Brasil

Rene Silva, do Complexo do Alemão, está na lista dos negros mais influentes do mundo

Hoje com 24 anos, ele ficou famoso por narrar em tempo real a ocupação da comunidade em 2010
Rene Silva, da Voz das Comunidades, do Complexo do Alemão Foto: Divulgação
Rene Silva, da Voz das Comunidades, do Complexo do Alemão Foto: Divulgação

RIO — Foi ainda durante a adolescência que Rene Silva começou a se tornar um nome conhecido no Rio. Pelo Twitter, ele transmitiu os primeiros registros da ocupação do Complexo do Alemão pelas Forças Armadas em 2010, quando tinha 17 anos. As primeiras informações sobre a operação vieram da página do “Voz das Comunidades”, jornal comunitário que ele criou em 2005. Desde então, Rene se apegou não só ao compromisso de informar sua vizinhança no Alemão, mas também o de levar a voz da favela para fora dos seus limites. Agora, aos 24 anos, o jovem recebe um reconhecimento internacional por esse feito. Ele foi considerado um dos 100 negros com menos de 40 anos mais influentes do mundo em 2018, como informou o colunista Ancelmo Gois . A premiação mundial é concedida pela organização Mipad (Most Influential People of African Descent, ou Afro descendentes mais influentes, em português), de Nova York.

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Segundo Rene Silva, seu nome foi indicado à Mipad pela Unesco Brasil. Ele se disse feliz e, ao mesmo tempo, surpreso com a homenagem. Para o comunicador, seu trabalho com o jornal "Voz das Comunidades" e sua atuação humanitária dentro de favelas foram valores que contribuíram para sua nomeação. O jovem afirmou que promove ações gratuitas dentro do Complexo do Alemão e de outras comunidades, como Rocinha, Cidade de Deus e Complexo da Maré.

— Além de todo o trabalho de comunicação desenvolvido, o jornal promove ações de páscoa, Natal, Dia das Crianças; atendimento psicológico; além de cursos de idiomas para todas as idades. Temos cem vagas para as aulas de inglês no segundo semestre, por exemplo. E, pelo que eu li sobre essa homenagem, eles escolhem as pessoas que têm um trabalho em exercício há muitos anos, que vêm construindo devagar a sua história. Esse conjunto de ações sociais me ajudou — explicou.

Rene Silva acredita que o reconhecimento é uma oportunidade de transformação social, já que traz visibilidade para o tema do racismo e das favelas. Entre os dias 28 de setembro e 3 de outubro, ele se reunirá com os demais indicados em Nova York, para a cerimônia de homenagem e ciclos de debates. Na ocasião, o brasileiro premiado pretende, inclusive, falar sobre a violência que atinge o estado do Rio.

— O Complexo do Alemão é um grande exemplo. A ocupação foi em novembro de 2010, nós tivemos oito anos para mudar uma geração. E aí, hoje, você encontra uma criança que tinha 8 anos de idade na época da ocupação, está com 16 e segurando um fuzil. A gente percebe que não houve um trabalho de transformação. Só polícia não é solução. É de extrema importância que consigamos, de alguma forma, mostrar isso — afirmou ele.

O Mipad 100 elege, no total, 200 nomes de pessoas com até 40 anos: são 100 do continente africano e 100 negros dos demais países. Em nota, a organização informou que aproveitou o centenário de nascimento de Nelson Mandela, na quarta-feira, para divulgar a lista. Segundo a entidade, a premiação reconhece o esforço de pessoas afrodescendentes na ampliação de valores humanitários e tem a intenção de inspirar toda comunidade internacional a defender os valores de justiça social encampados pelo líder sul-africano. No ano passsado, os atores Taís Araújo e Lázaro Ramos representaram o Brasil na lista.

VOZ DAS COMUNIDADES

Tudo começou quando, aos 11 anos, Rene decidiu fazer um jornal. A inspiração veio do jornalzinho que o Grêmio Escolar da Escola Municipal Alcide de Gasperi produzia e que apontava os problemas encontrados pelos alunos: um quadro de luz quebrado aqui, uma falta de material ali... O jornalzinho ia para a Secretaria de Educação, que com frequência resolvia os casos. Esse foi o primeiro encontro de Rene com o poder da imprensa. Ele gostou do que viu, achou que podia ter uma atuação maior se ampliasse o foco do veículo e apresentou a ideia de um jornal comunitário à diretora Thalma Romero, que aprovou o projeto e ofereceu ajuda.

O jornal "Voz da Comunidade" nasceu em 15 de agosto de 2005, com periodicidade mensal e cem exemplares. Na época da ocupação, em 2010, o número de seguidores no twitter saltou de 180 no dia 29 de novembro para 15 mil no dia seguinte. Hoje com mais de 360 mil seguidores na rede social, o jornal distribui 15 mil unidades por mês.

*Estagiário sob supervisão de Josy Fischberg