Por G1


O Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou, nesta sexta-feira (28), o afastamento imediato, inicialmente por seis meses, do governador Wilson Witzel (PSC) do cargo por irregularidades na saúde.

E, segundo o pedido do Ministério Público Federal (MPF), existiam três grupos com grande influência no governo Witzel.

Grupos de influência

  • Grupo 1 – Mário Peixoto, empresário que presta serviços ao governo do RJ e preso em maio;
  • Grupo 2 – Pastor Everaldo, presidente nacional do PSC, partido de Witzel;
  • Grupo 3 – José Carlos de Melo, empresário que teria influência sobre deputados da Assembleia Legislativa do RJ (Alerj) e prestadoras de serviço do estado.

Em resumo, o Grupo 1 disputava com o Grupo 2 o poder nos contratos da administração Witzel. O Grupo 3 tinha maior poderio financeiro e viabilizava as operações de lavagem de dinheiro dos grupos.

Além dos três grupos, existem outros dois personagens importantes para entender a dinâmica do governo:

  • Lucas Tristão, ex-secretário estadual de Desenvolvimento Econômico e homem de confiança de Witzel e Mário Peixoto;
  • Gothardo Lopes Netto, ex-prefeito de Volta Redondo e próximo a Witzel.

Segundo o MPF, o Grupo 1 teria feito chegar R$ 554 mil ao escritório de advocacia da esposa de Witzel.

De acordo com o pedido de prisão preventiva ao STJ, a Unidade de Inteligência Financeira (UIF), do Banco Central, relatou que o escritório de advocacia de Helena Witzel recebeu pagamentos suspeitos, entre 13/08/2019 a 19/05/2020, de R$ 554.236,50.

Sendo:

  • R$ 280.000,00 do Hospital Jardim Amália LTDA;
  • R$ 112.620,00 da DPAD Serviços D LTDA. ME;
  • R$ 102.231,50 da QUALI CLÍNICAS GESTÃO E SERVIÇOS DE SAÚDE;
  • R$ 59.385,00 da COOTRAB COOPERATIVA CENTRAL DE TRABALHO.

Octavio Guedes explica relação de Pastor Everaldo e Mario Peixoto com Witzel

Octavio Guedes explica relação de Pastor Everaldo e Mario Peixoto com Witzel

Por meio da quebra do sigilo fiscal, os procuradores apontam que Wilson Witzel recebeu R$ 74 mil diretamente do escritório da esposa.

Duas dessas transferências, realizadas em agosto e outra em outubro de 2019, foram feitas em datas próximas ao pagamento de clientes ao escritório de Helena.

  • Um depósito, de R$ 10 mil, feito pela COOTRAB, foi realizado no dia 13/08/2019, e Witzel recebeu a mesma quantia no mesmo dia;
  • Outro pagamento, de R$ 15 mil, feito pela Quali, caiu na conta do escritório no dia 08/10/2019, dois dias depois, em 10/10/2019, a banca transferiu o mesmo valor para o governador.

Todas essas empresas estariam ligadas de alguma forma a pessoas de confiança de Witzel.

  • O Hospital Jardim Amália é de propriedade da família de Gothardo Netto;
  • DPAD e COOTRAB são de propriedade de Mário Peixoto, por meio de laranjas;
  • Quali Clínicas é de propriedade de um assessor do secretário de Educação do estado, Pedro Fernandes, tendo a documentação da empresa sido encontrada na casa de Lucas Tristão e de Alessandro Duarte, apontado como operador financeiro de Mário Peixoto.

O caminho do dinheiro até Witzel — Foto: Arte: Rodrigo Sanches/G1

Grupo 2 tinha 'caixinha' da propina

Segundo o MPF, o Grupo 2, de Pastor Everaldo, comandava "como se proprietário fosse" alguns setores do governo do Rio de Janeiro.

A avaliação é de que Everaldo tinha muito poder sobre contratações e dos orçamentos da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae), do Detran e da Secretaria da Saúde do estado.

Pastor Everaldo é preso em operação que afastou Witzel do governo de RJ

Pastor Everaldo é preso em operação que afastou Witzel do governo de RJ

A acuação é de que o grupo organizou nesta última uma espécie de "caixinha" para pagamentos de propina a agentes públicos.

“(O grupo) tinha como principais mecanismos de obtenção de recursos financeiros o direcionamento de licitações de Organizações Sociais (OS), mediante a instituição de uma "caixinha de propina" abastecida pelas OSs e seus fornecedores, e a cobrança de um percentual sobre pagamentos de restos a pagar a empresas fornecedoras do Estado”, diz o MPF.

Segundo a acusação do Ministério Público Federal, com base na delação de Edmar, o dinheiro ilícito da "caixinha" era dividido da seguinte forma:

  • 30% para Edmar Santos, então secretário da Saúde;
  • 20% para Wilson Witzel, governador do Rio de Janeiro;
  • 20% para Pastor Everaldo, presidente nacional do PSC;
  • 15% para Edson Torres, operador administrativo;
  • 15% para Victor Barroso, operador financeiro.

