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Reforma tributária: novo relatório amplia período de transição e tema volta à CCJ depois do Carnaval

Nova versão do parecer da PEC 110 foi lida na CCJ na manhã desta quarta-feira
Roberto Rocha apresentou novo parecer da reforma tributária Foto: Jorge William / Agência O Globo
Roberto Rocha apresentou novo parecer da reforma tributária Foto: Jorge William / Agência O Globo

BRASÍLIA – O relator da proposta de emenda à Constituição (PEC) 110, senador Roberto Rocha (PSDB-MA), apresentou novo parecer do texto que altera a tributação sobre consumo em um dos capítulos da reforma tributária. Mas, após a leitura do relatório, em sessão da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), houve pedido de vista e o tema só voltará a ser discutido no colegiado após o carnaval.

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O novo texto traz alguns ajustes em relação ao relatório anterior. A principal mudança é a ampliação da regra de transição da cobrança do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), um tributo único que substituiria os que hoje incidem sobre produtos e serviços, e seria dividido em duas esferas, uma para arrecadação federal e outra para os estados e municípios.

Esse imposto passaria a ser cobrado no destino e não mais na origem. Esta transição passará de 20 anos para 40 anos, segundo o novo texto, com garantia de que nenhum ente terá perda de arrecadação na primeira fase da transição. A mudança atenderia a pleito de municípios, receosos por perderem receita.

O texto também estabelece um regime diferenciado para tributação de combustíveis, determinando a cobrança de um valor fixo por litro, e com alíquota única em todo o país.

— Esta discussão sobre combustíveis, nós estamos tratando na PEC, dando uma base estrutural para resolver o problema — afirmou Rocha após a leitura do parecer.

O senador ainda argumenta que “o modelo proposto representa uma solução definitiva para o debate atualmente em curso sobre a forma de cobrança de ICMS sobre combustíveis, sem, no entanto, afetar negativamente as finanças estaduais e municipais”, reforçando que isso acontecerá pela ampliação do prazo de transição.

A avaliação de Thalles Silva, advogado do Kincaid Mendes Vianna Advogados, é de que essa alternativa é mais racional e definitiva para os debates sobre os tributos que incidem sobre os combustíveis, mas ele pondera que é uma solução de longo prazo:

— Resta saber se esse ritmo se adequaria ao clamor político e social por mudanças mais imediatas nos preços dos combustíveis.

Os regimes diferenciados de tributação também abarcarão outros setores além dos combustíveis. Estão na lista lubrificantes, produtos do fumo, serviços financeiros e operações com bens imóveis.

Para compensar o impacto dessa mudança, o texto também permite a criação, via lei complementar, de regimes diferenciados com isenção ou adoção de alíquotas reduzidas. Podem ser beneficiados, neste caso, os setores agropecuário, agroindustrial, pesqueiro, florestal, educacional, saúde e medicamentos, transporte público e entidades de assistência social.

Regimes diferenciados também valerao para compras governamentais, a Zona Franca de Manaus, zonas de processamento de exportação e das empresas do Simples.

Transição mais lenta

A regra geral proposta não muda: o principal eixo do texto segue sendo a criação de um imposto sobre valor agregado (IVA) Dual, com um tributo exclusivo para a União (PIS e Cofins) e outro para estados e municípios (ICMS e ISS). O primeiro viria da proposta já encaminhada pelo governo, que cria a Contribuição sobe Bens e Serviços (CBS). O outro seria chamado de IBS e valeria para os estados e municípios.

Ainda haveria o Imposto Seletivo (IS), que substituiria o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e fucnionaria como um 'imposto do pecado', para taxar produtos prejudiciais à saúde ou meio ambiente.

Inicialmente, a transição do IBS da origem para o destino terminaria em 20 anos. Agora, levará 40 anos, em duas etapas de 20 anos cada.

Na primeira fase, parte sa receita do IBS vai ser distribuída de modo que os entes mantenham o valor da receita atual, corrigida pela inflação. O valor que exceder esse montante será distribuído pelo destino. Na outra fase, a parcela que reporia a receita real será progressivamente reduzida, convergindo para a distribuição integração da tributação pelo destino.

