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Cultura

IBGE: famílias gastam 7,5% do orçamento com cultura, com maior despesa em internet e TV a cabo

Sistema de Informações e Indicadores Culturais aponta queda de municípios com bibliotecas e livrarias, mas aumento em relação a museus e cinemas
Estudo do IBGE sobre cultura mostra como serviços de telefonia, TV por assinatura e internet representam 59,9%, do consumo familiar Foto: Arquivo
Estudo do IBGE sobre cultura mostra como serviços de telefonia, TV por assinatura e internet representam 59,9%, do consumo familiar Foto: Arquivo

RIO — O poder público investe pouco em cultura, e esse investimento está ainda menor. Dados do Sistema de Informações e Indicadores Culturais (SIIC), divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram que, em 2018, o setor consumiu apenas 0,21% de todos os gastos de prefeituras, estados e União. Em 2011, data do início da análise do IBGE, o percentual foi de 0,28%. O maior patamar alcançado nesse período (0,30%) aconteceu em 2013. Desde 2015, porém, ele vem caindo.

— A porcentagem dos gastos dos governos com a cultura é tão ínfima que nem a retração da economia explicaria essa redução — observa o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas. — É um setor com potencial para contribuir com a economia, ao menos qualitativamente, e que não vem sendo olhado de forma correta.

Publicado pela última vez em 2013, o material reúne dados de diferentes estudos do IBGE, como a Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic), a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (PNAD Contínua) e a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), além de informações do Cadastro Central de Empresas (Cempre) e das Estatísticas Econômicas e Financeiras das Administrações Públicas (APU). Os investimentos públicos são apenas parte da análise, que ainda traz dados sobre acesso a bens culturais, emprego, impacto na economia e hábitos de consumo.

Percentual de municípios com equipamentos culturais
e meios de comunicação - 1999/2018
1999
2009
2018
16,4
76,3
15,5
13,7
7,2
63,9
34,4
35,5
55,6
93,2
23,3
21,1
9,1
69,6
44,9
28
58
87,7
25,9
20,6
10
23
23
17,7
Provedor de internet
Biblioteca pública
Museu
Teatro ou sala de espetáculo
Cinema
Videolocadora
Loja de discos, fitas e dvds
Livraria
Percentual de consumo médio mensal familiar 2017-2018
32,3
habitação
transporte
alimentação
assistência à saúde
cultura
educação
higiene e
cuidados pessoais
18
17,5
8
7,5
4,4
3,6
Percentual de municípios com
equipamentos culturais e meios
de comunicação - 1999/2018
1999
16,4
76,3
15,5
13,7
7,2
63,9
34,4
35,5
Provedor de internet
Biblioteca pública
Museu
Teatro ou sala de espetáculo
Cinema
Videolocadora
Loja de discos, fitas e dvds
Livraria
2009
55,6
93,2
23,3
21,1
9,1
69,6
44,9
28
Provedor de internet
Biblioteca pública
Museu
Teatro ou sala de espetáculo
Cinema
Videolocadora
Loja de discos, fitas e dvds
Livraria
2018
58
87,7
25,9
20,6
10
23
23
17,7
Provedor de internet
Biblioteca pública
Museu
Teatro ou sala de espetáculo
Cinema
Videolocadora
Loja de discos, fitas e dvds
Livraria
Percentual de consumo médio
mensal familiar 2017-2018
32,3
habitação
18
transporte
17,5
alimentação
8
assistência à saúde
7,5
cultura
4,4
educação
3,6
higiene e
cuidados pessoais

De acordo com o Instituto, o número de empresas e organizações que atuam no setor também encolheu. Eram 353,2 mil em 2007, chegaram 383,5 mil em 2010, mas caíram para 325,4 mil em 2017. O segmento empregava 1,8 milhão de pessoas em 2007, chegou a 2,03 milhões em 2010, atingiu o ápice em 2013, com 2,2 milhões de empregados, mas recuou 11,3% desde então. Em 2017, último ano da pesquisa, o número de ocupados era de 1,9 milhão.

O aumento da informalidade é outro dado que chama a atenção: entre 2014 e 2018, o percentual de ocupados com carteira de trabalho assinada na Cultura caiu de 45% para 34,6%.

