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Pastelão tucano. A briga do PSDB pela prefeitura de SP só começou

Pastelão tucano. A briga do PSDB pela prefeitura de SP só começou

Acusações, socos, pontapés e calça arriada. Assim são as prévias do PSDB na acirrada disputa pela candidatura à prefeitura de São Paulo, aquecidas pelo clima de 2018. Mais cenas de humor vêm aí

ALINE RIBEIRO
04/03/2016 - 19h31 - Atualizado 04/03/2016 19h31
Militantes do PSDB brigam durante as prévias municipais do partido (Foto: Crédito: Adriano Vizoni/Folhapress)

Em uma rua do Tatuapé, bairro da Zona Leste da capital paulista, um homem está caído na sarjeta com a calça jeans arriada. Sua cueca branca está escancarada. A barriga saliente, descoberta. Enquanto tenta escorar o peso do corpanzil num único braço, ele observa o desenrolar da pancadaria na figura de uma mulher que arrasta o adversário pela camisa com determinação. Um sujeito de short e tênis chuta outro com vontade. O espetáculo farto em aberrações e escasso em civilidade não é uma briga de torcidas organizadas, desentendimento familiar ou cena do programa Os Trapalhões. Tratava-se da primeira votação para a escolha do candidato do PSDB que disputará a prefeitura de São Paulo, em outubro. Em alguns pontos havia panfletagem de santinhos dos três candidatos e cavaletes propagandísticos. Noutros, o pleito mais lembrava um convescote, com direito a churrasco e cerveja. Houve tudo isso, menos um vencedor.

A animosidade do pleito escancara o racha generalizado no partido em São Paulo. Sem conseguir alcançar os votos necessários (50% mais um), o empresário João Doria Jr. e o vereador Andrea Matarazzo concorrerão num segundo turno, marcado para o dia 20. Tiraram da disputa o deputado federal Ricardo Tripoli. Serão intensos os dias que precedem a próxima etapa das prévias. Acusado de uma lista robusta de irregularidades – entre elas, abuso de poder econômico, propaganda eleitoral indevida, transporte de eleitores, infrações da Lei da Cidade Limpa, Doria está ameaçado. O ex-governador tucano Alberto Goldman e o presidente do Instituto Teotônio Vilela, José Aníbal – aliados de Matarazzo e Tripoli –, enviaram à executiva municipal do PSDB um pedido de impugnação da pré-candidatura dele.

Essa disputa com unhas e dentes, longe dos restaurantes caros, começou a ser gestada no ano passado, quando Dória, um empresário conhecido por seu impermeável cabelo e por promover eventos que reúnem empresários e políticos, se interessou pela política. Amigo de Alckmin, Dória começou a trabalhar. No ano passado, alertado por aliados, Alckmin mandou chamar Dória, Matarazzo e Trípoli para uma conversa no Palácio dos Bandeirantes.

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Os três foram instados a não disputar, a esperar para resolver a questão da candidatura na conversa, como manda a tradição tucana. Não deu certo. Dória inscreveu-se para a prévia. Matarazzo e Trípoli questionaram Alckmin depois. “Governador, o senhor tem candidato?” Alckmin disse que não e que respeitaria o resultado da prévia a ser realizada. A partir daí, Dória passou a ser acusado de comprar apoio de militantes. Alckmin, que deixara o barco correr, deu apoio ao amigo em um evento em dezembro. Matarazzo recebeu as bênçãos de seu amigo, o do senador José Serra. Já Tripoli foi uma indicação do deputado federal Bruno Covas.

A disputa meramente paulistana não teria tanta importância, caso o PSDB não fosse um partido essencialmente paulista e Alckmin não tivesse pretensões nacionais futuras. O governador coloca-se como pré-candidato à Presidência em 2018. Para ele, ser o “dono” do candidato a prefeito é uma importante demonstração de poder. Desde que permitiu o crescimento de Dória como seu candidato, no entanto, Alckmin tornou-se sócio do desgaste gerado por seu estilo agressivo de atuar.

Enquanto há acusações de que Dória compra apoiadores, sobra para Alckmin acusações de que seu governo retalia quem não fica com Dória. Um assessor da Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos (EMTU) de São Paulo foi demitido depois de rejeitar o convite para uma reunião de mobilização da campanha de Doria. Evandro Losacco, ex-diretor da EMTU, cuidou pessoalmente de dar o recado a Edson de Deus Xavier, o Tisca, como é conhecido o ex-funcionário, de que ele sofreria retaliação caso não cedesse. A demissão de Xavier foi assinada em três dias. Disposto a voltar ao emprego, Xavier afirma que saiu devido “à recessão e a uma troca da diretoria” e que pretende retornar para o governo assim que possível.

O comportamento de Alckmin no apoio a Dória intriga seus aliados. “Francamente, não compreendo o que está acontecendo com o governador”, afirma Arnaldo Madureira, um dos fundadores do PSDB. “Trabalhei do lado dele, sempre o vi como alguém muito discreto. E agora ele resolveu entrar com tudo.” No dia da votação, ao lado do aliado Dória, Alckmin verbalizou que as prévias municipais servirão como um ensaio para 2018. “É possível, é necessário, é importante. É um modelo que a gente deve (adotar)”, disse.

Poucas horas depois de encerrada a apuração do primeiro turno das prévias, na manhã do dia 29, Alckmin fez uma defesa contundente a Dória. Classificou como “ridícula” a acusação de abuso de poder econômico e uso da máquina pública pelo empresário. E finalizou com uma forte ironia. “O problema é que ainda não estamos acostumados com essa disputa democrática. Estamos acostumados a ‘partido-cartório’, de livro de ata, que decide o candidato em mesa de restaurante, com vinho importado.”

Referia-se a uma cena de 2006, quando o ex-presidente Fernando Henrique reuniu-se em um restaurante com o então prefeito José Serra, o senador Tasso Jereissati e o então governador Aécio Neves para discutir quem seria o candidato do partido à Presidência naquele ano. Alckmin, que disputava com Serra, não fora convidado. Não houve prévia na ocasião e Alckmin foi o escolhido. Desta vez, se tudo correr bem, as prévias tucanas se repetirão no dia 20. Mais cenas de humorismo involuntário virão.








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