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Os coretos históricos que ainda balançam as praças e encantam os cariocas

Veja a lista com os locais onde estão as construções

O coreto de Sepetiba é o primeiro do Rio. A construção foi inaugurada em 1903 na Praça XV
Foto: Agência O Globo / Adriana Lorete
O coreto de Sepetiba é o primeiro do Rio. A construção foi inaugurada em 1903 na Praça XV Foto: Agência O Globo / Adriana Lorete

RIO - Num coretinho amarelo localizado em Sepetiba, Odorico Paraguaçu fez seu hilário discurso de campanha para o povo de Sucupira:

— Se eleito, meu primeiro ato como prefeito vai ser o de cumprir o funéreo dever de mandar fazer o “construimento” do cemitério municipal. Como dizia Rui Barbosa, o grande baiano, o governante é aquele que governa com um pé fincado na terra e o olho fincado no futuro. Ou vice-versa.

Parece que o tempo não passou para o coreto centenário, no centro da Praça Washington Luís, que serviu de locação para “O bem-amado”, novela de Dias Gomes exibida pela Rede Globo em 1973. É só ver os políticos em campanha na região, que não resistem a subir ao palco para, assim como Odorico, fazer suas promessas. O lugar também é ponto de brincadeira para as crianças e de eventos da vizinhança. A construção, de metal, é o primeiro coreto instalado na cidade do Rio: ele foi inaugurado na Praça Quinze, em 21 de junho de 1903, na época reformada pelo prefeito Pereira Passos. O concerto ficou por conta da Banda de Música da Marinha do Brasil. Transferido em 1949 para Sepetiba, ele faz parte de uma lista de 21 coretos que resistiram ao tempo no município. Alguns estão cheios de vida e bem conservados, como o da fictícia Sucupira. Outros, esquecidos e em estado de abandono, como o do Campo de São Cristóvão, o maior do Rio, erguido em 1906 e que teve a sua balaustrada roubada.

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A lista foi elaborada pela gerente de Monumentos e Chafarizes da Secretaria municipal de Conservação, Vera Dias. Ela conta que, no começo do século XX, construía-se nas praças um chafariz ou um coreto, que tinha o papel de entreter a população. Em grande número no passado, eles, no entanto, começaram a desaparecer nos anos 50.

— A praça era muito mais um espaço de abastecimento, para abrigar um chafariz, uma fonte de água. No final do século XIX, você começa a ter praças com paisagismo mais desenvolvido. E esse movimento embala no começo do século XX com Pereira Passos, que passa a instalar elementos decorativos e de união nas praças, como os coretos — explica Vera. — Mas, ao longo do tempo, além de se afastarem das praças, as pessoas se afastaram dos coretos. Surgiram outras formas de distração. E eles desaparecem da cidade. Documentos mostram que começaram a mudar de local entre as décadas de 50 e 60. Muitos foram demolidos.

Obra do metrô tirou coreto da Saens Peña

Ela diz que os coretos eram associados a “cidade do interior” e, por isso, os localizados em áreas como a Zona Sul e o Centro acabaram transferidos ou destruídos. Mudanças urbanas também contribuíram para o sumiço. O da Praça Saens Peña, de 1911, por exemplo, foi desmontado e levado nos anos 70 para a Praça Catolé do Rocha, em Vigário Geral, devido à construção do metrô. O da Praça Quinze foi para Sepetiba pelas mãos do general Ângelo Mendes de Moraes, governador do Distrito Federal, que na ocasião promoveu uma solenidade no coreto, inaugurando assim a energia elétrica no bairro.

Vera Dias, que revela essas curiosidades no blog “As histórias dos monumentos do Rio de Janeiro”, diz que os primeiros coretos eram de metal. Apesar da falta de registros sobre suas origens, ela acredita que tenham sido fabricados na França ou no Reino Unido.

Em 1916, surge o primeiro coreto de madeira, o do Jardim do Méier, que ainda sobrevive, apesar da balaustrada quebrada e de servir como dormitório para moradores de rua. A Praça Barão da Taquara e o Santuário da Igreja da Penha abrigam modelos parecidos. Depois surgiram versões em concreto.