Segundo o MPF, as movimentações financeiras desse grupo ocorria por muitos intermediários e havia muita transação em dinheiro vivo, o que dificultou traçar o caminho do dinheiro até Witzel (leia mais abaixo).

Pastor Everaldo tinha Victor Hugo Amaral Cavalcante Barroso como operador financeiro do esquema de corrupção, de acordo com a delação do ex-secretário estadual da Saúde Edmar Santos.

Além de Victor Hugo e Everaldo, está Edson Torres, empresário e dono de fato de empresas contratadas pelo estado do Rio. Edson seria o responsável por indicar Edmar Santos para o cargo de secretário da Saúde e, assim, "assegurar o controle da pasta".

Segundo Edmar Santos, o empresário "afirmou que era 'sócio' do PSC junto com o Pastor Everaldo, que ambos se consideravam proprietários do partido".

Edmar teria tido o primeiro contato com Edson na época em que foi diretor do Hospital Pedro Ernesto, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Ele afirma que recebia propina para dar prioridade de pagamentos às empresas de Edson Torres.

Os procuradores afirmam que uma empresa de Edson Torres em nome de laranjas (a Verde Gestão de Serviços e Resíduos) conseguiu dois contratos com a Cedae que somam mais de R$ 3 milhões.

Uma outra empresa ligada a Edson, a Magna Vigilância e Segurança, obteve mais R$ 1,88 milhão para prestar serviço ao governo estadual.

Lavagem de dinheiro

Segundo o MPF, a necessidade de encobrir os valores recebidos de propina levou os investigados a realizarem uma série de atos de lavagem de dinheiro, mas que as transações foram detectadas pela UIF.

São elas:

  • A empresa EDP Corretora de Seguros, que tem como sócio Pastor Everaldo, realizou dezenas de depósitos em espécie em pequenos valores, totalizando cerca de R$ 2 milhões;
  • Pastor Everaldo comprou um imóvel no valor de R$ 2,05 milhões em dinheiro vivo;
  • O filho de Everaldo, Filipe, também sócio da EDP, comprou outro imóvel por R$ 401 mil, também em dinheiro vivo.

Grupo 3 tinha influência e dinheiro vivo

O Grupo 3 de influência no esquema de Wilson Witzel é comandado pelo empresário José Carlos de Melo, que é dono da Unig, uma universidade em Nova Iguaçu.

Segundo a delação de Edmar Santos, José Carlos transita entre os grupos de poder comandados por Mário Peixoto e Pastor Everaldo.

A posição de destaque dele se deve, principalmente, de seu "expressivo poder econômico", ou seja, ele tinha facilidade em fornecer dinheiro vivo para as transações do grupo.

“Apesar de empresário influente, José Carlos de Melo não consta formalmente como sócio de empresas que contratam diretamente com o Poder Público, sendo responsável por atuar nos bastidores, fazendo a intermediação para a contratação pelo Estado do Rio de Janeiro de empresas sobre as quais detém domínio de fato”, diz o MPF.

As empresas de José Carlos não tinham contratos diretos com o governo do Rio de Janeiro, mas ele atuava como intermediário de outras empresas que conseguiam contratos com a administração pública e recebia valores por essa “ponte”.

Segundo Edmar Santos, José Carlos afirmou que pagava uma mesada de R$ 150 mil ao secretário de Ciência e Tecnologia do estado, Leonardo Rodrigues.

Veja trecho da decisão do STJ pra afastar Witzel: ‘Grupo criminoso agiu e continua agindo'

Veja trecho da decisão do STJ pra afastar Witzel: ‘Grupo criminoso agiu e continua agindo'

A secretaria, segundo o MPF, teria beneficiado uma empresa de Mário Peixoto, a Atrio-Rio Service, em um contrato emergencial com a Fundação de Apoio à Escola Técnica do estado (Fatec-RJ) no valor de R$ 15,9 milhões, para a prestação de serviços administrativos.

O ex-secretário disse que vinha sofrendo pressão do grupo de Pastor Everaldo para direcionar as licitações para empresas que aderiram ao esquema. Neste contexto e com a ajuda de Leonardo, Edmar Santos se encontrou com José Carlos de Melo.

Após diversas reuniões, José Carlos propôs, em janeiro de 2020, o pagamento mensal de R$ 300 mil em troca de negociar empresas para serem contratadas na área da saúde.

O ex-secretário disse que recebeu duas mensalidades, totalizando R$ 600 mil, em dinheiro vivo, que ficou em poder do grupo de Pastor Everaldo.

O empresário também teria relatado a Edmar que pagava mesadas a “10 a 12 deputados”, mas sem especificar os nomes.

Vídeos: comentaristas analisam afastamento de Witzel

Veja também

Mais lidas

Mais do G1
Deseja receber as notícias mais importantes em tempo real? Ative as notificações do G1!