A busca de meios de evitar a disseminação da covid-19 no transporte público transformou-se em grande desafio nas grandes cidades. Pesquisa elaborada por especialistas em engenharia de transportes aponta a ampliação da oferta de ônibus como uma das melhores formas de garantir o distanciamento necessário para evitar a propagação do vírus. Para eles, circular, de preferência, com todos os passageiros sentados é vital durante uma pandemia e cabe ao poder público rigor na fiscalização.
A conclusão faz parte da 10ª edição da série de boletins semanais da Rede de pesquisa solidária, grupo de quase 70 pesquisadores voluntários que se juntaram para ajudar na elaboração de políticas públicas para o enfrentamento da covid-19. Três deles passaram os últimos dias debruçados no estudo das dificuldades de lidar com a propagação de um vírus mortal no transporte coletivo, seja por quem saiu para trabalhar desde o início da pandemia ou quem terá de encarar o desafio nos próximos dias.
O trabalho voltado à mobilidade foi encerrado na mesma semana da polêmica declaração do prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB). Na segunda-feira, o prefeito ameaçou demitir o secretário de transportes, Edson Caram, caso ele não consiga garantir que os ônibus urbanos circulem com todos os passageiros sentados. O prazo fixado por Covas se encerra hoje.
“Numa pandemia não pode haver cinco ou sete pessoas por metro quadrado dentro de um ônibus, como costumava acontecer”, afirma o pesquisador Pedro Logiodice. A pesquisadora Tainá Bittencourt lembra que o transporte público é “um ponto sensível na contaminação”, e circular com os passageiros sentados garante distanciamento. Para ela, não adianta, porém, dar a recomendação ou até criar uma lei se não houver ampliação da frota e fiscalização. “Em São Paulo, as empresas têm sido remuneradas por custo de operação”, diz. No Paraná, o governo determinou que os ônibus circulassem com metade da capacidade. “Mas essa política é difícil de ser praticada sem colocar mais ônibus em circulação, o que não foi o caso”, destaca a pesquisa.
Para os especialistas, diminuir a frota circulante, como ocorreu em várias cidades, acabou por provocar aglomerações. Mais de 300 linhas foram suspensas em São Paulo e quase 600 na Grande Rio. Segundo a pesquisa, nas cidades mais afetadas pela covid-19, a frota de ônibus chegou a operar com número de veículos equivalente a 40% do habitual.
A covid-19 também expôs quão heterogêneas são as metrópoles, o que exige ações distintas. A pesquisa mostra que, a partir da pandemia, a frequência a estações de metrô e trem em São Paulo e Rio chegou a ser equivalente a 30% do usual em regiões centrais, que oferecem melhores condições para o isolamento social. Já na periferia, a demanda seguiu padrões anteriores à pandemia e, em alguns casos, chegou a ser 80% maior. “Não adianta pensar na cidade como um todo”, destaca Mariana Gianotti, coordenadora da pesquisa.