A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) alterou a decisão sobre taxa de conveniência, de março de 2019. A maioria dos ministros aceitou recurso apresentado pela Ingresso Rápido e passou a admitir a cobrança. O novo julgamento só determina que a plataforma destaque a taxa no valor do ingresso.
O tema voltou a ser julgado por meio de embargos de declaração com efeitos infrigentes, apresentados pela Ingresso Rápido. Normalmente, a função dos embargos de declaração não é a de modificar o resultado de um julgamento. No caso, porém, os ministros entenderam que a decisão anterior extrapolou o que foi pedido.
Em março de 2019, a turma havia decidido, por unanimidade, que a Ingresso Rápido não poderia cobrar taxa de conveniência nas vendas de ingressos pela internet, obrigando, inclusive, a empresa a devolver os valores pagos por consumidores nos últimos cinco anos. Era a primeira decisão sobre o tema no STJ e o entendimento valia para todo o país e era precedente para outras empresas com a mesma prática.
Antes de chegar ao STJ, a primeira instância havia aceitado parte dos pedidos feitos pela Associação de Defesa dos Consumidores do Rio Grande do Sul, determinando que a taxa não fosse cobrada, sob pena de multa diária, e que fossem devolvidos os valores cobrados. Depois que o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) reformou a sentença, a entidade recorreu ao STJ contra a cobrança da taxa de conveniência (REsp 1737428).
No processo, a associação alega que há abusividade na cobrança. Explica que, além de o consumidor pagar taxa elevada de conveniência para adquirir o ingresso pela internet, tem que retirá-lo em algum ponto de venda ou enfrentar fila no dia do evento. Se quiser receber o ingresso em casa, é obrigado a fazer novo desembolso.
Quando o mérito foi julgado, em 2019, havia prevalecido o voto da relatora, ministra Nancy Andrighi. Para a ministra, há venda casada. Ainda segundo ela, a venda do ingresso para um determinado espetáculo cultural é parte típica e essencial do negócio, risco da própria atividade empresarial que visa o lucro e integrante do investimento do fornecedor, compondo, portanto, o custo básico embutido no preço.
Por isso, a relatora havia condenado a empresa a ressarcir os consumidores dos valores cobrados nos últimos cinco anos. Apesar de considerar a cobrança de taxa de conveniência ilegal, a ministra entendeu que, no caso, não haveria dano moral coletivo, negando essa parte do pedido da associação.
A relatora negou o pedido feito nos embargos de declaração. “Depois que nós julgamos, em embargos de declaração, o presidente [da turma, ministro Paulo de Tarso Sanseverino] votou contrariamente a como julgamos no recurso especial”, afirmou ela, referindo-se a voto lido em sessão anterior. A ministra ponderou que a alegação de que ultrapassou o pedido só foi levantado pela empresa nos embargos, apesar de ter oportunidades anteriores.
Prevaleceu o voto do ministro Paulo de Tarso Sanseverino. Ele considerou que o julgamento da ilegalidade da taxa de conveniência, no ano passado, foi além do que havia sido pedido. “As ações coletivas têm esse problema de idas e vindas, mas em relação ao que foi proposto na petição inicial houve uma decisão extra petita e há necessidade de correção”, afirmou ele, sem, porém, dar maiores detalhes.
Por isso, o ministro só condenou a empresa a incluir em suas ofertas de ingresso o preço total da compra com destaque da taxa de conveniência, sob pena de ser obrigada a restituir o valor da taxa, sem prejuízo de eventual fixação de astreintes (multa diária).
O voto do presidente da 3ª Turma foi seguido pelos ministros Ricardo Villas Bôas Cueva e Moura Ribeiro. O ministro Marco Aurélio Bellizze não participou do julgamento.
Para a advogada Marcella Marinho, sócia do escritório Costa Marfori, a nova decisão da 3ª Turma dá fôlego a um setor que foi muito atingido pela pandemia. “A decisão antiga teria um impacto nessas empresas de plataforma digital”, afirma.
As receitas com a taxa de conveniência compõem cerca de 90% de todo o faturamento de uma empresa de distribuição de ingressos, segundo a advogada. “As empresas iriam inserir essa taxa no valor e mesmo quem não compra pelo site teria que pagar”, diz Marcella.