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Economia

De sacar dinheiro a andar de elevador, mundo pós-pandemia exigirá tecnologias com menos toques

Coronavírus impõe cuidados com as mãos para evitar contaminação; pagamento por QR Code e robôs devem ganhar força
Elevadores acionados por smartphones pós-pandemia Foto: Divulgação/ThyssenKrupp
Elevadores acionados por smartphones pós-pandemia Foto: Divulgação/ThyssenKrupp

RIO — O toque é um dos sentidos básicos do ser humano. Por ele expressamos emoções, coletamos informações sobre o ambiente ao nosso redor, acionamos mecanismos e funções. Mas a pandemia de coronavírus exige cuidados sobre onde colocamos as mãos, a fim de prevenir a contaminação. Uma pesquisa realizada pelo estúdio de design britânico Foolproof mostrou que, por causa da doença, quatro em cada cinco pessoas têm essa preocupação.

— As pessoas estão interessadas em novas formas de interação com a tecnologia, que não exijam o toque, especialmente em espaços públicos — afirmou Robert Hall, gerente de marketing do estúdio. —Mas elas não sabem como. O desejo não é por algo futurístico, como hologramas e controle por gestos. Elas precisam de algo que funcione agora.

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As principais preocupações citadas pelos entrevistados foram caixas eletrônicos, maquininhas de pagamento, totens de autoatendimento em clínicas médicas e celulares. Há algumas soluções, mas pouco difundidas.

Totens podem ser substituídos por robôs que conversam com os pacientes, por exemplo. O paradoxo está nos smartphones, peça-chave para o futuro sem toque.

— Os smartphones também são sujos — ressaltou Hall. — A questão é que você controla a limpeza do que está no seu bolso, o que não acontece no espaço público.

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Os celulares podem ser usados para aposentar senhas digitadas em teclados e a biometria por impressão digital. A tecnologia NFC (Near-Field Communication), por exemplo, conecta os aparelhos a caixas eletrônicos, para movimentações sem toque.

Avanço do QR Code

Os pagamentos por aproximação ou por leitura de código QR já são comuns em alguns países da Ásia, como China e Coreia do Sul. Com a pandemia, a tendência é que adoção se acelere no Ocidente. Por aqui, uma das soluções disponíveis é a AME Digital, aceita nas Lojas Americanas, em máquinas da Cielo, postos BR e outros estabelecimentos.

Os smartphones também podem ser usados nos elevadores. No mês passado, a Thyssenkrupp lançou um sistema que permite o acionamento via celular. A conexão é via Bluetooth, com a seleção dos andares por aplicativo. Mas algumas pessoas podem estranhar:

— A parte cultural é um desafio. Quando instalamos o processo de chamada antecipada, com a seleção do andar antes da entrada na cabine, as pessoas já estranham bastante — comentou Joel Coelho, gerente do Centro Tecnológico e de Formação da thyssenkrupp Elevadores. — Nesse sistema via smartphone, quem tiver dificuldade vai continuar precisando do botãozinho.

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As entregas em domicílio também devem se tornar touchless, com drones e robôs . A start-up MyView já opera pequenos veículos autônomos dentro de condomínios. Os pacotes chegam à portaria normalmente e são colocados no compartimento dos robôs, que vão até o destino.

— Nossos robôs ainda exigem o toque para abrir o compartimento, pegar a carga e fechar, mas a próxima versão vai se abrir e se fechar automaticamente, o cliente vai só pegar na carga — explicou Thiago Calvet, diretor executivo da start-up. — Acredito que o zero toque nunca vai existir, mas as empresas terão essa preocupação ao desenvolver produtos.

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Um exemplo extremo de compra e pagamento sem toque está na rede Amazon Go, as lojas físicas da gigante do varejo on-line. Pelo aplicativo, os consumidores se registram em uma catraca na entrada, sem contato. Na loja, sensores detectam quando um produto é retirado da gôndola, e o valor é adicionado à conta. Para pagar, basta sair.

— O problema é que a instalação das câmeras e dos sensores por trás do sistema é custosa — disse Hall. — É preciso encontrar soluções que funcionem para os grandes varejistas e também para os pequenos.

Nas lojas Amazon Go os consumidores podem entrar, escolher seus produtos e sair sem contato direto com nenhum funcionário e toques somente nos produtos escolhidos Foto: Mike Kane / Bloomberg
Nas lojas Amazon Go os consumidores podem entrar, escolher seus produtos e sair sem contato direto com nenhum funcionário e toques somente nos produtos escolhidos Foto: Mike Kane / Bloomberg

Esse é o ponto principal neste debate, opina Raul Colcher, diretor executivo da Questera Consulting e membro do Instituto dos Engenheiros Eletrônicos e Eletricistas (IEEE). Os sensores evoluíram muito nos últimos anos, sendo capazes de cumprir inúmeras funções sem toque, desde abrir portas, acender luzes e acionar torneiras, a sistemas complexos como o da Amazon Go. Mas o custo pode ser um impeditivo:

— Já se encontra muita coisa disponível comercialmente. A questão tecnológica talvez não seja uma barreira — analisou. — Seja nas maquininhas do varejo ou na biometria dos caixas eletrônicos, reajustar esses sistemas tem um custo. Estamos entrando num terreno um pouco nebuloso, mas não vejo nenhuma impossibilidade.

Com o isolamento das pessoas que podem trabalhar de casa, surgem sistemas que oferecem escritórios virtuais. A start-up Invillia lançou recentemente a solução Instation. Para além de uma ferramenta colaborativa, ela simula o ambiente de um prédio, com divisão das equipes por salas.

— A ideia é fazer uma representação gráfica, com cada equipe numa sala. A plataforma tem diferentes camadas, como se fossem os andares de um prédio. Se o funcionário tem alguma coisa para resolver no RH, ele vai até essa sala e é atendido — explicou o diretor executivo da Invillia, Renato Bolzan.

Para Robert Janssen, diretor executivo da consultoria OBr.global, a pandemia de coronavírus transformou todos em "aprendedores". A realidade após o período de isolamento será sensivelmente diferente daquela que deixamos para trás, e durante a quarentena as pessoas estão se adaptando à nova realidade.

— Nos tornamos todos "aprendedores", mas a História mostra que o ser humano tem total capacidade de adaptação — afirmou Janssen. — As tecnologias touchless se tornarão cada vez mais presentes, mas nós não vamos abdicar da presença, do contato físico. Apenas vamos guardá-lo para momentos especiais.