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Economia

‘Home office’ expõe fragilidade da infraestrutura de internet em alta velocidade

Enquanto demanda dispara com pandemia, setor prevê queda nos investimentos e transferência do leilão de 5G para 2021
Acesso de dados pelo celular Foto: Arquivo
Acesso de dados pelo celular Foto: Arquivo

RIO - A crise gerada pela pandemia do coronavírus deve adiar ainda mais o sonho do brasileiro em ter uma conexão à internet em alta velocidade . A previsão de queda nos investimentos em infraestrutura do setor para esse ano e a possível postergação do leilão da quinta geração (5G) para 2021 tendem a deixar cada vez mais em lados opostos teles e consumidores.

O menor volume de expansão em rede acontece em um momento de alta no consumo por causa da quarentena. A demanda da banda larga fixa dobrou em março em relação ao mês anterior e foi acompanhada de alta de até 70% na conexão móvel, dizem empresas e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).

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Para especialistas, a expectativa é que os investimentos em 2020 fiquem abaixo dos R$ 30 bilhões, menor patamar desde 2015. No ano passado, foram R$ 32 bilhões. Cenário que tende a reforçar a baixa qualidade da internet Brasil afora e aumentar o número de reclamações, que, em março deste ano, teve alta de até 81%.

Segundo dados da Anatel, o 4G ainda está longe de estar presente no país todo, sobretudo em municípios menores, de 30 mil habitantes. Na fixa, a velocidade média da internet em 45% das cidades do país é de cinco mega (Mbps), insuficiente para ver filmes, por exemplo.

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Por outro lado, o setor também sofre com problemas de regulação. Desde que a Lei das Antenas foi aprovada, em 2015, apenas 5% das cidades adequaram sua legislação para facilitar a instalação de antenas.

Como resultado, diz a Telebrasil, há mais de quatro mil pedidos de antenas esperando a aprovação nas capitais do país. Hoje, o país tem 96 mil antenas, insuficiente para atender à demanda, diz Sérgio Queiroga, consultor e ex-presidente da Ericsson:

— Seria preciso dobrar o número de antenas no Brasil. Isso tudo atrapalha no atual momento.

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Um aliado desperdiçado

Com menos investimentos no radar e incertezas quanto ao rumo da economia, o leilão do 5G previsto para o fim deste ano deve ser postergado, deixando o Brasil ainda mais atrasado em relação a outros países.

Fontes do governo e das empresas dizem que “não há clima nem dinheiro” para falar da quinta geração. Semana passada, os testes de campo foram suspensos. Segundo uma dessas fontes, a briga é para saber quem vai anunciar a postergação do 5G para 2021. Um representante das teles lembra do dólar alto, que praticamente inviabiliza os projetos.

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— Os investimentos em redes vão cair, pois as pessoas não sabem se vão ter emprego. Imagina ter 5G, que vai exigir mais antena, mais torre e mais planejamento — disse Queiroga.

Segundo Helio Oyama, diretor de Engenharia da Qualcomm, o 5G seria um aliado num momento como o atual, permitindo maior rapidez e flexibilidade. Ele cita o caso de hospitais de campanha, que teriam soluções de conectividade sem cabos e em alta velocidade, o que poderia ajudar no combate ao vírus.

Em casa, as pessoas teriam a realidade aumentada em óculos e em celulares com imagem e som em alta definição, trazendo uma nova experiência à quarentena.

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— O 5G traria uma experiência mais rica de home office , aumentando a produtividade e colocando as pessoas em um ambiente imersivo de alta conectividade. O 5G traria ainda menos latência, permitindo telemedicina e ajudando no diagnóstico. As fábricas sem cabos poderiam ter um controle mais apropriado no atual momento — afirmou Oyama.

Eduardo Tude, da consultoria Teleco, ressalta que o 5G vai chegar lentamente, assim como o 4G, que, entre 2019 e 2020, alcançou 43 cidades, totalizando 4.897 municípios, segundo a Anatel. Para ele, o desafio é aumentar a velocidade de conexão na móvel e na fixa.

— A maior parte do Brasil tem velocidade baixa. Há dificuldade em levar a banda larga de alta velocidade para todo o país. Por isso, as empresas estão investindo em fibra ótica — disse Tude.

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Ari Lopes, analista da consultoria Omdia para América Latina, lembra que as empresas vivem um momento de pressão, pois perderam 57 milhões de clientes móveis desde 2015. Para ele, as companhias precisam ser mais eficientes em seus gastos. Por outro lado, ressalta que é preciso mudar o arcabouço regulatório:

— Como dizer que o setor de telecom é essencial se a carga tributária é de 40%...

Marcos Ferrari, presidente-executivo do SindiTelebrasil, destaca a urgência em melhorar o processo de instalação das antenas, que impede a melhoria da qualidade em áreas mais pobres.