Para Pedro Guimarães, diretor da Apresenta Rio, associação dos promotores de eventos de entretenimento, a economia criativa pode ser uma saída para a crise. Somente em 2017, segundo o IBGE, a cadeia movimentou R$ 226 bilhões:

— No Rio, por exemplo, temos uma tradição em grandes eventos, que já fazem parte do calendário. A cultura impulsiona o turismo e impacta toda a cadeia econômica. Investir nesse setor é garantir retorno em todos os outros. Já temos vocação e qualificação, falta agora uma política forte de incentivos.

Pessoas ocupadas no setor cultural em 2017
Homens
Mulheres
Com nível superior
55,3%
44,7%
32,8%
Na cultura
22,6%
Em outras áreas
Empresas empregam 96,9%
Entidades sem fins lucrativos 2,5%
Administração pública 0,6%
Salário médio
R$ 4.127
Homens
R$ 2.798
Mulheres
Gastos públicos no setor cultural em 2018
Governo
federal
Governos
estaduais
Governos
municipais
Gastos governamentais
Municípios acima
de 100 mil habitantes
21,1%
27,5%
51,4%
52,2%
Municípios abaixo
de 100 mil habitantes
47,8%
Incentivos fiscais
Informalidade
R$ 1,3 bilhão
Ocupados com carteira assinada
em 2018
2014
2018
98,2%
Renúncia fiscal
45%
34,6%
1,8%
Investimentos diretos
do setor privado
Pessoas ocupadas no
setor cultural em 2017
Homens
Mulheres
55,3%
44,7%
Salário médio
R$ 4.127
Homens
R$ 2.798
Mulheres
Com nível superior
32,8%
Na cultura
22,6%
Em outras áreas
96,9%
2,5%
0,6%
Empresas empregam
Entidades sem fins lucrativos
Administração pública
Gastos públicos no setor
cultural em 2018
Governo
federal
Governos
estaduais
Governos
municipais
21,1%
27,5%
51,4%
Gastos governamentais
Municípios acima
de 100 mil habitantes
Municípios abaixo
de 100 mil habitantes
52,2%
47,8%
Incentivos fiscais
R$ 1,3 bilhão
em 2018
98,2%
Renúncia fiscal
1,8%
Investimentos diretos
do setor privado
Informalidade
Ocupados com carteira assinada
2014
2018
45%
34,6%

Segundo o IBGE, no biênio 2017-2018, as famílias brasileiras gastaram, em média, 7,5% de seu orçamento com produtos e serviços relacionados à cultura. A maior parte do consumo (59,9%) foi puxada por serviços de internet, telefonia e TV por assinatura.

— Internet e telefonia ganharam importância com novas formas de fruição, como o streaming, que não existia antes — observa Leonardo Athias, pesquisador da Coordenação de População e Indicadores Sociais do IBGE. — Hoje, são uma despesa importante em famílias de todas as faixas de renda, o que é positivo pela questão da ampliação do acesso. A parte negativa é o peso desse gasto para as famílias de renda menor, fazendo com que outras atividades culturais fiquem restritas a faixas mais altas.

Além de fatores econômicos, as mudanças tecnológicas também provocaram alterações no consumo. Em 2009, havia videolocadoras em 69,6% dos municípios. Em 2018, elas estavam em apenas 23% deles. Fenômeno parecido ocorreu com as lojas de discos e DVDs, cujo presença nos municípios caiu de 44,9% para 23%. Nesses quase dez anos, o número de livrarias também encolheu. Elas estavam em 28% dos municípios em 2009. No ano passado, em apenas 17,7% deles. Para piorar, o número de cidades com bibliotecas públicas também diminuiu, indo de 93,2% para 87,7%, e a presença de teatros e salas de espetáculos caiu de 21,1% em 2009 para 20,6% em 2018.

Por outro lado, aumentou o número de municípios com museus (de 23,3% para 25,9%) e cinemas (de 9,1% para 10%). Sinal dos tempos, o acesso a provedores de internet manteve a curva de crescimento. Em 2009, 55,6% dos municípios tinham. Ano passado, 58% .

O cruzamento das pesquisas mostra, ainda, que, em 2018, entre as crianças e os adolescentes brasileiros, 35,9% viviam em cidades sem museus, 34,6% sem teatros ou salas de espetáculo e 43,8% cinemas.