Entre os de arquitetura mais inusitada, está o da Quinta da Boa Vista, de 1910, batizado de Pagode Chinês. Sua estrutura em argamassa imita troncos de bambu. O caminho de pedras é um charme a mais. Ele ainda tem uma função diferente: em vez de palco para concertos e pequenos espetáculos, é usado como mirante. Assim como a Vista Chinesa, no Parque Nacional da Tijuca, inaugurada em 1903 e que tem o mesmo estilo. Ambos são tombados pelo Iphan, por fazerem parte do conjunto dos dois parques.

NO ATERRO, EXEMPLAR MODERNISTA DE REIDY

Para Vera Dias, os coretos são um patrimônio afetivo do subúrbio. Ela lembra um caso em que a população brigou pela sua volta. Em 2003, um coreto modernista dos anos 50, que seria de Affonso Eduardo Reidy, foi demolido na Praça Quinze de Novembro, em Marechal Hermes, em consequência das mudanças urbanísticas do Rio Cidade. No seu blog, Vera diz que a construção foi posta abaixo numa noite, provocando o protesto de moradores.

— Passaram-se dez anos, e os moradores não esqueciam que ali existia um coreto, que acabou sendo reconstruído no ano passado — diz Vera.

E os coretos continuam embalando os cariocas. A Banda Luzeiro, com patrocínio da Secretaria municipal de Cultura, tem feito uma série de apresentações nesses palcos públicos, com repertório que vai de polcas e maxixes a chorinho, bossa nova e jazz. Hoje, será no coreto do Jardim do Méier, a partir das 16h.

— Cada coreto tem um som diferente. O da Igreja da Penha tem uma acústica sensacional, assim como o modernista do Aterro — observa Pedro Paes, saxofonista da banda.

O coreto modernista do Aterro, chamado de Estrela e tombado pelo Iphan, leva a assinatura de Reidy. O monumento de concreto se destaca pela leveza proporcionada pelas lajes inclinadas sobre uma coluna central. Ainda na Zona Sul, há o famoso coreto da Praça São Salvador (mais recente, de 1996), que inspirou até bloco de carnaval, o Bagunça o Meu Coreto. Na Gamboa, o coreto da Praça da Harmonia, de 1978, é também centro de agito no carnaval. Aliás, desde 1972, a prefeitura faz um concurso durante os dias de folia para escolher o coreto mais bonito e criativo, provando que, entre altos e baixos, esse tipo de construção ainda esbanja alegria e charme.

ONDE FICAM:

Coreto de Sepetiba: Feito de metal e inaugurado em 1903 na Praça Quinze. Está desde 1949 no bairro.

Vista Chinesa: Com função de belvedere, está no Parque Nacional da Tijuca.

Campo de São Cristóvão: O maior do Rio, de 1906.

Pagode Chinês: Usado como mirante na Quinta da Boa Vista.

Jardim do Méier: O primeiro de madeira do Rio, de 1916.

Santuário da Penha: Abriga dois coretos de madeira, restaurados em 2013.

Coreto da Praça Barão da Taquara: Segue o modelo dos coretos de madeira da Penha.

Praça de Quintino: De ferro, foi inaugurado em 1917.

Praça de Manguetá : Na Ilha do Governador, foi descaracterizado com o tempo.

Coreto da Estrela: Modernista, fica no Parque do Flamengo.

Marechal hermes: demolido em 2003, foi reconstruído.

Praça São Roque: em Paquetá, abriga a festa do padroeiro da ilha.

campo de marte: Fica em Deodoro e data dos anos 80.

Praça Marechal: Na Vila Militar, é feito de concreto.

Praça são salvador: Erguido em 1996 com o Rio Cidade.

Barrinha: Um dos mais recentes, construído em 1998.

Praça H: Em Sulacap, é usado na vigilância da área.

Praça Enzo Osborne: Em Rio da Prata, Campo Grande.

Praça da Harmonia: De 1978, substituiu outro, de 1912.