Saúde

Tem olhado para você? Entenda por que o autocuidado se tornou uma prática vital

A própria medicina reconhece a necessidade de praticar ações e rituais capazes de recarregar a mente, especialmente em tempos de pandemia
A engenheira Marina Faria Castro faz meditação e tem uma rotina de skincare como formas de cuidar de si mesma e recarregar a bateria Foto: Cristiano Mariz / Agência O Globo
A engenheira Marina Faria Castro faz meditação e tem uma rotina de skincare como formas de cuidar de si mesma e recarregar a bateria Foto: Cristiano Mariz / Agência O Globo

BRASÍLIA — Terapia, exercícios físicos e meditação: há quem batize esses três elementos de santíssima trindade do bem-estar. Se a pandemia revirou o que era conhecido como rotina, manter o equilíbrio — ou, ao menos, tentar — se tornou fundamental para encarar as novas dinâmicas e desafios do dia a dia. Nessa esteira, o autocuidado se expande a partir de rituais que levam a uma vida mais saudável, mental e fisicamente. O termo, até pouco tempo usado para práticas alternativas, agora já é adotado também pela medicina.

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A professora de hatha ioga Ruhana França, de 24 anos, acredita que cada pessoa tenta manter as próprias ações de autocuidado, ainda que sejam modestas. Nessa esteira, subverter a lógica da produtividade a partir de momentos de lazer configuraria uma resistência e seria uma aliada no combate ao estresse e à ansiedade, intensificados durante a pandemia:

— Na minha experiência, o estresse está muito ligado à necessidade de produtividade. Então, tentar se afastar dessa lógica de sempre ser útil para alguém, é uma forma de construir pequenas resistências. São espaços de acolhimento que a gente cria para si mesmo, porque o mundo e todos os problemas existem, mas a gente precisa construir espaço na gente para estar saudável em meio a eles e às cobranças.

Ações simbólicas

Os rituais também ganham contornos que tocam a autoestima, de dentro para fora, com a prática de skin care, termo popularmente utilizado para designar cuidados com a pele. Para a engenheira de software Marina Faria, 25, os rituais de autocuidado ajudam a aliviar o estresse. Na busca por inseri-los na vida cotidiana, ela usa não só a meditação — inclusive em aulas guiadas —, mas também técnicas de respiração, além de cuidados diários de skincare, para desanuviar a mente e dar tchau à ansiedade.

— É um momento de relaxamento, você desconecta das coisas que está pensando e vai cuidar de si. É como um spa: você foca em si, cuidar da saúde mental... Acho que, dessa forma, você esquece das outras coisas e é um processo relaxante. Na meditação, você relaxa o corpo inteiro com o método de respiração — detalha.

Rituais se caracterizam por uma sequência de ações de caráter simbólico, repetidos numa ordem pré-estabelecida. Se as ações por si só podem remontar a práticas de centenas e milhares de anos atrás, como batizar bebês e enterrar mortos, hoje se reinventam no dia a dia comum, em pequenas ações cotidianas.

Quando realizadas em grupo, como determinadas atividades de lazer, podem ajudar a desenvolver laços sociais, abalados pelo distanciamento social e pelas restrições impostas pela Covid-19.

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Durante a pandemia, a sobrecarga de trabalho e emocional foi uma constante na vida da população, o que levou a quadros de esgotamento, tanto físico quanto mental, além de ansiedade, depressão e burnout. Estudo da Universidade de Varsóvia publicado pela revista Applied Psychology: Health and Well-Being (Psicologia Aplicada: Saúde e Bem-estar, em tradução livre) mostrou que uma rotina planejada pode ajudar a manter o bom humor e o bem-estar —sobretudo em épocas de instabilidade.

Assim, contato com a natureza, terapias manuais, atividades de lazer, sono regular e menos tempo em frente às telas estão no rol de possibilidades para manter o equilíbrio, tão difícil e necessário.

Recarregar a bateria

O psiquiatra Fabio Aurélio Costa Leite, do Hospital Santa Lúcia, em Brasília, conta que é comum ver pessoas mentalmente exaustas nos últimos dois anos, já que estresse e ansiedade ativam o mecanismo primitivo de luta e fuga:

— Todas essas questões da ansiedade aumentam muito a nossa sobrecarga e a nossa descarga, então é preciso recarregar as baterias, de forma metafórica, com essas atividades para que a gente possa ter, no outro dia, energia suficiente para gastar de novo. A pandemia exigiu de todo mundo muito mais energia do que antes.

O psiquiatra complementa que não é só possível, mas necessário manter o equilíbrio em fases difíceis:

— Sempre (é bom) ter um momento em que você consiga dar uma pausa para o seu cérebro e para os seus sentimentos em relação ao que é negativo e alimentar e colocar para dentro da mente aquilo que é positivo, que acalma, que tranquiliza — finaliza Costa Leite.

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Conciliando saúde física e mental, a hatha ioga une posturas físicas a exercícios de respiração, além de técnicas de relaxamento e de meditação. Na avaliação de Ruhana França, pode ser uma ferramenta de autoconhecimento, já que o corpo “é um veículo da prática” e se beneficia do movimento enquanto a mente alcança a quietude, o silêncio e a paz.

— Quando a gente cria esse espaço que é confortável ocupar, a gente pode se ocupar por inteiro, perceber a respiração, estar atento ao momento presente e não mais estar preocupado com aquilo que a gente precisa fazer amanhã. Um dos grandes diferenciais do ioga é viver o momento presente e, durante a prática, trabalhar isso — completa.