser referendada pela Suprema Corte em decisão de mérito. A Procuradoria de São Paulo argumentou que a receita estadual sofre forte declínio em razão da imposição de medidas sanitárias que acarretaram drástica redução das atividades econômicas do estado.

— São Paulo está preocupado em salvar vidas e não o Tesouro Nacional — disse Doria, destacando que o estado não negligencia a pandemia.

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O advogado Fernando Villela, sócio de Direito Público do escritório VPBG Advogados, afirma que a decisão do STF não surpreende e abre precedente para que outros governadores sigam o mesmo caminho. Para ele, o país vive estado de “força maior”, em que a disseminação do coronavírus já acontece de forma sustentada, o que torna razoável que governos locais usem recursos de dívidas para ações de combate ao vírus e de ampliação do atendimento de saúde.

— O próprio governo federal deverá se antecipar e chegar a um acordo com os demais estados, suspendendo o pagamento das dívidas por 180 dias, um prazo que está sendo consensual para essas decisões emergenciais — disse Villela.

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O especialista em contas públicas Raul Velloso avalia que os estados estão quebrados. Para Velloso, diante da pandemia não se pode poupar esforços:

— A decisão do STF tem que ser generalizada para todos os estados que têm dívida. Isso tem que ser feito também com o setor privado. Não é hora de ter medo de inflação ou de se preocupar com o caixa. Todos têm que refinanciar.

Risco com os gastos

O economista lembrou que, no início do ano passado, o conjunto dos estados projetava “déficit orçamentário” anual médio de R$ 35,2 bilhões para os anos de 2019 e 2020.

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— Mesmo antes de considerarmos a crise do coronavírus os estados já estavam literalmente quebrados. Agora precisarão de muito mais dinheiro novo. Suspender pagamento de dívida é uma gota no oceano — afirmou Velloso.

Para a economista do grupo de conjuntura da UFRJ e professora da Coppead Margarida Gutierrez, a decisão do Supremo é importante diante da escassez de recursos de estados e municípios.

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— Todos os estados devem caminhar para ter a mesma decisão, desde que os recursos sejam de fato direcionados para a saúde — disse Margarida.

Ela alerta, porém, que é necessário prudência para que os gastos sejam tratados como emergenciais:

— Como o Congresso aprovou estado de calamidade, os gastos com saúde não vão entrar na conta. Mas mesmo neste momento, o teto de gastos (que limita o crescimento das despesas) tem de ser mantido. Sem isso, corremos o risco de ver a crise passar, e os gastos se tornarem obrigatórios e fixos.