Para Leandro Schuch, advogado tributarista e sócio do Schuch Advogados, esse parecer explicita o temor da perda de arrecadação pelos entes, que sempre norteou a discussão:

— Após tanto tempo decorrido e muitos estudos feitos, a solução pela ampliação do prazo para o modelo de transição pode gerar uma insegurança jurídica entre os entes públicos, agentes econômicos e contribuintes. Isso porque não teremos uma solução definitiva, que poderá estar sujeita à mais alterações pelo caminho, na hipótese, por exemplo, do mecanismo criado pela PEC não ser suficiente para garantia das compensações previstas.

Já Luciano De Biasi, contador e sócio da De Biasi Auditoria, Consultoria e Outsourcing, diz que esse período de transição mais extenso não é benéfico:

— A manutenção de dois sistemas paralelos talvez atenda os anseios de estados e municípios, que temem uma queda de arrecadação com o novo sistema, mas de forma alguma ajuda o contribuinte.

Para a Confederação Nacional das Indústrias (CNI), essa mudança foi considerada um avanço. Em nota técnica, a entidade destacou que a medida vai atenuar os efeitos da transição e evitar o comprometimento do planejamento fiscal de estados e municípios.

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Fundo regional

O senador também determinou que o Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR), que será criado com recursos apenas de estados e municípios, deverá ser aplicado até 2032 prioritariamente para a manutenção da competitividade de empresas que receberam algum tipo de benefício fiscal de ICMS. Antes, não havia direcionamento expresso.

O ponto agradou ao setor produtivo. A CNI defendeu a nova versão do texto, dizendo que está ais propositivo, e destacou essa mudança na regra do FDR para manter a competitividade das empresas que tinham benefícios no ICMS.

"Essa medida traz maior segurança às empresas que fizeram seus investimentos com base em tais incentivos, evitando que ocorram prejuízos na execução desses projetos", diz o texto. A CNI também desta que é importante reduzir as hipóteses de uso desses valores, como para a qualificação de trabalhadores, porque já existem outras iniciativas que dão conta dessa frente.

Apoio rachado

Durante a sessão da CCJ, Rocha destacou a presença de secretários estaduais de Fazenda – como do Espírito Santo, Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso, Pernambuco e Ceará –, além de prefeitos e representantes de entidades interessadas.

Mas o texto ainda provoca alguns rachas. Em nota, a Confederação Nacional de Municípios (CNM), que reúne cidades menores, voltou a ressaltar o apoio ao texto e afirmou que o relator firmou um compromisso de garantir que nenhum município terá queda de receita com a proposta.

“O verdadeiro viés da reforma é o de beneficiar os Municípios mais pobres, além de garantir à população mais transparência e justiça, na medida em que o produto da arrecadação retorna para a localidade em que vive o consumidor que pagou o imposto”, afirmam em nota.

Já a Federação Nacional dos Prefeitos (FNP), que congrega os municípios de médio e grande porte, se posicionou contra o texto, por entender que a simplificação dos impostos não pode comprometer a arrecadação dos municípios.

"O ISS é uma base tributária promissora. Abrir mão desse imposto desequilibrará as finanças locais e comprometerá serviços públicos essenciais ofertados pelos municípios", diz o texto. Esse grupo de cidades apoia outra proposta, chamada de Simplifica Já, que visa a simplificação tributária por esfera da federação.

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Rocha reforçou que “todos os estados” apoiam o texto, mas reconheceu a dificuldade com os municípios, principalmente os grandes, que resistem à unificação de ICMS (estadual) e ISS (municipal), prevista na reforma tributária .

— Fizeram a proposta de ter um IVA (imposto sobre valor agregado) Trial, ou seja, um para o federal, um para o estadual e um para o municipal. Mas onde é que tem isso no mundo? Onde é que existe separar bens de serviços? Não existe no mundo. Nós fizemos o que existe — declarou.